Descrição de chapéu desmatamento

Ex-diretor do Inpe afirma que Mourão embaralha ações militares e civis quanto a monitoramento na Amazônia

Ricardo Galvão também criticou o ministro Marcos Pontes por não defender o órgão das críticas de integrantes do governo Bolsonaro

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Brasília

Ex-diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) Ricardo Galvão disse nesta terça-feira (22) que o vice-presidente Hamilton Mourão "embaralha" ações militares e civis ao propor uma agência para centralizar o sistema de monitoramento da Amazônia.

Galvão também criticou o ministro Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovação) por não ter defendido o Inpe das críticas recentes que partiram do vice-presidente e de outros membros do governo Jair Bolsonaro.

O ex-diretor foi exonerado do cargo, em 2019, após embate com o presidente Jair Bolsonaro, que questionou os dados mostrando o aumento do desmatamento na Amazônia.

As declarações foram dadas no segundo dia de audiência organizada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), sob coordenação do ministro Luís Roberto Barroso, para discutir o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, além de outras questões ambientais. O evento se dá no âmbito da ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) 708, ingressada por partidos de esquerda.

No primeiro dia, participaram o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ministros, como Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovação), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Tereza Cristina (Agricultura), além de diretores de órgãos ambientais, de organismos multilaterais e representantes da sociedade civil.

O vice-presidente vem defendendo publicamente a criação de uma agência que concentre os sistemas de monitoramento por satélite da Amazônia. Mourão cita como exemplo o órgão norte-americano NRO (Escritório Nacional de Reconhecimento, na sigla em inglês), sob controle militar.

"Ao propor que a nova agência seguiria o modelo da agência nacional americana, NRO, o governo está claramente indicando a intuição de controlar as atividades de observação da terra sob a ótica das aplicações militares", afirmou Galvão, durante a audiência.

O ex-diretor do Inpe ressaltou, no entanto, que a legislação americana prevê que o NRO e outras agências com fins militares sejam proibidas de atuar dentro do território americano. O monitoramento ambiental é feito por institutos civis.

"Portanto, em sua proposta, o vice-presidente está transmitindo uma ideia confusa do que seja monitoramento da Amazônia, embaralhando ações militares com civis", afirmou.

Galvão também afirmou que a centralização do sistema de monitoramento em um órgão dentro da hierarquia militar iria afetar a credibilidade internacional dos dados. Além disso, argumenta, haveria dificuldade para que agentes públicos e privados tivessem acesso aos dados para análises.

O ex-diretor também criticou a compra de satélites pelo Ministério da Defesa e pelo Ministério da Justiça. Em relação à aquisição pela Defesa de um satélite com tecnologia de radar, chamado Lessônia 1, Galvão afirmou que havia planos para o desenvolvimento do equipamento no Brasil, mas o atual governo preferiu adquirir no exterior, sem haver desenvolvimento de tecnologia.

O ex-diretor do Inpe também criticou o ministro Marcos Pontes por não ter defendido o órgão de ataques contra a credibilidade dos dados. Recentemente, o vice-presidente Mourão afirmou algum servidor dentro do Inpe divulgaria dados negativos para prejudicar o governo.

"​Infelizmente, em sua manifestação o ministro Marcos Pontes, apesar de corretamente mencionar que os dados do instituto são auditados e transparentes, evitou contestar as críticas de forma mais veemente apresentando um cenário rosado para o instituto", disse.

Galvão também ressaltou o trabalho de seu antigo órgão no combate aos crimes ambientais e criticou os ataques recentes ao órgão e também aos órgãos ambientais.

"Os resultados produzidos até recentemente no monitoramento e controle do desmatamento em vários biomas brasileiros se deve ao trabalho árduo e dedicado de várias instituições nacionais, em particular Ibama, ICMBio e Inpe. Por isso, é com grande tristeza que vemos a forma como essas instituições são tratadas no atual governo."

As críticas à política ambiental do governo Bolsonaro também teve a adesão de produtores rurais. O engenheiro Pedro de Camargo Neto, ex-presidente da SRB (Sociedade Rural Brasileira) criticou a série de ações judiciais que contribuíram para o enfraquecimento do Código Florestal.

Camargo Neto pediu com urgência uma interpretação única do STF.

"Quem perde com esse ativismo é a sociedade e, junto com ela, o meio ambiente. Essas ações não são diretamente responsáveis pela crise conjuntural atual, mas certamente têm reflexos nesta complexa questão”, disse.

O engenheiro pediu atuação do poder público para coibir falhas que levam a crimes ambientais. Camargo Neto afirmou que existe um "vazio" que tem sido ocupado por atividades criminosas, como a grilagem, o garimpo ilegal, entre outros assuntos. Essas atividades, argumenta, acaba atingindo os produtores rurais, que ficam com suas imagens prejudicadas.

A ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira relembrou que o Brasil havia atingido um grau de credibilidade devido à proteção do meio ambiente, mas que pouco está se mantendo. Ela afirma que o programa Floresta Mais, lançado pelo ministro Ricardo Salles, é feito com recursos oriundos da redução das emissões em anos passados, antes do governo Bolsonaro, situação que dificilmente será mantida.

Teixeira afirmou ainda que é urgente destravar o Fundo do Clima e afirmou que a situação atual do meio ambiente no Brasil é um novo "7 a 1".

“Se vamos andar com vontade política e com diálogo e para sairmos dessa situação impensável em que o Brasil se encontra hoje, é importante que a vontade política seja verdadeira. Isso não pode ser um exercício de bravatas”, disse.

“É preciso conter esse retrocesso, nós temos que entender como avançar com o Fundo Clima. Está aí uma agenda de um novo 7×1 do Brasil. O Brasil está perdendo essa expressão de soft power e da diplomacia climática.”​

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