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Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

Políticas de drogas nas mãos do STF

Temos a possibilidade de avançar, talvez pela última vez nos próximos 4 anos

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Atualizar a política de drogas no Brasil é crucial para a melhoria da segurança pública. Em quatro semanas, o país terá a chance de dar um passo importante. O Supremo Tribunal Federal poderá decidir que o porte para consumo pessoal de substâncias ilícitas não é crime, fazendo com que o Brasil se junte à maioria dos países sul-americanos que já avançaram nesse sentido. A oportunidade também abriria espaço para que a saúde pública e outras áreas ligadas ao desenvolvimento humano, social e econômico possam ajudar as pessoas que fazem uso problemático dessas substâncias.

O Supremo é a maior esperança de progresso no tema nos próximos quatro anos. Infelizmente, essa é mais uma das pautas sérias tratadas de forma ideológica e ultrapassada pelo governo federal. E não é de hoje. Nos dois últimos governos, os retrocessos foram impulsionados pelo mesmo grupo que ainda está no poder, e que inclusive ordenou o embargo da pesquisa nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira, realizada pela Fiocruz. Talvez pelo fato de que a pesquisa supostamente não comprova a tal epidemia que precisam para “justificar” suas retrógradas propostas.

 

A Nova Política Nacional sobre Drogas, lançada em abril deste ano, só é nova no nome. Tanto ela quanto o PLC 37/2013, projeto de lei que tramita a toque de caixa no Senado, ignoram as evidências científicas e alteram a lei e as políticas de drogas para pior. Neste ano, uma comissão de juristas entregou ao 
Congresso projeto de lei com avanços importantes, mas o mesmo foi solenemente ignorado. Conhecemos a fundo o custo humano e financeiro da política de drogas atual e não podemos mais insistir no erro e continuar tratando o consumo de substâncias ilícitas como questão criminal.

Com tal postura, sofremos todos, principalmente os dependentes químicos e suas famílias, que deixam de ter opções de tratamento e atenção individualizados e baseados em conhecimento de ponta. O impacto negativo também é sentido no trabalho policial, na questão prisional, nos homicídios —em especial nos cometidos por policiais, na marginalização da juventude negra, e na atenção tardia, e muitas vezes equivocada, à saúde mental.

O argumento simplista que circula nos meios refratários à mudança é de que não estamos preparados para ela, pois não temos as políticas públicas para atender à demanda que apareceria com medidas de flexibilização da lei. Há vários equívocos nessa afirmação, a começar pelo fato de que há políticas públicas na área da prevenção, redução de danos, tratamento e assistência social no Brasil. Elas precisam ser dimensionadas e aprimoradas, e para tanto é fundamental recebermos o público-alvo sem que tenha medo de pedir ajuda pela estigmatização e criminalização do tema.

Em segundo lugar, não houve explosão de consumo nos mais de 30 países que descriminalizaram o uso de drogas. Importante ressaltar que nesse modelo, as drogas continuam ilegais, mas separa-se de vez o consumo do tráfico, o que permite redirecionar os escassos recursos das forças policiais e do sistema de Justiça criminal para combater o crime organizado violento.

Por fim, depois de me debruçar sobre esse tema por mais de uma década, conhecendo de perto diversas experiências, posso afirmar que nada é tão perverso e contraproducente quanto a política de drogas atual. Com responsabilidade, é possível mudar a lei, monitorar sua aplicação e fazer os ajustes necessários para que os seus objetivos iniciais de promover a saúde, o bem-estar e a segurança das pessoas possam ser finalmente atingidos.

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