Econômia
Diante dos sinais de recessão, o BC deveria parar de subir os juros?
Sim
Num país tão desigual e de juros elevados, é preciso pensar de novo antes de subi-los, dada a concentração de renda que se promove. Pior se isso é feito em meio a um ajuste fiscal, que é prejudicado pelo governo passar a pagar taxas maiores.
Mas os juros não atuam via demanda. Eles pouco a alavancam. E a inflação no Brasil é em geral de custo: são mudanças de preços relativos estruturais, como as provocadas pela inclusão social, ou temporárias, como choques agrícolas.
Os juros altos favorecem a valorização cambial, que diminui os preços dos bens que sofrem concorrência externa, contrabalançando os aumentos de custo.
Na última década, foi possível reduzi-los, crescendo sob um rígido regime de metas de inflação, pois a alta global das commodities brasileiras tendeu a apreciar o câmbio.
Porém o cenário cambial é hoje o oposto. Os fluxos comerciais se deterioraram, fruto da queda dos preços das exportações e da longa apreciação que minou a indústria. E voltam sinais de que o EUA pode fazer um aperto monetário.
Mas as condições para enfrentar a depreciação são melhores que no passado. Como mostram André Biancarelli e Rodrigo Vergnhanini (http://is.gd/5VoTWo), as reservas de dólares são bem maiores, os passivos externos de curto prazo têm peso menor e, de 2002 a 2104, a relação "passivos dolarizados/ativos externos" caiu de 2,3 para 0,8 (a desvalorização agora tende a reduzir liquidamente a dívida). Melhor deixar depreciar.
Os juros, que subiram cinco pontos percentuais nos últimos dois anos, não precisam dos choques brutais de outrora.
Isso não torna a desvalorização fácil. São duros seus efeitos sobre preços, salários reais e crescimento, mas a produção local tende a ser privilegiada.
Vale lembrar que para ter uma moeda depreciada mais fácil é evitar sua apreciação. Juros maiores logo pressionam por revalorizações. Por fim, é preciso discutir novas formas de lidar com sua relação com câmbio e inflação. Não são os juros o instrumento mais apropriado para combater a recessão. Ainda assim, é ruim continuar a elevá-los.
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Não
ALEXANDRE SCHWARTSMAN
Professor do INSPER
Caso o BC tivesse feito seu serviço quando podia e devia, a resposta seria "sim"; como não fez, é um sonoro "não".
Desde 2009, quando a inflação atingiu 4,3%, o BC tem falhado continuamente em sua missão institucional. Nestes anos a inflação média superou 6% ao ano e, se o consenso de mercado estiver correto, chegará a mais de 7% em 2015, apesar da recessão.
No período que antecedeu a crise de 2008-2009 houve um trabalho consistente no sentido de manter a inflação na meta. Entre 2005 e 2008, por exemplo, a inflação média ficou em 4,6% ao ano, ainda que, claro, não tenha ficado neste patamar em todos os anos. Não importa: esta proximidade sugere que o Copom então calibrava a política monetária para corrigir eventuais desvios.
Mais importante que este fato, porém, era a percepção dos agentes econômicos acerca do compromisso do BC com a meta. De 2005 a meados de 2010 as expectativas para a inflação 12 meses à frente ficaram ao redor de 4,5%, revelando a crença que o Copom continuaria a determinar a taxa de juros de forma a fazer a inflação oscilar próxima àquele nível.
Contra este pano de fundo, quando a crise de 2008 jogou o país na recessão o BC pôde reduzir a taxa de juros mantendo as expectativas de inflação devidamente ancoradas. O resultado é que, mesmo sofrendo críticas, inclusive internas, o Copom entregou a inflação na meta em 2009, com o PIB retomando a trajetória de crescimento já no 2º trimestre daquele ano.
A atuação desastrosa no período mais recente teve como consequência a perda de credibilidade do BC, expressa em expectativas consistentemente superiores à meta. Neste contexto, manter (ou mesmo reduzir) a taxa de juros não há de ter os mesmos resultados obtidos em 2009. Pelo contrário, face ao enorme choque inflacionário decorrente da necessidade de corrigir os preços administrados reprimidos nos últimos a- nos, a manutenção dos juros agora perpetuaria a inflação acima de 7% e exigiria sacrifício ainda maior à frente. Postergamos demais o ajuste e a conta chegou. Melhor pagar agora antes que fique ainda mais caro.