Fã do Tea Party, vice-presidente serve de bombeiro para polêmicas de Trump

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER
DE SÃO PAULO

Mike Pence passou dois recados ao prestar juramento e se tornar o novo vice-presidente dos EUA, na sexta (20).

Escolheu fazê-lo pondo a mão sobre uma Bíblia que pertenceu a Ronald Reagan. Foi graças ao ex-presidente que ele, outrora um democrata que guardava memorabilia de John Kennedy numa caixa, mudou de lado. "Seus ideais me inspiraram a deixar o partido da minha juventude e me transformar no republicano que sou", disse em setembro.

Para testemunhar o ato, convidou Clarence Thomas, um do mais conservadores juízes da Suprema Corte americana. Nesse quesito, os dois têm muito em comum.

Governador de Indiana até se integrar à chapa de Trump, Pence, 57, se apresentou na Convenção Nacional Republicana, em julho, como "um cristão, um conservador e um republicano, nessa ordem".

"Eu era do Tea Party antes de isso virar moda", disse em 2011, escancarando sua afeição pelo movimento ultraconservador. Criado como católico, o vice-presidente se converteu evangélico, como um em cada quatro americanos. "Num festival de música cristã no Kentucky, em 1978, entreguei minha vida a Jesus Cristo, e isso mudou tudo", contou à NBC sete anos atrás.

Nunca escondeu como suas crenças ajudaram a moldar suas decisões políticas. Na chapa Trump-Pence, o primeiro podia ser visto como um demagogo e uma bomba-relógio, mas o segundo assustava ainda mais alguns setores liberais. Deputado por 12 anos, ele tem histórico de votos antiaborto e anti-LGBTQ.

"O colapso social sempre se seguiu ao advento da deterioração do casamento e da família", afirmou em 2006, ao advogar contra a união de pessoas do mesmo sexo.

Em 2000, elegeu "Titanic" como metáfora daquele fim do século 20. Comparou a partida do navio que iria a pique, "com passageiros orgulhosos dando 'tchau'", com os EUA "se distanciando do porto seguro das nossas melhores tradições religiosas". Concluiu: "Há icebergs pela frente e nós sabemos disso".

O governador Pence ganhou projeção nacional ao sancionar em 2015 uma "lei de liberdade religiosa" que, na prática, permitia a negócios locais rejeitar clientes gays –desistiu após empresas contrárias à ideia ameaçarem boicotar Indiana.

Trump não foi a primeira escolha de Pence nas prévias republicanas. Na época, ele endossou outro entusiasta do Tea Party, Ted Cruz. "Mesmo que ele estivesse sob pressão, porque sou tão de fora do establishment, foi o melhor não-apoio que eu tive na vida", disse o empresário depois.

Na campanha, o vice agiu como bombeiro do mais abrasivo presidenciável da história moderna americana. Pence enviava mensagens protocolares para acalmar republicanos nervosos com o candidato que atacava a Otan (aliança militar ocidental) e o presidente da Câmara, Paul Ryan, outro republicano –hoje Trump e Ryan são amigos.

Como vice dos EUA, Pence preside também o Senado e é um dos articuladores da Casa Branca com o Congresso. Ele revelou que se espelhará em George H. W. Bush, vice de Reagan, para o posto. Bush virou presidente em 1989.

Em agosto, um garoto de 11 anos o questionou em comício na Carolina do Norte: "Tenho acompanhado as notícias, e notei que você meio que suaviza palavras e políticas do sr. Trump. Esse será seu papel na administração?". Pence riu.

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