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Professora de demografia e chefe do Departamento de Saúde Global e População da Escola de Saúde Pública de Harvard.

Descrição de chapéu além do lixo

Plástico: do milagre ao pesadelo

Material revolucionou a nossa vida. Agora é preciso urgentemente revolucionar a sua produção, uso e descarte

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Semana passada, uma pesquisa revelou a presença de cocaína em tubarões da espécie bico fino (também chamada de cação-frango) coletados na costa do Recreio dos Bandeirantes, Rio de Janeiro, entre setembro de 2021 e agosto de 2023.

A cocaína foi encontrada no músculo e no fígado dos animais. A hipótese é que os tubarões tiveram contato com cocaína presente no esgoto despejado em canais e rios e que chegam ao mar. No Brasil, cerca de metade do esgoto não é tratado. A presença de cocaína já havia sido identificada na água potável em São Paulo e Manaus, em outras espécies marinhas, e em uma análise do esgoto em 37 países.

Tubarões estudados pela Fiocruz no RJ têm cocaína no organismo; na foto, tubarão-bico-fino-brasileiro - Fiocruz/Divulgação

Mas a cocaína é só parte dos muitos contaminantes presentes na água. O garimpo ilegal na Amazônia contamina rios com mercúrio, e várias análises em diversos países já detectaram a presença de antibióticos, antidepressivos, produtos farmacêuticos, protetor solar, inseticidas e agrotóxicos.

Além disso, a presença de microplásticos (partículas menores que 5 mm) nos rios e oceanos levou a definição de um novo habitat microbiano marinho, a platisfera. Ou seja, micróbios colonizam materiais plásticos que flutuam na água. Triste imaginar que os plásticos deixarão um registro fóssil e estão se tornando um marcador formal do Antropoceno.

A produção de plástico no mundo cresceu de forma extremamente rápida (cerca de dois milhões de toneladas em 1950, mais de 450 milhões de toneladas atualmente). De todo o plástico produzido mundialmente, menos de 10% é reciclado. Essa poluição é de longa duração, uma vez que a decomposição do plástico pode levar de 100 a 1000 anos.

Estima-se que entre 0,8 e 2,7 milhões de toneladas de plástico chegam aos oceanos a cada ano. Grande parte chega através dos rios. Um estudo mostrou que cerca de 1.656 rios do planeta respondem por 80% dos plásticos que chegam aos oceanos. Essa lista inclui 75 rios no Brasil, que ocupa a sétima posição dentre os países com maior emissão de plásticos nos oceanos através dos rios.

Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde, nanoplásticos (partículas menores do que um micrometro) já foram identificadas na água, em água engarrafada, em animais marinhos, em diversos tipos de alimentos e no ar. Um estudo de 2021 estimou que, globalmente, indivíduos ingerem, em média, de 0,1 a 5 g de partículas de plásticos menores do 1 mm por semana.

Microplásticos menores do que 1 mm já foram detectados em humanos, especificamente no sangue, fezes, leite materno, placenta, pulmões, dentre outros. A presença dessas partículas foi associada a complicações de saúde em humanos. Entretanto, ainda há muitas lacunas sobre os efeitos dessas partículas para a saúde.

Alguns produtos químicos presentes em plásticos foram associados a várias doenças como diversos tipos de câncer, problemas no desenvolvimento, doenças cardiovasculares, neurológicas e imunológicas, endometriose e obesidade.

Um exemplo é o Bisfenol A (BPA), substância química usada na produção de plástico que, desde 2011, foi proibida pela Anvisa e pela Comissao Europeia para uso em produtos infantis. O BPA pode afetar o sistema hormonal, o cérebro, o coração, e aumentar o risco de câncer e de diabete.

O plástico está presente em nossas vidas. Computador, celular, eletrodomésticos, móveis, carros, equipamentos médicos, roupas e muito mais usam plástico. É impossível ir ao supermercado e não trazer pelo menos um produto que esteja embalado em plástico.

O plástico revolucionou a nossa vida. Agora é preciso urgentemente revolucionar a produção, uso e descarte do plástico. O custo de não o fazer afeta o meio ambiente, os animais, os humanos, a vida.

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