David Miranda
O banco dos Brics e o fim de uma era
O mundo atravessa um momento de incertezas. Com seu banco, os Brics podem ser decisivos para o desdobramento de conflitos
Dilma Rousseff completou uma maratona de 15 dias pelo exterior. O objetivo das visitas foi apontar saídas para a crise econômica do país, ter um saldo positivo na política internacional e, com isso, melhorar a aprovação do governo, que chegou aos 9%, segundo o Ibope.
Depois de ir aos EUA, a presidenta foi à Rússia para reunião de cúpula dos Brics, cuja pauta foi a criação do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB). Mas um fato crítico poderia ter esfriado as boas expectativas desses encontros.
Logo após a viagem aos Estados Unidos, novo vazamento da NSA (a agência americana de segurança) foi revelado. Ele apresenta uma lista de 29 grampos de integrantes do primeiro mandato de Dilma. Ministros, embaixadores, executivos do Banco Central e até do telefone do avião presidencial. O documento revela que a vigilância começou no governo Lula. A espionagem teve caráter econômico.
Em 2013, o primeiro vazamento da espionagem comprovou que a Petrobras é um dos alvos da NSA. Naquele ano, houve o leilão do Campo de Libra e as gigantes do ramo petroleiro dos EUA e do Reino Unido desistiram de participar do processo por supostamente terem obtido informações privilegiadas da NSA. Após essa revelação, Dilma cancelou sua visita aos EUA reagindo às revelações feitas pelo ex-técnico da NSA Edward Snowden.
De lá pra cá, a relação entre Brasil e EUA estremeceu. Dilma exigiu desculpas, cancelou transações comerciais e articulou na ONU uma resolução contra a espionagem. Da parte de Barack Obama não houve o encerramento do programa de espionagem, nem mesmo um pedido de desculpas oficial. Pelo contrário, a agência continua em atividade e os investimentos não diminuíram.
Em paralelo à crise com os EUA, o Brasil estreitou relações com os Brics. Em 2014, aprovou-se a criação do NBD. O novo banco servirá para investimentos em infraestrutura. Significa também, para o Brasil, o fortalecimento do bloco e das relações com as economias emergentes, sobretudo China e Rússia.
Para estes últimos, a criação do banco fortalece um bloco contra-hegemônico no cenário global também nas relações financeiras. Pretende ser uma alternativa ao Banco Mundial e ao FMI.
Nesse cenário das relações internacionais o Brasil é um ator-chave. Sendo a maior economia da América Latina, o país exerce um protagonismo econômico no continente, que atrai interesses dos Estados Unidos do bloco emergente. No entanto, há interesses antagônicos entre esses dois polos, principalmente Estados Unidos de um lado, China e Rússia do outro.
O encontro entre Dilma e Obama significou mais que a recomposição das relações comerciais. O acordo no setor de defesa, por exemplo, prevê "a troca de informações militares sigilosas de maneira mais segura, o que possibilitará ao governo brasileiro avançar no intercâmbio de tecnologia sem risco do repasse de informações confidenciais para terceiros". É singular esse tipo de acordo com quem nos espiona.
Isso levantou uma indagação: qual será a postura brasileira no novo cenário político e econômico global? O Brasil aposta numa alternativa contra-hegemônica aos Estados Unidos? Até que ponto os acordos entre Dilma Rousseff e Barack Obama podem colocar em xeque o futuro dos Brics e do NBD?
O mundo atravessa um momento de incertezas e questionamentos dos organismos internacionais. Com seu novo banco, os Brics podem ser decisivos para o desdobramento de situações conflituosas. Resta saber se os EUA se utilizarão de informações privilegiadas da NSA para seguir com sua hegemonia financeira sobre o mundo, inclusive sobre o Brasil.