Siga a folha

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

Descrição de chapéu

Ser boa pessoa é uma maldade, pois é uma dor cruciante quando morrem

Alguém decente faria um esforço sério para ser indecente

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Estávamos à mesa do jantar e a minha filha de 13 anos suspirou: “Estou farta de sexo”.

Felizmente para a minha saúde cardiovascular, ela esclareceu depressa o problema: as aulas de educação sexual, na escola, eram muito chatas.

Confesso que não sei o que se passa com esta geração. No meu tempo, aulas de educação sexual eram pretexto para sussurros, risadinhas, excitação boba. A gente não aprendia nada, que era a melhor maneira de manter o interesse no tema.


Agora, ao que parece, dá bocejo. As explicações são tão exaustivas que eles gostam tanto do assunto como de matemática.

Há dias saiu um estudo segundo o qual os jovens de hoje têm cada vez menos interesse por sexo. Eu estava preparado para, na minha qualidade de cidadão que se encaminha para ser velho, desdenhar do gosto das novas gerações no tocante à roupa e à música. Enfim, os clássicos. Mas não esperava ficar
desapontado nesta área.

Jovens não costumam precisar de ajuda neste capítulo —e, no entanto, fica a sensação de que criamos uma geração de pandas, que também têm fastio de reproduzir-se.

Talvez a questão esteja no excesso. Nós tínhamos de fazer um esforço bastante grande para encontrar imagens de uma pessoa nua. Às vezes, um coleguinha tinha uma revista e levava para a escola, e a gente tinha de ver com atenção para memorizar. Ou fingíamos interessar-nos por fotografia, para ver dois ou três nus artísticos —que são a forma mais desinteressante de nudez.


Hoje, eles têm no bolso um celular com acesso a sacanagem organizada por ordem alfabética de tema. É demasiado fácil e demasiado burocrático.

Penso muitas vezes no caráter nocivo daquilo que é bom. Por exemplo, ser boa pessoa é uma maldade que se faz aos outros. Quando uma boa pessoa morre, isso inflige-nos uma dor insuportável. Quando más pessoas morrem, elas têm o bom senso de não nos martirizar. Às vezes é um alívio, outras até uma alegria.

Quem é boa pessoa sabe que é uma questão de tempo até submeter aqueles que ama a uma tristeza profunda. Quanto melhores as memórias que deixa, maior a mágoa que vai provocar. Uma pessoa decente faria um esforço sério para ser indecente.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas