Eu conheci os Racionais MC’s em 1992, apresentado por Milton Sales, na época produtor do grupo e responsável por juntar KL Jay e Edi Rock da zona norte de São Paulo com Ice Blue e Mano Brown da zona sul.

Eu trabalhei durante anos vendendo CDs do grupo. Na época, em meados da década de 1990, eu morava em São Paulo com apoio de uma amiga do movimento social, dona Paulina, que me alojou em sua casa. Foi um período difícil, de um jovem nordestino que alimentava aquele sonho de dar certo na vida vindo para o Sudeste para depois trazer os parentes ou voltar para a casa com uma grana no bolso.

Acompanhei shows dos Racionais em clubes pequenos, médios, grandes, Febem, prisões e pude também aprender muito com Milton Sales. Estivemos juntos na fundação da Cia Paulista de Hip-Hop, gravadora independente que foi uma das pioneiras a lançar singles e ter o programa mais ouvido na Rádio Costa Norte, iniciativa de Milton com amigos, que rendeu muitas perseguições, pois era tida como rádio pirata.

Montamos o movimento Cultura de Rua, em 1997, no Ceará. Minha ideia era juntar mercado e responsabilidade social sem perder o compromisso com a causa. Fizemos bailes, programas em rádios comunitárias, oficinas e, em 1999, o primeiro grande show de rap, que era o dos Racionais MC’s.

Esse show estava envolvido em tantos problemas que vou resumir na proibição uma semana antes por um juiz que embargou a casa de show, alegando que o rap era música de apologia ao crime e incentivo à violência.

Faltando poucos dias, nos liga um cara a procura de ingressos e eu informo que o show foi cancelado. Ele nos disse que tinha uma casa na praia e nos convidou para conhecer. Fomos até lá e eu só vi uma barraca. Achava que era 171 dele, mas não, ali era o santuário dos grandes shows independentes onde passaram Cássia Eller, Planet Hemp, Nação Zumbi e tantos outros da cena alternativa da época.

Aceitamos e caímos para dentro do problema. Resolvemos trazer também o programa "Yo! MTV Rap", que era apresentado pelo KL Jay, DJ do Racionais, e o resultado foi uma grande confraternização e fizemos história mobilizando a juventude preta e favela do estado, que agora têm voz ativa.

Parte desse registro hoje está no documentário "Racionais: Das Ruas de São Paulo pro Mundo", lançado recentemente pela Netflix, onde apareço entrevistando Edi Rock sobre as produções e apoios independentes que ele fazia para poder revelar novos talentos e fortalecer quem não tinha apoio algum. Fazer parte dessa narrativa é reescrever com nosso próprio punho a história onde somos protagonistas de uma revolução.