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Professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, é pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

Descrição de chapéu Eleições 2018

José Murilo de Carvalho e o peso das ilusões

Uma de suas análises sobre o golpe de 64 ajuda a entender o 8 de Janeiro

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No meio de tudo o que publicou de bom e robusto, José Murilo de Carvalho, que se foi no fim de semana, deixou muitos artigos curtos, despretensiosos. Entre eles, uma joia de 11 páginas, "Fortuna e Virtù no Golpe de 1964", incluído no livro "Forças Armadas e Política no Brasil" (2005).

Ali, o cientista político e historiador fala das duas surpresas dos que viveram a deposição de João Goulart e a chegada dos militares ao poder. A primeira foi a facilidade com que os conspiradores da direita levaram a melhor. A segunda, a permanência dos fardados no comando político, quando o retrospecto, desde o fim do Estado Novo, em 1945, fazia crer que a quartelada seria "cirúrgica": removido o presidente, o poder logo seria devolvido aos civis.

Para explicar o inesperado, José Murilo refuta as teses que o davam como inevitável, vistas as características do nosso desenvolvimento econômico, a formação das classes dominantes, sem falar nos interesses do "imperialismo ianque". Segundo ele, tais teorias eximem de responsabilidade os atores políticos —o golpe de 64 não fora produto de forças sociais imbatíveis, mas dos enganos de protagonistas influentes de carne e osso.

A interpretação, a rigor, não é original. Com argumentos sofisticados e rica documentação, havia sido exposta no clássico de Argelina Cheibub Figueiredo, "Democracia ou Reformas?" (1993). A contribuição de Murilo consiste em ter dado o devido peso às ilusões que induzem as forças políticas a escolhas desastrosas: as apostas de Jango no poderio dos sindicatos e da massa organizada e na lealdade do chamado "dispositivo militar"; a crença dos nacionalistas radicais de que uma estratégia de polarização os beneficiaria. Se a responsabilidade do golpe foi dos que o deram, reitera Murilo, as ideias fora de lugar dos que o sofreram foram cruciais para o desenlace.

O argumento de Murilo ajuda a ver melhor o fracassado golpe de Bolsonaro no 8 de Janeiro.

A oposição democrática e a resistência das instituições republicanas foram fundamentais para brecar a intentona. Porém, quanto mais passam os meses, mais claro fica que o ex-capitão, capturado por vastas emoções e pensamentos para lá de imperfeitos, acreditava que seguiria no poder, dissessem o que dissessem as urnas.

Foi-lhe fatal a miragem de que a simpatia da caserna —cultivada com benefícios e adulação sistemática e ainda estimulada pelo berreiro dos acampamentos— empurraria para o seu lado, incondicionalmente, o alto comando militar.

O despudor de seus comandados na desastrada operação para vender as joias da Presidência não se explica de outra forma.

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