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Mestre em Economia Aplicada pela USP, é professora do Insper e foi secretária de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo

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Cadastro Único, nosso melhor instrumento de política social, precisa ser potencializado

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O Cadastro Único é o instrumento de concessão do Bolsa Família, do Pé-de-Meia, da faixa 1 do Minha Casa Minha Vida, da tarifa social do saneamento e outros programas. É a principal porta de entrada de toda política pública social destinada aos mais vulneráveis.

Após a perda de qualidade gerada pelo incentivo adverso dos pisos monetários no Auxílio Brasil e no Auxílio emergencial, o cadastro teve um último ano de esforços e sucessos. No entanto, a caminhada ainda é longa: não apenas nessa recuperação, mas também em definições estruturais nunca antes equacionadas.

A Constituição estabelece em seu artigo 6º que "todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar". O Brasil avançou ao constitucionalizar uma renda mínima, mas os próximos passos não são menos desafiadores: o país precisa entender os conceitos de renda e básica.

Fila para atualização de dados do CadÚnico em Salvador. - 11.nov.2021 (Franco Adailton/Folhapress)

Será que, por básica, se espera que seja definida uma cifra absoluta? Uma linha de pobreza como, por exemplo, os R$ 218 per capita do Bolsa Família? A Europa estabelece um dispositivo de referência que atualiza a linha para cima quando um país enriquece —sempre que possível, para além da inflação. O Brasil não tem esse mecanismo postulado.

E o que se entende por renda? Tanto a Organização das Nações Unidas (ONU) quanto a Organização Internacional do Trabalho (OIT) recomendam que a composição da renda considere sua parcela não monetária —produção para consumo próprio e transferências recebidas em bens como doações e heranças, entre outras. Também não temos um dispositivo regulamentado a respeito.

Considerando o Bolsa Família como ele é —sem observar a renda não monetária e com uma linha fixa de pobreza—, podemos mimetizar, tentar simular os conceitos de universo, família e renda do Cadastro Único e contrastá-lo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC).

O Cadastro Único é autodeclaratório, enquanto a pesquisa é feita pelo IBGE em uma amostra de domicílios e, por ter propósitos múltiplos, investiga diversas características socioeconômicas da população. Nada garante que o cadastro de 2023 meça as mesmas coisas que a PnadC de 2022, e toda aproximação de informações e conceitos diferentes tem limitações.

Um estudo do Insper lançado em 8 de março, feito a partir de uma tentativa de compatibilização de conceitos, contrasta ambas as pesquisas. Ele encontrou 22,3 milhões de famílias vulneráveis no Cadastro Único de 2023 e 15,8 milhões de famílias na PnadC de 2022: uma diferença de 6,6 milhões, ou 29% a mais.

A depender do conceito de renda usado na mimetização, a diferença pode variar entre 2 milhões e 9,6 milhões. A heterogeneidade é enorme entre os estados: Rondônia, Roraima e Santa Catarina têm quantidades muito similares na comparação, enquanto Rio de Janeiro, Amapá e Piauí têm o dobro de famílias vulneráveis na PnadC.

Caso pudéssemos melhorar a qualidade do cadastro, poderíamos, por exemplo, aumentar a linha de pobreza com os novos recursos. Quais as implicações desse contraste encontrado para a política pública? Precisamos de uma avaliação da qualidade mais profunda, que envolva a dupla checagem de uma amostra dos cadastrados, com a finalidade de entender falhas e aperfeiçoamentos possíveis.

Outra implicação é a oportunidade de compartilhamento de boas práticas de cadastramento entre estados e municípios. Se existem regiões com resultados melhores, é de extrema importância que suas práticas sejam compartilhadas.

Mas talvez o mais importante: como devemos definir pobreza e renda básica? Diferenças de entendimento do artigo 6º geram intervenções, perfis e números de beneficiários distintos.

Sem esses conceitos discutidos, qualquer escolha é válida.

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