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O código das calendas

Crédito: Edson Silva/Folhapress Reserva legal em fazenda formada antes da aprovação do Código Florestal
Reserva legal em fazenda formada antes da aprovação do Código Florestal

Com o terceiro adiamento do prazo para inscrever propriedades no Cadastro Ambiental Rural, ruralistas e seus aliados no governo desmoralizam a ideia de que o novo Código Florestal traria um armistício entre os que defendem o fim do desmatamento e os que o encaram como direito do produtor.

O segundo grupo cravou mais uma vitória com o decreto assinado pelo presidente Michel Temer (MDB) na sexta-feira (29). Dois dias depois terminaria o prazo para as inscrições, mas os faltosos ganharam mais cinco meses para cumprir sua obrigação.

Ao incluir seu terreno no cadastro, o dono entrega uma espécie de mapa detalhando a localização das áreas de reserva legal (que varia de 20% na mata atlântica a 80% na Amazônia ) e de preservação permanente (como a faixa contígua a corpos d'água).

Se houve antes desmate acima do permitido em lei, o infrator estará automaticamente assumindo a culpa e se comprometendo com a recuperação da parte devastada.

Essa foi a contrapartida para as benesses que o Código Florestal aprovado em 2012 conferiu a desmatadores. Na prática, os que destruíram vegetação nativa de forma ilegal antes de 2008 receberam uma anistia –mais uma medida a indicar, para quem cumpre as regras, que há bem pouca vantagem em fazê-lo.

Pelo código, todos teriam um ano para assumir suas obrigações ambientais. Esse prazo foi prorrogado em 2015 e em 2016. Agora, sofre novo adiamento, para benefício dos inadimplentes.

O maior atraso no cadastramento se verifica no Nordeste, onde só 82% da área potencial, segundo o Censo Agropecuário de 2006, terminou de fato registrada até o último dia 30 de novembro. No Centro-Oeste (95%) e no Sul (98%), o processo andou melhor.

No Norte e no Sudeste, ultrapassou-se a marca de 100%, a demonstrar que não se pode confiar nos dados fundiários disponíveis. Ou o censo está desatualizado ou há superposição de terras –ou ambas as hipóteses.

A anistia foi o compromisso possível na ocasião. De um ponto de vista pragmático, o melhor a fazer seria aceitá-la e pôr um ponto final na querela do desmatamento.

A concessão só se afigura razoável, entretanto, se o restante do acordo (cadastramento e regularização ambiental) também for cumprido pelos proprietários rurais.

Correr ao Planalto para obter novos adiamentos só reforça a convicção de que muitos ainda se recusam a admitir estarem em dívida com a lei e a natureza.

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