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Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

Descrição de chapéu Coronavírus

A quem interessa manipular dados da Covid-19

Bolsonaro é o único beneficiado com falta de dados confiáveis sobre coronavírus

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Em 2017, após o furacão Maria arrasar Porto Rico, o governador Ricardo Rosseló sustentou por meses que tinham morrido 64 “boricuas” no vendaval. Depois, conforme se acumulavam evidências e estudos, reconheceu que haviam sido quase 3.000.

Rosseló acabou renunciando, mas não por essa manipulação grosseira de informações. Caiu em 2019 por força da mobilização popular contra escândalos de corrupção e conversas homofóbicas vazadas.

São muitas as diferenças entre o político porto-riquenho e Jair Bolsonaro. Preconceito, desumanidade, indícios de corrupção e desprezo por dados objetivos não o abalaram nem como candidato nem como presidente. Nada cola nele.

Os fatos, contudo, ainda atravessarão o caminho da família Bolsonaro. Pode demorar, porque seu governo ergue uma cortina de fumaça em torno da Covid-19 para melhor ocultar a própria inépcia no combate à epidemia, exacerbada aliás pelo contínuo chamamento presidencial à retomada de aglomerações.

Está funcionando. Embora o pico de sobrecarga no sistema de saúde ainda não tenha chegado, multiplicam-se carreatas de apoiadores do presidente exigindo a reabertura do comércio. O distanciamento social recua em toda parte, inclusive no epicentro da Covid-19, São Paulo.

Em paralelo, infecções e mortes pelo coronavírus Sars-CoV-2 fogem ao controle no país, mas não se sabe quanto. Para isso, seria preciso aplicar testes diagnósticos em grande quantidade e publicar os resultados. Quantos desses exames foram realizados no Brasil?

Ninguém sabe. Revire as páginas do Ministério da Saúde e procure essa informação; não vai encontrar. Com um pouco de esforço descobrirá que pouco mais de 2 milhões de kits de detecção haviam sido distribuídos até sexta-feira (17).

A página Our World in Data lista informações sobre testes de 71 países, de Austrália a Vietnã, mas não do Brasil. Até da Etiópia se sabe que 5.389 exames foram ali realizados até o último dia 16.

O governo federal atualiza diariamente a quantidade de casos e de mortes, respectivamente 38.654 e 2.462 até domingo (19), dado divulgado apenas na rede, sem entrevista coletiva, e é uma falsidade reconhecida por todos.

Isso tudo quase dois meses depois de confirmado o primeiro caso brasileiro. Luiz Henrique Mandetta saiu com fama de herói do ministério, mas tem parte nesse latifúndio de incompetência capitaneado por Bolsonaro. Chile e Peru fazem muito mais testes que São Paulo, por exemplo.

O presidente parece acreditar que o ônus político de dezenas, talvez centenas de milhares de mortes recairá sobre os governadores, não sobre ele. Só o cálculo eleitoral importa ao celerado capaz de minimizar a pandemia que já matou 160 mil pessoas e de trocar o ministro da Saúde (apenas razoável, diga-se) por um acaciano desconhecido tutelado por militares.

Governadores que hoje posam de bacanas, como João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ), também têm responsabilidade pelo fiasco na contabilidade dos casos de Covid-19. Sem ela, agem como baratas tontas, impossibilitados de planejar racionalmente a alocação de recursos e de aferir a eficácia das próprias ações.

Cabe a Bolsonaro, porém, a culpa maior pelo voo cego, após omitir-se na obrigação de liderar e coordenar os esforços para monitorar e controlar o avanço do coronavírus. Mandetta ensaiou fazê-lo, com atraso e insuficiências sem tamanho, enquanto o presidente lhe sabotava todas as iniciativas.

Só resta ao Planalto seguir apostando na confusão, omitindo, atrasando ou manipulando dados sobre a real dimensão da Covid-19. Terão mais mortes, como gosta de dizer o capitão Corona, impassível diante dos assassinatos do vernáculo, da decência e de conterrâneos —e todas elas serão suas, mais cedo (antes de 2022) ou mais tarde (depois de 2022).

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