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Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Deborah Bizarria

O jogo de poder na reforma tributária reduz seus benefícios

Ciclo vicioso de benefícios fiscais cria uma dinâmica perversa, onde a sociedade arca com o custo das concessões feitas a grupos de interesse

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O atual sistema tributário brasileiro é injusto, regressivo, complexo e prejudicial à economia. A tributação sobre o consumo impacta desproporcionalmente a população de baixa renda, que arca com uma carga tributária maior devido à dependência do Estado de tributos de fácil arrecadação. A complexidade das regras exige tempo e recursos significativos para o cumprimento das obrigações, prejudicando a competitividade das empresas e sobrecarregando o Judiciário na definição das categorias de produtos. Assim, a aprovação da reforma tributária é uma vitória para o país, embora com um sabor de fundo amargo, devido às inúmeras exceções introduzidas por grupos de pressão.

BRASÍLIA, DF, 20.12.2023 Congresso promulga reforma tributaria com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da silva - Folhapress

Esses lobbies não são novidade. O sistema atual é um verdadeiro manicômio tributário justamente graças à capacidade de setores organizados conseguirem privilégios e regimes especiais, justificando suas demandas pela importância econômica e geração de empregos. Porém, não são todas as atividades econômicas importantes?

Nesta semana, o lobby do agronegócio destacou-se ao buscar isenções fiscais para carnes, alegando apoio aos mais pobres. Embora essa medida pareça beneficiar a população de baixa renda, na verdade, favorece desproporcionalmente grandes produtores e empresas do setor alimentício, com pouca redução nos preços para os consumidores. Itens como arroz, feijão, carnes, farinhas, açúcar, macarrão e pão são essenciais, mas a melhor forma de garantir seu acesso a quem mais precisa é através da devolução de impostos (cashback), e não por subsídios que beneficiam o setor.

O sistema de cashback, que reembolsa uma porcentagem do valor gasto em compras ao informar o CPF durante a transação, é uma abordagem mais direta e equitativa. Esse reembolso pode ser imediato como desconto, creditado em conta-corrente, ou adicionado a benefícios sociais, ajudando principalmente famílias de baixa renda a mitigar o impacto dos impostos indiretos. O sucesso do programa "Devolve ICMS" no Rio Grande do Sul exemplifica bem a eficácia desse tipo de política. Ampliar a cesta básica reduz a força desse mecanismo de devolução.

Cada novo benefício concedido a setores específicos resulta em um aumento da alíquota média paga pelo cidadão comum e pelo empresário que não possui o mesmo poder de lobby. O agronegócio não foi o único beneficiado recentemente: Apesar de serem poluentes, as motocicletas terão tratamento especial na reforma tributária porque são produzidas na Zona Franca de Manaus, e por isso serão isentas do Imposto Seletivo (IS) que recai sobre itens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Curiosamente, mesmo não emitindo poluentes, os carros elétricos foram incluídos no IS, já os caminhões, muitos movidos a diesel, ficaram de fora sob a justificativa de que são cruciais para a logística.

Críticos da reforma apontam para o provável IVA mais alto do mundo, como se esse valor não fosse fruto de um processo político em grande medida disfuncional. Esse ciclo vicioso de benefícios fiscais cria uma dinâmica perversa, onde a sociedade arca com o custo das concessões feitas a grupos de interesse.

O governo Lula, que deveria liderar as negociações das mudanças no sistema tributário, mostrou falta de articulação política em um Congresso pouco amigável. O que tivemos nessa semana foi vídeo do ministro da Fazenda comemorando a alíquota reduzida em 30% para planos de saúde para animais domésticos. Ao mesmo tempo, vimos membros da oposição também comemorando o aumento da lista de isenções.

Como país temos dificuldade de implementar regras de forma isonômica, graças a nossa dinâmica política de conceder privilégios. Espero que as virtudes da reforma tributária, ao simplificar e tornar transparentes os impostos que pagamos, nos ajudem a escancarar o tratamento diferenciado que alguns conseguem ganhar.

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