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18/09/2010 - 07h05

Fraudes no Afeganistão serão maiores do que nunca, diz analista

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LEILA CORREIA
DE SÃO PAULO

As eleições parlamentares deste sábado no Afeganistão registrarão um número de fraudes e irregulares superior a outros pleitos.

A afirmação é de Shantie Mariet D'Souza, pesquisadora visitante do Instituto de Estudos do Sul Asiático da Universidade Nacional de Cingapura.

Em entrevista à Folha, ela disse que, após as fraudes registradas na eleição presidencial de 2009 --quando o presidente afegão, Hamid Karzai, teve mais de um terço dos votos descartados por serem falsos--, a Comissão Eleitoral Independente (CEI) não se fortaleceu o suficiente para realizar um novo pleito do país.

D'Souza acredita que as eleições deste sábado deveriam ter sido adiadas.

Folha - Como a sra. vê o grande número de mulheres nas eleições legislativas no Afeganistão? Elas estão buscando por algo em particular, talvez mais direitos para as mulheres no país?
Shantie Mariet D'Souza - Vejo como um fator positivo. Muitas delas realmente querem se engajar em assuntos femininos. No entanto, assim como nas eleições passadas, mulheres também são "mandadas" por suas famílias. Devido à cota [que exige que 64 cadeiras da Wolesi Jirga sejam reservadas às mulheres], muitas terão menos votos que os homens. Por isso, em alguns casos, será mais fácil para as mulheres entrarem [no Parlamento] do que os homens, e as famílias querem um "canal direto" [com o governo].

Essas mulheres não têm agendas específicas, e suas atuações no Parlamento podem vir a revelar também que as decisões que elas tomam são, de fato, tomadas em algum lugar fora dele (para alguns homens, na verdade, isso também é verdade).

As candidatas desafiam as ameaças porque ser eleita é uma passagem para segurança, riqueza e status. Se o pior acontecer, é mais fácil para um deputado conseguir asilo no exterior...

Para as mulheres, essas eleições são fáceis porque não muito dinheiro será investido nessas cadeiras. Mais do que em 2005, será possível ser eleito com um punhado de votos por causa da baixa participação [de eleitores].

A Fundação por uma Eleição Livre e Justa do Afeganistão (Fefa) disse que 9 de cada 10 ameaças feitas contra candidatos foram endereçadas às mulheres. A sra. acredita que isso acontece por causa do Taleban?
É muito difícil diferenciar no que exatamente as ameaças são baseadas. Algumas podem vir do Taleban _mas não se pode subestimar a competição entre candidatos e pode ser mais fácil excluir as mulheres de competir do que os homens porque, no caso de ameaças, as famílias serão mais propensas a protegê-las, pedindo para se retirarem [da campanha].

Por esse motivo, vejo mais do que motivos ideológicos por trás das ameaças, mas também cálculo político. Quando olhamos para o atual Parlamento, muitos membros têm vivido sob ameaça ou pressão _e todos os deputados que foram mortos nos últimos anos eram homens.

Mas mesmo sendo vítimas de ameaças, as mulheres continuaram fazendo campanha. Por qual motivo a sra. acredita que isso aconteceu? O Afeganistão está vendo algum tipo de mudança relacionada aos direitos e poder das mulheres?
Em muitos setores, principalmente na política, as mulheres se tornaram marginalizadas nos últimos anos. Mesmo assim, elas têm muito mais visibilidade agora: na mídia, em shows, em filmes você agora vê uma crescente participação feminina.

Isso significa que há mulheres que não querem se encaixar no esquema imposto a elas por homens.

As que fizeram campanha são certamente muito corajosas e tenho certeza que os homens também estão temerosos de que as mulheres podem obter uma fatia maior do poder --e nisso o Afeganistão não é diferente de outros países. Os que estão em posições privilegiadas não estão dispostos a dividir ou dar espaço a outros.

Quem são essas mulheres que se candidataram?
Analisando a lista [de candidatos] por Cabul, você encontra uma gama diversificada, desde mulheres analfabetas proprietárias de academias até mulheres educadas que estudaram no exterior.

Quase todas as ex-deputadas estão concorrendo novamente e, em uma rápida análise dos parlamentares da última Wolesi Jirga, a maioria é relativamente jovem (25 a 40 anos), bem educadas e passaram um longo período no exterior (este último é válido para homens e mulheres).

E as mulheres na última Wolesi Jirga, desempenharam bem suas funções?
O público não vê muito delas. Há algumas, no entanto, que frequentemente aparecem na TV e são muito conhecidas --Shikai Karokhail, Shukria Barakzai, Fawzia Koofi.

Em termos de poder real, elas não alcançaram muito, devido a serem totalmente divididas e não alinhadas para interesses em comum. E elas também são excluídas do processo decisório em algumas ocasiões. Há também um grande número [de mulheres] tão conservadoras quanto muitos homens.

Na sua opinião, qual é a importância dessas eleições legislativas para o Afeganistão, após os problemas de fraude registrados na eleição presidencial do ano passado?
Politicamente, continuo pensando que o maior problema é o sistema de voto único intransferível. Antes das eleições, muitas pessoas, mesmo nas mais remotas regiões, estão aguardando ansiosamente pelo pleito. Mas, se seus candidatos não conseguirem [se eleger], o desapontamento será alto.

Devido ao fato de você não poder votar em um partido, mas apenas em uma pessoa, muita gente terá a sensação de serem "perdedores", ao invés de um sistema em que seu partido favorito pode não vencer, mas mesmo assim ter uma fatia do poder. Nas eleições afegãs, dar seu voto significa vitória ou derrota, nada no meio disso.

As fraudes serão maiores do que em qualquer outra ocasião --haverá menos observadores, quase nenhum [observador] internacional que podem não estar analisando de perto, mas poderiam mais facilmente criticar as eleições sem temer por suas vidas, uma Comissão Eleitoral de Queixas totalmente moldada pelo presidente Karzai.

Senhores da guerra e violadores dos direitos humanos vão ser eleitos, como antes, e quem sabe quem mais será.

Assim, talvez mais importante do que as eleições em si será a performance do Parlamento em um ou dois anos.

Continuo pessimista sobre o último exercício eleitoral. É difícil antecipar qualquer resultado positivo dado que grande parte do país têm experimento deterioração da segurança suficiente que fazer campanha normalmente tem sido impossível e as verificações normais no dia da eleição são impossíveis.

Diversos relatórios indicam preparação para aparelhamento e história de Mahmood Karzai [irmão do presidente] tentando comprar candidatos para formar um bloco pró-governo não oficial, após eles terem distorcido o processo contra partidos, parecem críveis.

Não vejo as histórias da CEI [Comissão Eleitoral Independente] de extensivas medidas antifraude são confiáveis. Se o país for arrastado para mais um período de alegações de fraude, em algum ponto alguém deveria fazer uma profunda investigação do por quê as eleições foram realizadas em primeiro lugar. Elas deveriam ter sido adiadas até que a segurança estivesse um pouco melhor e a CEI, um pouco mais forte.

 

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