Descrição de chapéu Planeta em Transe petrobras

Indígenas do Amapá e Pará comemoram negativa do Ibama para exploração de petróleo

Lideranças expressam preocupação por falta de informações a respeito de projeto na Foz do Amazonas; Petrobras afirma que atividade é de baixo risco

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Macapá (AP)

A negativa do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas foi recebida com comemoração por entidades indígenas do Amapá e do Pará, assim como por ONGs internacionais de preservação da natureza que atuam na região.

A Apoianp (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará), o CCPIO (Conselho de Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque), o Greenpeace, o WWF e o Observatório do Clima manifestam preocupação, desde antes da negativa, em relação à falta de informações para as comunidades que podem ser afetadas pelo projeto de perfuração da bacia.

Lideres indígenas com cocar sentados em cadeiras
Lideranças indígenas do Amapá reunidas em março em assembleia para debater desafios da população indígena, como a exploração do petróleo na costa do Amapá - Apoinp/Divulgação

Para a Apoinp e o CCPIO, a Petrobras não apresentou um estudo de impactos sociais adequado diante do inevitável crescimento populacional que ocorreria em Oiapoque (AP), município localizado no extremo norte, na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa, onde se concentra a maior parte da população indígena do Amapá.

As entidades lançaram uma nota conjunta "contra projetos de exploração que desrespeitam o direito à consulta livre, prévia e informada, garantido pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre povos indígenas e tribais".

Em nota, a Petrobras afirmou que a atividade de pesquisa de petróleo, pedida ao Ibama, é temporária, de baixo risco, com duração aproximada de cinco meses. Caso seja confirmado o potencial produtivo, a empresa confeccionará, afirma, um novo procedimento de licenciamento ambiental com a elaboração de estudos e projetos ambientais mais detalhados.

A estatal disse, ainda, que a estrutura de resposta a emergências é a maior já apresentada no país, composta por 12 embarcações, cinco aeronaves, cem profissionais e sistemas de contenção de óleo e bloqueio de poços.

O Amapá possui uma população indígena estimada em 5.802 habitantes em Oiapoque, 3.043 no parque do Tumucumaque (unidade de conservação entre AP e PA) e 1.220 em Pedra Branca do Amapari, totalizando 10.065, segundo dados da Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas, do governo estadual.

A porta-voz da Apoianp, Luene Karipuna, conta que tentou contato com a Petrobras para consulta prévia, mas não obteve retorno. Por este motivo, a organização rejeitou os convites de audiências públicas.

A entidade é composta pelas etnias apalai, akuriyó, galibi-marworno, galibi kali'na, karipuna, katxuyana, palikur-arukwayene, sikyiana, wajãpi, wayana, tiriyó e txikuyana.

"Nós entendemos que eles [da Petrobras] poderiam usar a nossa presença em audiências públicas gerais como justificativa de consulta prévia. Sendo que, na verdade, a consulta prévia segue outro modelo de critério e atende um protocolo diferente, de acordo com as nossas necessidades", disse Karipuna.

O CCPIO reúne as etnias karipuna, galibi-marworno, galibi kali'na e palikur, que estão divididas em cinco regiões, entre elas as próximas aos rios Curipi, Uaçá, Urucauá, Oiapoque e a BR-156.

As principais atividades econômicas e de subsistência desses povos são a agricultura, a caça e a pesca. Para o Conselho dos Caciques, a exploração na região gera diversos riscos aos indígenas.

Para um dos caciques ouvidos pela reportagem, que pediu anonimato, quando o estudo dizia que a terra indígena estava fora de perigo, a informação não seria a realidade, porque a terra indígena já está sendo impactada de alguma forma.

Segundo ele, os indígenas têm relatado problemas causados pelas aeronaves que passam por cima das aldeias e afugentam animais, além do maior fluxo de pessoas em Oiapoque propiciado pelas atividades de preparação para explorar petróleo na bacia da Foz do Amazonas.

Em maio, a Assembleia Legislativa do Amapá organizou audiência pública para reunir políticos, associações e a sociedade civil para debater a possível exploração de petróleo na região de Oiapoque.

O porta-voz de oceanos do Greenpeace Brasil, Enrico Marone, relata que a região da disputa entre a Petrobras e o Ibama é muito sensível, por abrigar uma faixa contínua de mangues que vai do Amapá até o Maranhão.

O ativista explica que o bioma tem um papel fundamental para o equilíbrio climático do planeta, pois compensa a emissão de gases do efeito estufa, retendo carbono. Outro ponto é a presença dos recifes de corais na foz do Amazonas, descobertos em 2016 e ainda pouco estudados pela ciência.

"Em 2017, a Greenpeace fez uma expedição a bordo do navio Esperanza para vários levantamentos. Mapeamos a presença do grande sistema de recifes de corais ‘da Amazônia’. Nunca tinham sido vistos ou registrados numa região que supostamente não existiriam, por ter muita carga e sedimento do rio Amazonas ali", conta Marone.

Com base em relatório da ONU (Organizações das Nações Unidas), o WWF, em nota, diz ser "urgente reduzir as emissões de gases de efeito estufa, como os decorrentes da queima de combustíveis fósseis". "Seria, portanto, um erro se o Brasil fosse na contramão da ciência e apostasse em novas fronteiras exploratórias de petróleo e gás, que estão entre os mais poluentes".

O Observatório do Clima, rede de mais de 90 organizações socioambientais, ressaltou que tratados internacionais, como o Acordo de Paris, miram mitigação, adaptação e financiamento para uma transição de energia limpa até 2030.

"O momento é de estabelecer um calendário para a eliminação dos combustíveis fósseis e acelerar a transição justa para os países exportadores de óleo", diz Suely Araújo, especialista-sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.

"Quem dorme hoje sonhando com a riqueza petroleira tende a acordar amanhã com um ativo encalhado, ou um desastre ecológico, ou ambos."

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.