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Descrição de chapéu The New York Times basquete

Série sobre Lakers dos anos 1980 retrata época em que NBA se tornou pop

Magic Johnson e Jerry Buss mudaram o basquete dentro e fora da quadra

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Sopan Deb
The New York Times

​Quando solicitado a descrever o Los Angeles Lakers da década de 1980, o ator DeVaughn Nixon, 38, fez uma breve pausa. "Estilizado", ele disse. E depois disparou novas respostas. "Rápido. Cool. Divertido. Sexy."

Os Lakers eram conhecidos na época pelo apelido "Showtime" e estabeleceram um novo parâmetro para a maneira pela qual o basquete profissional veio a ser encarado, dentro e fora da quadra. A equipe atravessou o espaço que separava o esporte da cultura pop de uma maneira que time nenhum da NBA tinha conseguido até ali.

Provocou discussões sobre dinheiro, raça, celebridades e sexo no esporte. Seu descarado proprietário, um novo-rico chamado Jerry Buss, levou os Lakers a desafiar o que até ali era o status quo –que incluía público baixo nos ginásios e audiências ainda menores na televisão. O time ajudou a salvar a liga.

E também era ótimo assunto para a televisão tanto nos anos 1980 quanto agora. O time de Los Angeles é tema de uma nova série de ficção baseada em fatos produzida pela HBO, "Lakers: Hora de Vencer", em que Nixon faz o papel de seu pai, o armador Norm Nixon. O primeiro episódio da minissérie em dez episódios estreou no domingo (6) e está disponível na plataforma HBO Max.

Quincy Isaiah interpreta Magic Johnson na série da HBO - Warrick Page/HBO

Criada por Max Borenstein e Jim Hecht, a série se baseia no livro "Showtime", do jornalista Jeff Pearlman. Mas o estilo loquaz e rápido da série, na qual os personagens às vezes falam diretamente aos espectadores, é característico do produtor Adam McKay ("A Grande Aposta", "Não Olhe para Cima"), que também dirigiu o primeiro episódio.

"Era uma história a qual eu achava conhecer os pontos básicos", disse McKay, fã de basquete desde criança e apresentador de um podcast sobre a NBA. "Eu achava que a história girasse principalmente em torno de Magic Johnson, Kareem Abdul-Jabbar e do Dr. Buss. Não fazia ideia, antes de ler o livro, sobre como a história era complicada, multifacetada. Era como ‘Os Irmãos Karamazov’, mas sobre basquete."

"Hora de Vencer" não é a primeira narrativa sobre a NBA da década de 1980, um período seminal para o esporte e tema de numerosos livros e documentários. Com base nos oito episódios que os jornalistas puderam assistir antes da estreia, a série conta a história em um tom digno dos times do Lakers naquela época.

Os cortes são frenéticos, a acentuação é forte, e os personagens muitas vezes falam diretamente para a câmera, narrando situações. Há uma mistura de imagens em filme de baixa qualidade e vídeo precário com material de arquivo, real e falso, para reforçar o clima "vintage".

Mais ou menos como os Lakers da era Magic Johnson, a série nada tem de convencional, e nenhuma pretensão de ser sutil.

A lenda

As realizações do Showtime Lakers se tornaram lendas. Eles conquistaram cinco títulos da NBA entre 1980 e 1988, um dos períodos de maior sucesso de qualquer equipe na história da liga. O principal rival do time, o Boston Celtics, liderado em quadra por Larry Bird, ficou com três títulos no mesmo período. Juntos, os dois times produziram alguns dos maiores jogadores de basquete de todos os tempos.

DeVaughn Nixon disse que não sabia da importância do Lakers daquela era antes de uma viagem a Positano, na Itália, muito tempo depois de o seu pai ter se aposentado.

"Saí do banheiro, e lá estava Michael Jordan sentado à nossa mesa, papeando animado com o meu pai", disse Nixon. Ele se lembra de Jordan ter definido seu pai como "um bad boy na quadra". "E eu respondi que 'então tá, muito bom, bacana"', disse Nixon. "Meu pai foi parte de alguma coisa."

