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Roteirista e escritora, é criadora da série 'As Seguidoras' e trabalha com desenvolvimento de projetos audiovisuais

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De estrelas cadentes a balões inflamáveis, o que é bonito demais também é perigoso

Não me sinto digna de fazer demandas trabalhosas a um corpo celeste em combustão ou a aquele que chamamos de Deus

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Fui uma criança cruel. Entrava escondida no quarto da minha irmã, enquanto ela dormia no berço, beliscava seu braço gordinho para que ela acordasse chorando e eu pudesse niná-la e enchê-la de beijinhos. Quando ela voltava a dormir, eu fazia tudo de novo.

Ilustração de Silvia para coluna de Manuela Cantuária - Folhapress

Desejo coisas medíocres. Na última vez que vi uma estrela cadente, pedi que em minha casa aparecessem mais lagartixas. Não me sinto digna de fazer demandas trabalhosas a um corpo celeste em combustão, ao universo, ou a aquele que chamamos de Deus.

O mundo tem humanos desejantes demais e lagartixas de menos. Lagartixas são desapegadas, capazes de abandonar parte do próprio corpo e se regenerar com a impressionante facilidade. São ótimas companhias —silenciosas, rebolativas, e ainda dão cabo dos mosquitos.

Coleciono coisas inúteis. Fitas cassete, por exemplo. Meu toca-fitas é como uma criança travessa. Quando ele fica em silêncio, sei que está fazendo merda. Sempre enrola minhas fitas e assim vem destruindo minha coleção, que se torna cada vez mais inútil.

As fitas que não foram inutilizadas não podem ser tocadas, porque meu tocafitas é ineficaz. Acho que insisto em colecionar cassetes porque me identifico com elas: não são funcionais e por fora, parecem resistentes, por dentro, são muito frágeis.

Junho é o meu mês preferido. Sei que soltar balões é crime. Conheço uma mulher que teve a casa incendiada por um balão e perdeu tudo, fizemos uma vaquinha para ajudá-la. Ainda assim me emociono quando vejo um balão no céu. Eles me lembram que tudo o que é bonito demais também é perigoso.

Rodas de samba me deixam triste e feliz ao mesmo tempo. Todo samba nasce de uma tristeza e explode numa alegria insuportável, numa dinâmica lagarta-borboleta. Imagino o sambista compondo como um médico escreve uma receita médica: para aplacar a dor é preciso isso e aquilo. No caso do sambista, o atendimento é mais caloroso, sem dúvidas.

Detesto conhecer pessoas novas. Não porque não gosto de pessoas, muito pelo contrário. Quando gosto de uma pessoa, gosto dela ao ponto de vestir sua pele com o júbilo de quem desfila com uma roupa nova. Mas às vezes ela sufoca, penica, limita meus movimentos. E não está sujeita à troca. Quer dizer, podemos até trocar uma pessoa pela outra, mas é um processo bem mais burocrático.

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