Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.
Tite deveria aproveitar recolhimento e falar com quem não pensa como ele
Sociedade brasileira desaprendeu a discutir ideias e prefere a radicalização
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
O índice de 13% de testes positivos para o coronavírus feitos pelo Flamengo entre atletas, funcionários, dirigentes, familiares e pessoas muito próximas é altíssimo, extremamente superior ao de clubes de outros países. Três jogadores estão infectados. É mais uma demonstração de que o retorno do futebol no Brasil, brevemente, mesmo sem público, é precipitado e irresponsável.
Imagino que Tite, em casa, no recolhimento social, deva ver todos os jogos do Brasil e de outras seleções, do passado e do presente. A partida preferida do técnico deve ser a da eliminação para a Bélgica, na Copa de 2018. Falam ainda que Tite, com frequência, sonha com os avanços de Marcelo, com o zagueiro Miranda de lateral esquerdo, com Lukaku e com De Bruyne com a camisa do Brasil.
Por mais que sejam evidentes alguns equívocos individuais e coletivos do time brasileiro, Tite e sua científica comissão técnica sustentam, com números, que o Brasil foi superior, teve muito mais chances de gol, mais posse de bola, um pênalti claríssimo não marcado em Gabriel Jesus (eu não vi) e que a derrota foi injusta.
Enxergo de uma maneira diferente. Como Marcelo avançava, Miranda foi jogar na lateral esquerda para marcar o centroavante Lukaku, que foi atuar pelo lado. Neymar não voltava para marcar, e Coutinho tentava recuar, mas chegava atrasado. Fernandinho ficava sozinho na marcação, e havia enormes espaços na defesa brasileira. De Bruyne deitou e rolou nas costas do volante Fernandinho. Assim, saiu o segundo gol, e outros poderiam ter ocorrido nos primeiros 30 minutos.
O Brasil teve mais oportunidades de gol e mais posse de bola, porque a Bélgica, com 2 a 0, recuou. Não foi por estratégia da equipe brasileira.
A Copa terminou há quase dois anos, e a seleção repete os mesmos problemas. Coutinho não define se é um terceiro jogador de meio-campo ou um meia avançado. Neymar sai da esquerda para o centro e tromba com Coutinho. Um atrapalha o outro. Como os dois não voltam para marcar e o lateral avança muito, o setor fica desprotegido.
Essa deficiência na Copa foi tão marcante que Tite, em alguns momentos, deslocou o centroavante Gabriel Jesus para marcar o lateral adversário.
Nos melhores momentos da seleção com Tite, nas Eliminatórias, Coutinho atuou pela direita, e havia um trio no meio-campo formado por Casemiro, mais centralizado, Paulinho, pela direita, que avançava bastante, e Renato Augusto, mais pela esquerda, que organizava as jogadas e protegia os avanços de Marcelo.
Após a passagem de Coutinho para o meio, perto da Copa, o Brasil nunca mais foi um time forte coletivamente.
As dificuldades da seleção não são apenas coletivas. Das seis posições do meio-campo para frente, apenas dois jogadores são titulares certos, Casemiro e Neymar. Nas outras quatro, há vários jogadores bons, excelentes, do mesmo nível, dois em cada posição, mas nenhum é ainda certeza na seleção nem está entre os melhores do futebol mundial.
Tite, além de ver muitas partidas do Brasil e de outras seleções, deveria, em seu recolhimento social, refletir e conversar pela internet com pessoas que não pensam como ele. A sociedade brasileira desaprendeu a discutir ideias. Prefere o confronto, a radicalização. Pensam e agem de acordo com o lado em que estão. Não escutam nem enxergam o outro. Assim, muitos heróis são escolhidos.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters