Que esta face do Brasil arcaico desapareça sem deixar saudade, afirma leitora
Fiquei chocada com o espaço e o enfoque dado pela Folha às mudanças na legislação trabalhista para os empregados domésticos: foram três reportagens de capa do caderno Mercado (23, 23 e 24 de março), em três dias consecutivos, além da coluna de Danuza Leão.
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Estrangeiros aderem ao hábito brasileiro de ter empregados domésticos
"Doméstica é libertação para carreira da brasileira"
O tom dos textos é estarrecedor: uma executiva que morou anos fora do Brasil comenta que ainda hoje os filhos arrumam sua própria cama, como se isso fosse algo de se espantar! Executivos estrangeiros, nascidos em terras mais civilizadas, já se acostumaram com o trabalho doméstico no Brasil e o jornal pergunta, como farão agora?
Reportagens acenam (ou ameaçam?) quanto ao perigo do desemprego, enquanto afirmam que a existência de empregadas domésticas libertou a mulher para o trabalho!
Não fosse um pequeno artigo do sociólogo Ricardo Antunes, lembrando que a existência de serviços domésticos no Brasil é um resquício da escravidão e o editorial de 25 de março de 2013, que reconhece a bárbara discriminação entre empregados domésticos e demais empregados no Brasil.
Eu perguntaria: a Folha acredita que as empregadas domésticas não são alfabetizadas e não se interessam por informação, o que justificaria as reportagens tão declaradamente discriminatórias? Ou a Folha, que procura mostrar ser um jornal tão moderno, está presa a uma herança escravista, da qual também precisa se libertar?
Veja os personagens de 16 histórias ouvidas pela reportagem
Acredito que serão necessários mais alguns editoriais e talvez pedidos públicos de desculpas às mulheres empregadas domésticas pelas reportagens da semana passada, especialmente quando o jornal considerou que a liberdade de algumas mulheres teria que implicar a servidão de muitas outras.
Última observação: cada vez mais, como professora, conheço e convivo com empregadas domésticas que estão se formando em cursos supletivos, chegando ao nível superior, formando-se e contribuindo para acabar com um Brasil arcaico, velho e moribundo, que separa e discrimina pessoas nos elevadores e que ainda mantém, na arquitetura de alguns prédios, cubículos sem janela para moradia de domésticos.
Que esta face do Brasil desapareça sem deixar saudade.
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