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Cresce a demanda por vinhos e espumantes sem álcool; entenda como a bebida é feita

Rótulos desalcoolizados e versões carbonatadas à base de uvas são produtos distintos; opções ainda geram dúvida

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São Paulo

Existe vinho sem álcool? Não é o mesmo que suco de uva? As duas perguntas, inevitáveis sempre que o tema vem à tona, dão a dimensão da surpresa que essa categoria de bebida provoca no consumidor brasileiro. Mas a demanda por ela parece ter chegado para ficar.

A tendência é global. Segundo o instituto britânico IWSR, especializado no setor de bebidas, o segmento cresceu 11% no mundo, entre 2018 e 2023, mesmo índice registrado no mercado brasileiro. A questão é que, por serem uma novidade dentro e fora do Brasil, esses rótulos ainda geram desconfiança.

Vinho sem álcool da Vinoh - Divulgação

A falta de informações não ajuda. Vinhos desalcoolizados e bebidas carbonatadas à base de uvas são produtos distintos, mas frequentam as mesmas prateleiras, colaborando para a confusão.

O vinho desalcoolizado deve obrigatoriamente passar por todas as etapas da produção convencional, incluindo a fermentação — só assim pode ser comercializado como vinho, como determina a legislação brasileira.

Ao final, o álcool gerado pela fermentação das uvas é eliminado. A norma brasileira, que segue a internacional, determina que vinhos com teor máximo de 0,5% de álcool já podem ser considerados desalcoolizados.

O processo, como explica Bruna Dachery, professora do curso superior de Tecnologia em Viticultura e Enologia da Universidade Caxias do Sul, é realizado por equipamento que aquece a bebida, para que o álcool evapore, sem que ela atinja uma temperatura muito alta.

"Para que o vinho não ‘cozinhe’, ele é aquecido a vácuo. A pressão permite que o álcool evapore em temperatura bem mais baixa, entre 30ºC e 40ºC. Durante o processo, os compostos dos aromas são reservados e, depois, reincorporados à bebida", explica Dachery.

No caso dos espumantes, a desalcoolização também remove as borbulhas, o que exige que uma injeção de gás carbônico seja feita no final do processo.

O segundo grupo, de bebidas carbonatadas, é composto por produtos que até são vendidos em garrafas de vinho ou de espumante, com rolha e gaiola de metal, mas têm como base suco de uva gaseificado. Como não envolvem a etapa da fermentação, exigida por lei, elas não podem ser classificadas como vinho.

Fazem parte desse grupo os rótulos zero álcool das vinícolas Aurora e Garibaldi, por exemplo, e o Moscato recém-lançado pela Salton. "Só em janeiro deste ano, a procura pelos nossos produtos brancos e rosés sem álcool aumentou 200%", afirma Rodrigo Valerio, diretor de marketing da Aurora, que cobra cerca de R$ 30 por cada garrafa.

O alto custo dos equipamentos de desalcoolização fez com que grandes grupos internacionais tenham saído na frente nesse mercado. A Henkell Freixenet, que lançou seus primeiros rótulos sem álcool em 2017, na Europa, e em 2019, no Brasil, usa maquinário alemão para remover o álcool de vinhos espumantes e tranquilos (sem borbulhas). No ecommerce da marca, cada garrafa custa entre R$ 79 e R$ 85.

"Como muitas propriedades de aroma e sabor se perdem no processo, passamos cinco anos pesquisando métodos para manter as características originais dos vinhos. Usávamos a estrutura da fábrica da Freixenet, na Espanha. Após a fusão com a Henkell, migramos para a Alemanha, onde o maquinário é mais evoluído", afirma a sommelière da marca, Clara Mei.

O paranaense Jonathan Martins, à frente da vinícola La Dorni, em Bandeirantes, no norte do estado, afirma ser o primeiro a lançar vinhos sem álcool no Brasil, em 2002. Ele desenvolveu equipamento próprio para produzir rótulos como os varietais de tempranillo e tannat (R$ 58 cada).

Mesma estratégia adotou o gaúcho Vlademir Grechi, de Bento Gonçalves (RS). Ele desalcooliza vinhos de produtores parceiros e os comercializa com a marca Vinoh, lançada em 2021, a R$ 99,90 por garrafa. "Tenho cinco vinhos desalcoolizados, mas o portfólio chegará a nove até o fim de setembro. Em dezembro, lanço o primeiro espumante."

Desde que lançou seu primeiro vinho zero álcool, em 2018, a chilena Sinzero, do casal Cecilia Prat e Andrés Duval, já elaborou mais quatro rótulos — eles chegam ao Brasil custando cerca de R$ 70. A produção de 15 mil litros mensais, exportada para o Brasil desde 2021, é vendida a mais dez países.

Também exploram o segmento os grupos espanhóis Familia Torres, com os rótulos Natureo, e Vicente Gandia, com o Cero Coma. De Napa Valley, na Califórnia (EUA), vêm os vinhos Fre, da Trinchero Family Estates. Rótulos nacionais e estrangeiros já chegam ao varejo físico e online e têm impulsionado o crescimento de ecommerces especializados em bebidas sem álcool.

Fundador da distribuidora Sobrietá, que desde 2001 atua no segmento B2B (de comércio entre empresas), Leandro Simões inaugurou, em 2017, o Empório Sem Álcool, que faz vendas diretas ao consumidor, físicas e online. Os vinhos representam 40% do portfólio da loja, que funciona no bairro paulistano da Saúde.

Sem placa na porta, já tem até marca própria: os vinhos desalcoolizados Despido, que custam R$ 50 em média. No ecommerce Armazém sem Álcool, de Araçatuba (SP), os vinhos sem álcool também são maioria — há também gins e cervejas, entre outras opções.

Segundo o fundador, Ricardo Gava Rodrigues, vários motivos levam o público a procurá-los. "São grávidas, lactantes, atletas, idosos, pessoas com problemas de saúde, jovens preocupados com o rendimento na academia e até os motoristas da vez."

Apesar da boa receptividade entre esses perfis de consumidores, os vinhos sem álcool ainda fazem muita gente do setor torcer o nariz. German Garfinkel, vice-presidente da Grupo Wine, ainda considera o segmento "menos consolidado" do que o das cervejas sem álcool.

"São poucas multinacionais fazendo investimentos isolados. Depois da desalcoolização, o vinho perde peso na boca. Temos degustado muitos rótulos nas feiras, vemos que Alemanha e França estão na frente, Itália começando a se destacar, mas o preço ainda é elevado."

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