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Diretora do Instituto Gerar de Psicanálise, autora de “O Mal-estar na Maternidade” e "Criar Filhos no Século XXI". É doutora em psicologia pela USP.

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Uma facada no coração da escola

Por que as escolas têm sido palco de tantas tragédias?

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A escola é para a nova geração o tubo de ensaio das relações sociais. Cada aluno que entra nela representa uma certa parte da sociedade, com suas crenças, raça, hábitos, gênero, condições financeiras, opiniões, preconceitos. O encontro entre alunos, professores, pais e funcionários da escola é o encontro dessas diferenças, nunca isentas de choque. Na escola se reproduzem os atritos dos espaços sociais mais amplos, portanto não há como sonhar com uma escola livre de bullying, misoginia ou racismo, pois ela é palco do que ocorre fora de seus muros.

Mas com uma diferença fundamental. A escola tem por prerrogativa criar espaços de reflexão sobre a realidade, mediar conflitos e questionar o que se transmite. Longe de reproduzir o discurso social sem pensar, a comunidade de ensino se pretende um ponto de inflexão, um espaço de questionamento.

Daí que os regimes autoritários são ciosos em controlar as escolas, pois elas podem colocar em questão o próprio autoritarismo. Onde cada um pensa com a própria cabeça, onde impera a ética, fica difícil formar um exército de paus-mandados, incapazes de discernir o real do fictício. Na escola, a Terra nunca será plana.

Sendo um espaço tão especial, ele é depositário de grandes expectativas. Quem não se emocionou ao levar o filho à escola pela primeira vez? Quem não se lembra das amizades, dos professores, da autonomia adquirida? Ao mesmo tempo, cada vez mais crianças têm dirigido ao ambiente escolar os gestos mais violentos: agressões, suicídios e assassinatos. São fatos epidêmicos nos Estados Unidos que o Brasil parece querer mimetizar por influência das redes sociais, somados ao recente incentivo ao uso de armas para resolver conflitos em nosso país.

Escola estadual na zona oeste de São Paulo onde aluno matou uma professora a facadas - Rubens Cavallari/Folhapress

Que recado desesperado é esse que vem na forma de ato, mas também de pergunta? Quando foi que a escola passou a ter que dar conta do que nenhum outro espaço parece estar sendo capaz de escutar?

A escola não tem como resolver uma sociedade desmantelada pelas redes sociais, violentamente polarizada, que ruma sem pudores para a autodestruição. Seus limites são tão claros quanto sua potência. A escola é espaço de transmissão e de escuta, de observação e de intervenção junto ao aluno. Ela não prescinde do apoio das famílias e do Estado, visando não apenas conteúdos mas as competências socioafetivas. Alunos, professores, funcionários e pais precisam se orientar pelo bem comum, na contramão de tudo o que a sociedade tem pregado atualmente.

Um adolescente de 13 anos apunhala e mata a professora Elizabeth Tenreiro em sala de aula, fere colegas e outros professores. Esse é o momento de cuidar dos feridos e fazer o luto de uma perda irreparável. Ele foi contido por mulheres corajosas, ciosas em proteger os demais. Não esqueçamos que uma criança ficou na sala para acudir a professora Elizabeth. Não esqueçamos desses gestos, caso contrário ficaremos siderados pelo horror e esqueceremos da complexidade humana.

A professora Elisabeth Tenreiro, morta em ataque de aluno na escola - Facebook

A escola continuará sendo o lugar no qual a sociedade revela sua melhor e sua pior faceta, não há como ser diferente. Mas ela é um dos últimos lugares que se propõem a lidar com isso da maneira mais democrática e humana possível. Precisamos garantir que ela continue a ter condições de fazê-lo com nosso apoio.

Agora é o momento de parar e escutar o que não foi possível escutar de outra forma. Recuperar o que falta sempre que se passa ao ato tresloucado: o diálogo.

Competência cada vez mais rara diante do apelo às armas, o diálogo é matéria-prima que sustenta a escola.

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