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É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

Descrição de chapéu Coronavírus

Ricos famosos encarnam as Marias Antonietas de quarentena

Seria pedir demais que milionários suportassem o confinamento em suas mansões com mais galhardia?

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​Esqueçam “por que não comem brioches?”, a sugestão infeliz da última rainha antes da Revolução Francesa. Na escassez de pão da pandemia, a Maria Antonieta do século 21 haveria de perguntar: por que não fazem em casa, na sua panificadora Cuisinart de R$ 3.000?

Está faltando fermento e farinha nas padarias. Pior do que não encontrar pão fresco é esbarrar virtualmente no produto online porque celebridades não param de fazer pão em casa e exibir o resultado com orgulho comparável ao de Alexander Fleming ao descobrir a penicilina há quase um século.

Seria pedir demais que milionários famosos suportassem o confinamento em suas mansões e a via-crúcis percorrida em seus gramados com mais galhardia?

O exibicionismo de quarentena é contagioso e parece reduzir o quociente de inteligência emocional de algumas das figuras mais talentosas da cultura popular. A Madonna que sustenta orfanatos no Maláui é a mesma que se cobre de pétalas na banheira enquanto pontifica sobre o vírus como “o grande equalizador.”

Como se os órfãos na África tivessem a opção do isolamento igualitário, menos o banho de pétalas. Como se não fosse evidente que os negros e latino-americanos já morrem mais nesta pandemia, a consequência previsível de sua mortalidade por doenças associadas à renda mais baixa e à falta de acesso a serviços de saúde.

Diante da autopiedade das estrelas em suas gaiolas de ouro, um internauta sugeriu: sua melhor chance de saber se contraiu o coronavírus é tossir na cara de um desses ricos e esperar o resultado do teste —ao qual só eles têm acesso.

Alguns glamorosos suplicantes de Instagram são os mesmos que usam serviços de “medicina concierge”, clubes exclusivos que cobram US$ 40 mil anuais (R$ 209 mil) pelo acesso a especialistas e a instalações médicas.

Nelson Schwartzman acaba de publicar "The Velvet Rope Economy: How Inequality Became a Big Business" (a economia da corda de veludo: como a desigualdade se tornou um grande negócio, em português), sobre a quarentena social que já é a realidade da ínfima parcela mais afluente da população.

Ele revela que médicos dos serviços concierge acumularam antecipadamente kits de testes de coronavírus e aparelhos pulmonares como precaução para clientes com problemas respiratórios pré-existentes.

A epidêmica falta de noção adquiriu tom de delírio na terça-feira (14), quando um dos âncoras mais famosos do país, após ter um resultado positivo e exibir sintomas intensos do coronavírus, deu entrevista a uma rádio.

Chris Cuomo, o irmão caçula de Andrew, o governador de Nova York, tem ancorado seu programa da CNN americana do subsolo da casa que só seu salário anual de US$ 4 milhões (R$ 21 mi) pode comprar.

Cuomo havia prestado um serviço relatando como teve febre alta e sintomas piores do que da gripezinha inventada pelos ceifadores de morte no Planalto.

Mas, ao ser interpelado por um crítico numa caminhada, teve uma crise existencial. Disse que não gostava mais do que fazia e não queria se engajar em “hiperpartidarismo”.

O mesmo Cuomo que pratica a praga do “doisladismo” —fatos podem ter dois lados e, por isso, trumpistas têm passe livre para mentir no estúdio com ele, que rebate, indignado, em típica sinalização de virtude. Horas depois, ele voltou atrás. Ou a febre de Cuomo baixou ou o privilégio subiu à consciência.

Madonna posa nua dentro de banheira enquanto fala sobre o coronavírus - Divulgação

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