Marcelo Coutinho
TENDÊNCIAS/DEBATES
É preciso rever a política externa
Chegou a hora de diminuir a carga ideológica da política externa brasileira para darmos alguns passos em direção aos Estados Unidos
O Brasil tem dois ministérios para lidar diretamente com os assuntos relacionados ao comércio exterior. O Ministério das Relações Exteriores e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio poderiam obedecer à máxima que diz que "duas cabeças pensam melhor que uma".
Essa policefalia, no entanto, não evitou que o país acumulasse deficit comercial já no patamar de quase US$ 2 bilhões.
Na realidade, a nossa política internacional é uma serpente com muitas cabeças reunida na Camex (Câmara de Comércio Exterior). A Camex tem como finalidade dar coerência às nossas estratégias comerciais envolvendo diferentes setores. É a responsável pelos desequilíbrios no balanço entre o que compramos e o que vendemos ao mundo.
Tais desequilíbrios são resultado do processo precoce de desindustrialização nacional, que, por sua vez, também é bastante agravado por uma política externa comercial equivocada. Esse círculo vicioso no qual o país se meteu desde que optou por um alinhamento com a potência industrial chinesa a partir de 2008 é a causa maior do baixo crescimento do Brasil.
Com o fim das eleições, o governo continuará o mesmo, mas não necessariamente será mantida a política que nos enfraqueceu no cenário global. A julgar pelos problemas de crescimento da nossa economia, são possíveis ainda as mudanças no sentido de flexibilizar o Mercosul para nos permitir fazer negociações comerciais em separado e rever a aproximação intempestiva com Pequim que marcou a criação dos Brics.
No âmbito do G20, o Brasil caminhou muito até agora ao lado dos grandes emergentes asiáticos. A tradução disso em termos de crescimento para nós não é boa. Não vivemos as crises das nações desenvolvidas, mas também não experimentamos a expansão do capitalismo dos emergentes. Ficamos da média para baixo, até mesmo na América Latina.
As análises de câmbio foram ineficazes, pois o dólar subiu R$ 1 nos últimos quatro anos, justamente o período de maior queda das exportações. Até mesmo o idealizador dos Brics, Jim O'Neill, reconhece que o Brasil ficou chinês demais e que vender commodities é insuficiente.
Com o declínio da indústria, temos menos a oferecer ao mundo. Atuamos muito para eleger um brasileiro na OMC (Organização Mundial do Comércio) e o próprio presidente da organização, Roberto Azevêdo, faz hoje um pedido desesperado para salvar a instituição e a política externa que o colocou lá.
O problema maior é que o deficit comercial, a desindustrialização e o baixo crescimento já começam a atingir o emprego dos brasileiros. Ninguém sabe até quando a nossa economia aguenta manter os atuais níveis sensíveis em que se encontra.
Talvez mais alguns meses se nada for feito ou se não houver nenhuma outra guinada fantástica de globalização financeira no mundo e valorização das commodities que nos jogue para cima.
Não convém brincar com a sorte de milhões de brasileiros. Chegou o momento de diminuir a carga ideológica da política externa para darmos alguns passos em direção aos Estados Unidos, acabando de vez com os estranhamentos que pautaram nossas relações internacionais nos últimos anos.
Ao contrário das teses apocalípticas em torno do fim da era ocidental para esta década, os Estados Unidos estão crescendo, voltaram a ser nossos maiores compradores e podemos encontrar com eles combinações e parcerias mais favoráveis à nossa indústria exportadora.
Sem perder o foco, devemos buscar o reequilíbrio no nosso comércio e salvar o futuro dos nossos empregos. Governo novo, ideias novas.