Ponto Crítico - Exposição - MAM nem tão dançante
Para a mostra "Museu Dançante", o MAM-SP (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº) convidou a São Paulo Companhia de Dança a ocupar uma sala e fazer ensaios e performances, além de interagir com o público e com obras do acervo selecionadas por compartilhar características da dança.
Visitei a mostra duas vezes. Na primeira, um domingo ensolarado, o parque do Ibirapuera estava cheio, mas a maioria dos frequentadores parecia se acanhar em entrar e explorar o museu. Os funcionários no balcão na entrada tampouco ajudaram em suas orientações: informaram que os bailarinos estavam almoçando, apesar de a programação dizer que naquele horário haveria performances.
Também não explicaram que as obras de arte expostas tinham relação com o "Museu Dançante", dando a entender que se tratava de coisa separada. Por fim, tampouco tiveram a iniciativa de me alertar que a criança que me acompanhava poderia gostar de subir ou tocar nas obras em que isso se permite.
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Performance de bailarinos da São Paulo Companhia de Dança no MAM |
Grupos que visitavam a mostra também não tiveram muita sorte com as explicações dadas pelos monitores do museu, que tentavam clarificar a relação entre a dança e as obras. Os visitantes pareciam gostar das peças expostas, mas predominava uma expressão facial de ligeira confusão.
Na segunda visita, em uma terça-feira, tive mais sorte, já que acontecia um ensaio aberto no momento em que cheguei. Surpreendentemente, tanto a sala de ensaio quanto a sala das obras de arte estavam mais cheias que no domingo.
O espaço em que acontece a dança permite ao público sentar-se em meio aos bailarinos que descansam, esperam sua vez de dançar, se esticam, vestidos com meias-calças furadas ou usando pantufas para descansar os pés machucados pelas sapatilhas.
Presenciar esse processo de criação e treino contribui mais para aproximar o público da dança que qualquer programa de formação de plateias. Sem figurino, sem maquiagem e sem iluminação, o que resta é o corpo e o suor -a dança crua e sem glamour.
Mesmo as coreografias mais vanguardistas são normalmente um produto lapidado entregue ao espectador totalmente pronto. Aqui, não: ensaio significa repetição, trechos entrecortados, música que vai e vem, erros, dores, desequilíbrio e mais repetição. Essa dinâmica do ensaio talvez seja o ponto em que os dançarinos mais se aproximam das obras de arte expostas, em que se pode identificar elementos similares.
As esculturas em si ficam dispostas em um grande salão bastante claro, com boa distribuição e sem uma sequência definida de visitação a ser seguida. São poucas, mas o ambiente agradável encoraja o visitante a passear
entre elas sem pressa e até mesmo a sentar-se em uma das cadeiras de praia triplas e ficar por lá, lendo ou observando.
Por vezes, a conexão entre a obra e o corpo humano dançante é bastante tênue; em outros casos, bastante óbvia.
Ao menos em minhas visitas, a interação dançarinos-obras-público ficou bastante comprometida. Não vi, conforme os curadores sugerem, nenhuma performance ou ensaio em meio às esculturas; os ambientes são separados.
A interação do público com as obras também é prejudicada pelo fato de que algumas se pode tocar e outras ficam fora do alcance, cercadas por uma antipática linha branca no chão. Por fim, ao menos o ensaio que presenciei tratava de uma coreografia de balé clássico, que pouco dialoga com as esculturas escolhidas.
Separando as duas partes da mostra, trata-se, por um lado, de uma ótima oportunidade para acompanhar muito de perto o trabalho de um corpo de bailarinos de alto nível técnico. Por outro lado, o visitante pode conhecer algumas das boas obras do acervo do MAM em agradável exposição.
Talvez caiba aos funcionários do museu guiar o visitante com explicações que ajudem a esclarecer a conexão entre as duas metades do "Museu Dançante". Ou talvez seja o caso de os bailarinos e coreógrafos se dirigirem fisicamente ao espaço onde estão as obras de arte para conversar sobre seu processo de criação, movimentando-se junto ao público em meio às esculturas.
PAULA LEITE, 30, é redatora da Secretaria de Redação da Folha.
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