Google falha em cortar anúncios de vídeos com mentiras sobre mudança climática, mostra novo estudo

YouTube afirma ter removido anúncios de parte dos vídeos apontados em pesquisa

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Nico Grant Steven Lee Myers
The New York Times

Em outubro de 2021, o Google prometeu parar de colocar anúncios junto com conteúdo que negasse a existência e as causas da mudança climática, para que os fornecedores de falsas afirmações não pudessem ganhar dinheiro em suas plataformas, incluindo o YouTube.

No entanto, se você clicou recentemente num vídeo do YouTube intitulado "Quem é Leonardo DiCaprio", pode ter encontrado uma série de alegações de que a mudança climática é uma farsa e que o mundo está esfriando, depois de um anúncio da Paramount+ do filme "80 for Brady", estrelado por Lily Tomlin, Jane Fonda, Sally Field e Rita Moreno.

Antes de outro vídeo que pretendia detalhar "como os ativistas climáticos distorcem as evidências", alguns usuários viram um anúncio da Alaska Airlines.

Essas não são aberrações, de acordo com uma coalizão de organizações ambientais e o Centro de Repúdio ao Ódio Digital (Center for Countering Digital Hate). Em um relatório divulgado nesta terça-feira (2), pesquisadores das organizações acusaram o YouTube de continuar lucrando com vídeos que retratavam a mudança climática como uma farsa ou exagero.

Logos do youtube se repetem em uma tela
Logotipos do YouTube em uma tela - AFP

Eles encontraram cem vídeos, vistos pelo menos 18 milhões de vezes no total, que violavam a própria política do Google. Encontraram vídeos acompanhados de anúncios de outras grandes marcas, como Adobe, Costco, Calvin Klein e Politico. Até mesmo um anúncio do mecanismo de busca do Google apareceu antes de um vídeo que afirmava não haver consenso científico sobre a mudança climática.

"Isso realmente levanta a questão sobre qual é o atual nível de fiscalização do Google", disse Callum Hood, chefe de pesquisa do Centro de Repúdio ao Ódio Digital.

É difícil avaliar toda a extensão da desinformação no YouTube, disseram os pesquisadores, porque assistir a vídeos é um trabalho demorado, e eles têm acesso limitado aos dados, deixando-os dependentes de pesquisas laboriosas na plataforma com palavras-chave. "Acho que é justo dizer que provavelmente é a ponta do iceberg", acrescentou Hood, referindo-se ao que eles encontraram.

Fonda, que dirige um comitê de ação política dedicado ao combate às mudanças climáticas, disse em um comunicado que é "repugnante que o YouTube viole sua própria política" ao exibir vídeos falsos sobre o clima com anúncios, dando mais validade ao conteúdo, enquanto "a Terra está queimando".

"Estou chocada que um anúncio de um dos meus filmes apareça num desses vídeos, e espero que o YouTube pare com essa prática imediatamente", disse Fonda.

Anúncios do Grubhub, serviço de entrega de comida, apareceram várias vezes antes dos vídeos de negação do clima, descobriu The New York Times. Um porta-voz do Grubhub disse que a empresa estava trabalhando com o YouTube e outros parceiros para "impedir que anúncios do Grubhub aparecessem ao lado de conteúdo que promova desinformação".

Michael Aciman, porta-voz do YouTube, disse em comunicado que a empresa permitia "debates sobre políticas ou discussões de iniciativas relacionadas ao clima, mas quando o conteúdo cruza a linha da negação da mudança climática removemos os anúncios da veiculação nesses vídeos".

Ele acrescentou que o YouTube removeu anúncios de vários vídeos sinalizados pelos pesquisadores, incluindo o que promovia "80 for Brady".

Como a desinformação se tornou um flagelo online cada vez maior, o YouTube tentou equilibrar sua intenção de ser uma plataforma aberta para diversas opiniões com o interesse em fornecer aos usuários fatos comprovados sobre temas importantes. Nos últimos anos, a plataforma reprimiu a mentira de que a eleição presidencial nos EUA em 2020 foi roubada e as falsas afirmações sobre vacinas.

Em 2021, quando a empresa mudou suas regras sobre mudanças climáticas, ela disse que anunciantes e parceiros de publicação ficaram cada vez mais desconfortáveis por aparecer ao lado de conteúdo climático impreciso.

A política do Google se aplica a conteúdo que se refere à mudança climática como uma farsa ou fraude, nega a tendência de longo prazo de que o clima está esquentando ou nega que as emissões de gases do efeito estufa ou a atividade humana estejam contribuindo para a mudança climática.

Em alguns dos vídeos climáticos que os pesquisadores encontraram —alguns com anúncios e outros sem—, o YouTube tinha uma caixa de "contexto" com informações confiáveis, sinalizando que sabia que os vídeos apresentavam afirmações falsas ou pelo menos contestadas.

"A mudança climática refere-se a mudanças de longo prazo nas temperaturas e nos padrões climáticos, causadas principalmente por atividades humanas, especialmente a queima de combustíveis fósseis", escreveu o YouTube, dando link para um site da ONU sobre o assunto.

A pesquisa do Centro de Repúdio ao Ódio Digital e a Ação Climática Contra a Desinformação, uma coalizão internacional de mais de 50 grupos de defesa ambiental, sugeriu que o YouTube ignorou ou menosprezou conteúdo violador. Eles identificaram outros cem vídeos que não violavam explicitamente as políticas do Google, mas atendiam a uma definição mais ampla de desinformação climática que também deveria ser abordada.

"Isso demonstra que o YouTube está atualmente lucrando com uma gama muito mais ampla de desinformação sobre o clima do que é coberto por suas políticas restritas", disse o relatório.

Os vídeos citados pelo grupo vêm de várias fontes, incluindo especialistas, podcasters e grupos de defesa.

Eles também incluíram gigantes da indústria como a Exxon Mobil, que foi acusada de greenwashing por sua contribuição para as emissões de carbono, embora seus vídeos não violassem explicitamente as políticas do YouTube; e a grande mídia conservadora como a Fox News, cujos vídeos às vezes o faziam.

(Num deles, o âncora recém demitido da Fox, Tucker Carlson, descartou a luta contra a mudança climática como "um esforço coordenado do governo da China para prejudicar os Estados Unidos e o Ocidente e tomar seu lugar como líder mundial".)

A Exxon Mobil e a Fox não responderam imediatamente a um pedido de comentário.

Quase todos os vídeos apresentavam anúncios, descobriram os pesquisadores, o que significava que o YouTube estava gerando receita com o conteúdo e, em alguns casos, pode ter pago a criadores pelos vídeos.

A colocação de anúncios é um processo automatizado. Os vídeos da plataforma geralmente são direcionados a espectadores específicos, o que significa que diferentes usuários verão diferentes comerciais antes da reprodução do mesmo vídeo.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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