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O tal ‘relativo’ brasileiro

Benevolência dos mercados em relação à posição relativa favorável do Brasil não pode ofuscar os esforços de continuidade de iniciativas econômicas que já deram certo

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A recente melhora na avaliação de risco de crédito do Brasil feita pela Fitch Ratings surpreendeu os mercados tanto quanto a piora da classificação de risco dos Estados Unidos.

O comunicado veio em linha com uma visão mais positiva em relação à América Latina —especialmente após os choques da pandemia e da guerra entre Rússia e Ucrânia (acionando a busca por reaproximação de cadeias produtivas globais)—, expectativas de inevitável desaceleração da economia chinesa e deterioração dos fundamentos econômicos nas economias avançadas.

Segundo o comunicado da agência, em tradução livre, "os ratings do Brasil são sustentados por sua grande e diversificada economia, pela alta renda per capita, por profundos mercados domésticos e por um grande colchão de caixa que sustentam a flexibilidade de financiamento soberano e sua alta parcela da dívida em moeda local. Os ratings também são sustentados pela capacidade de absorção de choques, suportada por uma taxa de câmbio flexível, por reservas internacionais robustas e por uma posição soberana líquida credora em moeda estrangeira".

Para o Brasil, na atual conjuntura em particular, pesam nossas vantagens comparativas em setores com sinalização de relativa escassez a longo prazo, em especial na produção de commodities agrícolas, minerais e energéticas.

Em artigo anterior, já discuti os possíveis efeitos de tais vantagens sobre o crescimento potencial do país. Numa inferência de médio prazo, seria razoável esperar benefícios para o setor externo brasileiro, o qual já descreve um quadro bem robusto. Os impactos até agora, contudo, são pouco evidentes.

Há uma real melhora nos fluxos de comércio, em linha com exportações de commodities respondendo por cerca de dois terços da pauta brasileira. O grau de abertura comercial do país alcançou os níveis históricos mais altos, com elevação nos patamares dos termos de troca (relação entre os preços de exportações e importações) depois de 2020.

Os investimentos em portfólio foram levemente positivos para o Brasil no primeiro semestre do ano, em US$ 4,2 bilhões, o que ocorre muito em razão dos elevados diferenciais de juros em relação ao resto do mundo. O ciclo monetário já iniciou seu afrouxamento aqui, e os diferenciais de juros reduzir-se-ão se considerarmos que as economias avançadas estão apenas perto de encerrar seus ciclos de alta de juros. Esse descasamento deverá ser um fator a reduzir a intensidade, ou até reverter, a tendência de entrada de recursos financeiros.

Por sua vez, os investimentos diretos têm se recuperado desde a forte queda sofrida durante a pandemia e deverão retomar os patamares anteriores, próximos a US$ 80 bilhões.

No México, espera-se que haja também elevação dos ingressos de investimento direto estrangeiro, muito em razão do efeito da realocação de cadeias produtivas e de sua proximidade do mercado consumidor dos EUA. Pode ser um sinal para o Brasil, mas até o momento não há evidências desse movimento. Algo que novos acordos internacionais, como o que está sendo discutido entre o Mercosul e a União Europeia, poderão acionar em prazos mais longos.

Há outros pontos mencionados no comunicado da Fitch: "Os ratings [do Brasil] são limitados pela alta dívida do governo, pela rigidez fiscal, pelo fraco potencial de crescimento econômico e por pontuações de governança relativamente baixas".

Desde que o país perdeu o grau de investimento, em 2015, realizou reformas econômicas importantes, na direção de melhorar o ambiente de negócios e o crescimento potencial e de reduzir o déficit fiscal estrutural. Neste ano, há a promessa de aprovar uma histórica reforma na tributação sobre o consumo (a reforma do IVA).

O novo marco fiscal, também em discussão no Congresso, tem sido uma promessa de consolidação das contas públicas, mas com alto risco de execução, visto que tem limites de gastos discrepantes da indexação de despesas obrigatórias e da agenda de políticas públicas do governo.

Adicionalmente, o compromisso de ajuste fiscal baseia-se na elevação de carga tributária, a qual pode ser bastante limitada pelo ciclo econômico contracionista, pela resistência do Congresso em seguir aumentando uma carga de impostos já muito alta ou pela eventual dificuldade de sobrevivência de algumas empresas a uma nova rodada de elevação de custos.

De concreto até aqui, existem os cálculos dos especialistas que apontam que o novo marco fiscal não impede o crescimento da dívida pública como proporção do PIB nem assegura a sua estabilização.

Há, ainda, o reconhecimento da condução de uma política monetária prudente, da independência do Banco Central e dos freios e contrapesos institucionais, os quais têm trazido estabilidade política, um Estado de Direito, qualidade regulatória e institucional e controle da corrupção. Do lado dos investidores, há um reconhecimento da disciplina trazida pelos mercados e das reformas anteriormente aprovadas, assim como da importância das que estão na agenda.

Longe de ser um cheque em branco, as mensagens subliminares recebidas pelo Brasil no período recente, tanto de agências de rating quanto da visão positiva de investidores estrangeiros, passam pelo esforço de reformas e pela importância de manter a disciplina trazida pelos mercados.

Acreditar que isso poderia ser uma benevolência global persistente, em razão da deterioração dos fundamentos econômicos de diversos países depois dos choques mais recentes, seria novamente desperdiçar os benefícios que esse tal "relativo" brasileiro pode trazer para a população em geral.

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