Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC
Na campanha eleitoral, educação foi sacrificada no altar do consumo
Debate sobre a reabertura das escolas segue refém da polarização política
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Os governos da Europa e dos EUA parecem perdidos diante da nova alta de casos de coronavírus. Pressionados por uma sociedade exausta e revoltada, eles respondem de forma errática e caótica. Protestos violentos contra o confinamento tomaram conta de quase todas as capitais.
Porém, um consenso predomina: a necessidade de proteger a educação. Os estabelecimentos escolares, sobretudo para crianças com idades abaixo de oito anos, devem continuar abertos a qualquer custo.
Além das vantagens evidentes para os alunos, a manutenção da atividade escolar oferece importantes vantagens econômicas, pois liberam os pais —principalmente as mulheres— para o mercado de trabalho.
Ela também traz benefícios logísticos: o incentivo para a fuga da população urbana para o interior diminui consideravelmente, com impacto positivo no controle da disseminação do vírus.
A medida tem como base os últimos estudos científicos: está demonstrada, até para os leigos, a baixa transmissibilidade dos estabelecimentos escolares. Países africanos e asiáticos estão seguindo o caminho dos países desenvolvidos, apesar das limitações de infraestrutura. A América Latina parece cada vez mais uma exceção a uma tendência global.
No Brasil, o deboche da crise sanitária é diretamente imputável ao comportamento irresponsável do presidente da República, mas o descaso com a educação ultrapassa o governo federal. O debate sobre a reabertura das escolas segue refém da polarização política.
Os candidatos que prezam pela ciência sequer tentaram evoluir na abordagem da questão escolar. Os críticos das medidas de proteção, que aplaudiram as carreatas a favor da abertura do comércio, jamais mostraram interesse pelo assunto.
A ideia justa de que os adultos, e não as crianças, deveriam assumir o fardo do isolamento em caso de segunda onda foi tratada como um suicídio eleitoral. O sacrifício da educação no altar do consumo acabou ratificado pela sociedade durante a campanha municipal.
As consequências estão à vista: nos meses que precederam as eleições, os governantes desperdiçaram a última chance de tentar uma reabertura segura dos estabelecimentos escolares em condições epidemiológicas minimamente favoráveis.
Eles condenaram uma grande parte das crianças brasileiras a ficar em casa pelo menos até o começo da campanha de vacinação, agendada para meados do próximo ano.
Essa infelicidade traz dois desafios para os novos prefeitos. O primeiro é preparar o traumático processo de reinserção dos alunos, que terá implicações cognitivas, psicológicas, nutricionais e, claro, pedagógicas.
O segundo desafio passa pela constatação de que milhares de crianças perderam a janela de oportunidade para assimilar conceitos elementares, indispensáveis para a alfabetização.
Nada disso começou a ser discutido fora dos círculos de especialistas. A tragédia escolar pós-pandemia continua sendo tratada como um vulgar regresso de férias. Na indiferença quase generalizada, o Brasil está vendo emergir a primeira geração de analfabetos da era democrática.
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