Ator, comediante e roteirista, é um dos criadores da TV Quase, que exibe na internet o programa "Choque de Cultura".
Convivência
A intensidade que pode ter um misto-quente
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
Na dura batalha pelo primeiro beijo, em meio a recreios selvagens e matinês cruéis, acabei não encontrando, mas finalmente sendo encontrado pelo caminho: as férias de verão. Não devido ao seu romantismo juvenil, mas pela oportunidade de socialização num lugar onde a decepção dos outros com a sua personalidade ainda é uma selva a ser desbravada, e enquanto isso haveria tempo para um ou dois do chamado beijo na boca (no máximo dois).
Tudo o que fazíamos era dilacerar as tampas de nossos dedões num futebol feroz na rua de paralelepípedo e eventualmente cair na porrada sem nenhum planejamento, mas ainda assim acabei atraindo o interesse de uma jovem do prédio da frente, informação naturalmente trazida por outrem.
Após semanas de intermináveis e infrutíferas conversas na sacada do prédio, as férias chegavam perigosamente ao fim e eu tinha que tomar uma atitude: convidei-a então para um encontro amoroso. O destino era o local mais sexy possível, o alçapão das atividades libidinosas adolescentes, o shopping. O plano, andar em círculos obsessivamente observando vitrines sem nenhum interesse de compra (ou interesse na observação), folhear aleatoriamente revistas de tatuagem e requisitar as duas colheres de sorvete que temos direito de provar na sorveteria, e assim o beijo na boca fatalmente aconteceria em algum desses momentos. Ela me perguntou quando eu gostaria de marcar e, ansioso, não tive dúvida: no dia seguinte, às 8h. Me pareceu um bom horário.
Na manhã seguinte, me arrumei com cuidado, o que significava vestir uma boa bermuda e qualquer tênis, nos encontramos na sacada do prédio onde conversávamos e rumamos para o encontro que consistiria em conversar em outro lugar.
Para nossa surpresa, o shopping estava fechado e só abriria às 10h. Quem diria. Sentamos numa padaria e comemos um misto-quente que teve que durar duas horas, até que o shopping abriu, mas já exaustos e sem assunto, demos apenas uma volta protocolar e, desgastados e desinteressados um do outro depois do massacrante misto-quente de 120 minutos, apenas observamos nosso relacionamento e as férias chegarem ao fim sem amostras de sorvete, sem revistas de tatuagem, sem beijo na boca e com uma total descrença em convivências maiores que duas horas.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters