Descrição de chapéu Deutsche Welle Twitter

Elon Musk e o negacionismo do clima no Twitter

Empresário fez afirmações públicas negando conhecimentos básicos da ciência sobre o papel da agricultura no aquecimento do planeta

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Ajit Niranjan
DW

Elon Musk, o rico proprietário do Twitter, alegou falsamente que a agricultura não tem grande efeito sobre o clima —provocando correções de cientistas e aumentando o medo de desinformação na influente plataforma de mídia social.

Elon Musk está sendo criticado por espalhar desinformação climática no Twitter - Gonzalo Fuentes/Reuters

Em um tuíte

No final de junho, Musk disse que "o que acontece na superfície da Terra (por exemplo, a agricultura) não tem impacto significativo nas mudanças climáticas". Ele continuou, dizendo que o risco da mudança climática vem predominantemente da movimentação de carbono nas profundezas do subsolo para a atmosfera. "Com o tempo, se continuarmos fazendo isso, a composição química de nossa atmosfera mudará o suficiente para induzir uma mudança climática significativa."

Os cientistas rapidamente apontaram que ele estava errado em dois aspectos. Primeiro, a poluição por gases de efeito estufa da agricultura, silvicultura e outros usos da terra representa 13% a 21% das emissões globais entre 2010 e 2019. Em segundo lugar, os humanos aqueceram o planeta em 1,2 grau Celsius, o que já tornou mais fortes e frequentes eventos climáticos extremos, desde inundações costeiras até ondas de calor.

"As atividades humanas, principalmente por meio de emissões de gases de efeito estufa, sem dúvida causaram o aquecimento global", tuitou, em resposta a Musk, o Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados, uma organização de pesquisa global com sede na Áustria.

Teorias da conspiração

Musk, uma figura pública com 145 milhões de seguidores no Twitter e que se autodenomina "um absolutista da liberdade de expressão", promoveu repetidamente teorias da conspiração desde que comprou a plataforma em outubro. Seus alvos recentes incluem o bilionário filantropo George Soros, alvo frequente de ódio antissemita; Nancy Pelosi, política americana do Partido Democrata; e o grupo de jornalismo investigativo Bellingcat.

"Vou dizer o que quero dizer, e se a consequência de fazer isso for perder dinheiro, que assim seja", disse Musk em entrevista à emissora americana CNBC em maio, depois de ser questionado sobre seu envolvimento com teorias da conspiração e seus efeitos na receita publicitária do Twitter.

Um pedido de comentário da DW enviado à assessoria de imprensa do Twitter em 27 de junho recebeu uma resposta gerada automaticamente com um emoji de cocô. Isso parece ter se tornado a resposta padrão da empresa de mídia social aos pedidos da mídia por comentários desde as demissões ocorridas em sua equipe de comunicação no início do ano.

Negacionismo climático

O nível de negacionismo climático no Twitter aumentou no ano passado, de acordo com uma análise recente publicada pelo grupo de campanha global Climate Action Against Disinformation e o pesquisador de desinformação Abbie Richards, membro do Accelerationism Research Consortium, sem fins lucrativos.

A partir de julho de 2022, eles descobriram que o número de tuítes com termos de negação climática aumentou de cerca de 30 mil por semana para cerca de 110 mil. Os tuítes incluíam alegações de que a mudança climática é uma "fraude" promovida por "globalistas".

Os cientistas dizem que o nível de abuso dos negacionistas do clima também aumentou desde que Musk assumiu. "Não tenho visto isso da mesma forma que alguns de meus colegas porque tenho coceira no dedo", disse Julia Steinberger, professora de economia ecológica da Universidade de Lausanne, na Suíça. Ela estima que bloqueou dezenas de milhares —senão centenas de milhares— de contas abusivas ou que negam o clima. "As coisas definitivamente pioraram muito desde que Musk assumiu."

Steinberger, autora do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), apoiado pela ONU, chamou Musk de negacionista do clima em um thread amplamente compartilhado horas depois de seu tuíte. Algumas das respostas continham críticas genuínas sobre o que é considerada como negacionismo climático e o que Musk quis dizer com a palavra "significativo", segundo ela. Muitos mais vieram de negacionistas do clima e de trolls abusivos.

Jordan Peterson, um influente psicólogo canadense com 4,4 milhões de seguidores que se descreve como um liberal clássico, disse que Steinberger estava se apropriando do sofrimento dos judeus no Holocausto ao chamar Musk de "negacionista" do clima.

Steinberger, que é filha do sobrevivente do Holocausto e físico vencedor do Prêmio Nobel Jack Steinberger, disse que a reação "foi bastante intensa, mas administrável" até aquele momento.

O nível de abuso depende do tamanho da conta e do comportamento de seus apoiadores, acrescentou ela. "Até algumas centenas de milhares de seguidores eu posso lidar, mas Jordan Peterson tem 4 milhões", afirmou Steinberger.

Agricultura e mudanças climáticas

Musk também é o chefe da SpaceX, que fabrica espaçonaves, e da Tesla, que fabrica carros elétricos. Na última década, ele fez vários comentários sobre a gravidade das mudanças climáticas, que descreveu como reais e catastróficas. Mas nos últimos meses, Musk minimizou o papel da agricultura e disse que os esforços para conter a poluição das fazendas não ajudarão.

Em resposta a um tuíte em março sobre os agricultores belgas protestando contra as leis para reduzir as emissões de nitrogênio, ele disse: "Sou super pró-clima, mas definitivamente não precisamos tirar os agricultores do trabalho para resolver a mudança climática."

De acordo com a agência de proteção ambiental da Irlanda, a agricultura foi responsável por 38% das emissões de gases de efeito estufa do país em 2021. A maior parte disso veio na forma de metano do gado e óxido nitroso de fertilizantes e estrume. Alguns cientistas alertam que a redução dos rebanhos em um país pode aumentá-los em outros se a demanda por carne não cair. Ainda assim, eles concordam que as emissões de gado são um dos principais contribuintes para a mudança climática.

"Não há dúvida de que as emissões de combustíveis fósseis são maiores, mas esse é um aspecto significativo", disse David Ho, climatologista da Universidade do Havaí em Manoa, nos Estados Unidos.

Os líderes mundiais prometeram limitar o aquecimento global a 1,5°C até o final do século, mas suas políticas atuais apontam para quase o dobro disso. Vários estudos nos últimos anos descobriram que as emissões da agricultura sozinhas são suficientes para fazerem com que o orçamento de carbono ultrapasse a meta.

O consumo global de alimentos sozinho poderia adicionar quase 1°C ao aquecimento até 2100, de acordo com um estudo publicado em março na revista Nature Climate Change. Os pesquisadores descobriram que mais da metade do aquecimento pode ser evitado produzindo melhor os alimentos, adotando dietas saudáveis —incluindo mais vegetais e menos carne— e reduzindo o desperdício de alimentos dos consumidores e do comércio.

Os especialistas enfatizaram a necessidade de combater rapidamente as emissões da agricultura. Tim Searchinger, diretor técnico do programa de alimentos do instituto de pesquisa sobre clima World Resources Institute, disse que as emissões da agricultura estão aumentando tão rapidamente que "provavelmente emitirão mais carbono em 2050 do que o mundo pode aceitar de todas as fontes humanas".

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