Comportamento
As redes sociais tornam as pessoas mais egoístas?
Sim
Somos banais. Quase sempre. O umbigo do mundo sou eu. Num mundo veloz e líquido, o narcisismo parece ser um destino.
Alguns psicólogos, oportunistas ou desesperados, começam a suspeitar que o narcisista seria uma forma de evolução condicionada pela sobrevivência na solidão.
E, na democracia, todo mundo tem opinião sobre tudo. Enquanto isso ficava contido entre as paredes de nossa solidão, não passávamos vexame. Agora tudo mudou.
O ruído das redes sociais revela nossa banalidade solitária aos quatro cantos do mundo. Perdemos a vergonha.
A democracia é tagarela. A ideia parece não ter pedigree, mas tem. Ela é de Alexis de Tocqueville, grande intelectual francês que visitou os Estados Unidos em 1831 e escreveu seu colossal "Democracia na América" a partir dessa visita.
A tagarelice na democracia nasce do chamado à soberania do povo. Se votamos, achamos que por isso somos capazes de emitir opinião sobre tudo. Triste engano.
Para além da tagarelice, hoje, o sentimento de invisibilidade é avassalador. As redes sociais são o paraíso das almas irrelevantes.
Isso não quer dizer que as redes não tenham utilidade no mundo. Seu ridículo não nasce da sua inutilidade, mas sim do fetiche de achá-las um avanço para a "felicidade".
O fetiche aparece quando pessoas têm orgasmos achando que as redes tornam manifestações na Paulista e na Síria marcos do avanço democrático. Causas do Face são a marca da irrelevância do ativismo no início do século 21.
Ou quando fetichistas das redes sociais imaginam que elas preencham o vazio do mundo. De certa forma sim, quando a realidade nos é insuportável.
De qualquer modo, numa vida em que os vínculos são cada vez mais difíceis porque as pessoas são cada vez mais chatas, afogadas em seus pequenos direitos, as redes sociais podem ser a única amiga disponível no mercado dos egoístas.
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Não
MARILIZ PEREIRA JORGE
Jornalista e roteirista
Apenas reproduzimos nas redes sociais o que somos na vida offline. Mas hoje convencionou-se que tudo é culpa da tecnologia. A previsão é sempre de um futuro sombrio, onde as pessoas não se relacionam, não se falam, não se encontram.
Falava-se a mesma coisa da TV. Para os pessimistas tem sempre uma praga tecnológica mais atual. Os saudosistas olham para o passado e acham que a vida era mais vida lá atrás.
Não é melhor nem pior. É apenas diferente. Só temos que nos adaptar. As redes sociais podem, sim, nos dar uma falsa impressão de convivência cumprida. Corremos o risco de viver as relações de forma superficial. Sabemos da vida alheia, rimos das mesmas piadas, mandamos coraçõezinhos, distribuímos likes. E, então, voltamos para nossa vida ocupada.
Não dou conta de responder a todos os e-mails, inbox do Facebook, mensagens de Whatsapp. Fico na intenção. Correspondência lida e esquecida no "buraco negro das mensagens não respondidas". Não é egoísmo. É falta de habilidade em ser onipresente em todas as plataformas.
Nunca estivemos tão em contato mesmo à distância. As redes sociais têm o poder de estreitar laços e desvendar afinidades até com desconhecidos. O Facebook não me avisa apenas de aniversários que eu teria esquecido --e lembrar de uma data é uma demonstração e tanto de carinho, mesmo que a lembrança tenha vindo de uma cola eletrônica.
Curto as férias de um amigo, fico sabendo da promoção de outro. Sinto-me presente em festas da família, que acompanho por fotos ou pelo Skype. Falo diariamente com amigas de São Paulo. A amizade se mantém viva graças à web. Talvez por isso eu faça todo o possível para ir aos eventos do grupo.
Egoísmo pode se manifestar em qualquer situação. Um ex-colega só assistiu TV aos 14 anos, lutou contra o analfabetismo, saiu do sertão e veio ao Rio para realizar o sonho de escrever novela. Soube disso ao final de um ano de trabalho. Quis saber por que nunca tinha me contado. "Você nunca perguntou", respondeu. Esse dia, sim, me achei bastante egoísta.