Jordan não estava sozinho em sua admiração. O basquete da década de 1980, especialmente os Lakers, teve uma pungência cultural e política que influenciou tanto o esporte quanto o mundo mais amplo desde então.

Seria possível traçar uma linha direta, por exemplo, entre o ativismo político de Abdul-Jabbar, que jogou pelos Lakers de 1975 a 1989, e o de LeBron James. (Algo que não sobreviveu, daquela época: o "skyhook", um arremesso mortífero que Abdul-Jabbar empregava e não é muito visto neste século.)

E os desfiles de moda, as dançarinas sexy e as apresentações ruidosas de times que vemos hoje no começo de cada jogo –com efeitos pirotécnicos, shows de laser e canhões que disparam camisetas– devem muito a Buss (interpretado na série por John C. Reilly), o dono transformador que adquiriu os Lakers em 1979.

John C. Reilly (à esq.) interpreta Jerry Buss, o novo-rico que comprou os Lakers e mudou a história do time californiano - Warrick Page/HBO

Buss ajudou a dar início a uma era que levou celebridades às arquibancadas e expandiu as experiências dos fãs. Celebridades sempre tiveram conexões com o esporte de Los Angeles –Doris Day e Jack Nicholson já costumavam ser vistos na torcida dos Lakers antes do Showtime–, mas Buss reforçou a presença delas, uma dinâmica que continua a existir.

Solomon Hughes, que interpreta Abdul-Jabbar, disse que "a singularidade daquela equipe de esporte profissional diante do pano de fundo de Hollywood realmente mudou a maneira pela qual todos viam e veem o esporte".

Os Lakers ganharam o apelido de Showtime por causa de uma casa noturna chamada The Horn, que Buss frequentava. Lá, uma cantora começava seu show dizendo que "chegou o showtime", e Buss adotou a expressão para descrever sua abordagem com relação ao Lakers.

Convidado frequente da Playboy Mansion e detentor de um doutorado em química, sempre vestido em ternos ao estilo da era da discoteca e ostentando um penteado que empilhava cabelos no topo da cabeça para ajudá-lo a esconder a calvície, ele estava determinado a combinar o glamour de Hollywood ao basquete de alta qualidade –uma distinção significativa em relação à maneira pela qual os times da NBA operavam até ali.

A rivalidade

O padrão que imperava era fortemente influenciado pelo Celtics, que dominou a NBA nas duas décadas anteriores à aquisição do Lakers por Buss. Red Auerbach (interpretado por Michael Chiklis), que tinha sido treinador e depois se tornou diretor-geral do time, detestava a ideia de animadoras de torcida nos jogos; o Celtics só veio a tê-las em 2006. Buss se comportava como um intruso determinado a demolir a santidade do basquete.

Mas Buss queria mais do que criar uma experiência vistosa em torno do jogo. Queria que o basquete em si fosse vistoso. Isso tornou a disponibilidade de Johnson no draft de 1979 da NBA ainda mais oportuna. Johnson jogava sempre de olho em oportunidades para exibir seu talento acrobático, disparando passes frequentes por trás das costas para colegas de time, como se estivesse dotado de olhos na nuca.

"Ele queria fazer seu show", disse Quincy Isaiah, 26, que interpreta Johnson na série. "Mas definitivamente queria que todo o mundo que estivesse presente no ginásio se divertisse, o que incluía seus colegas de time."

Nem todos se divertiam tanto, especialmente fora de Los Angeles. Chiklis, que nasceu em Lowell, Massachusetts, cresceu como torcedor dos Celtics, uma equipe com uma visão diametralmente oposta sobre o que o basquete deveria ser.

"Eu tinha tanto ódio e raiva por eles quanto tinha pelo Yankees", disse Chiklis, referindo-se ao time de beisebol de Nova York. "Era impossível viver em Boston naquela época e não ser arrastado ao vórtice daquela rivalidade."

Duelo entre Lakers e Celtics, reconstituído em “Lakers: Hora de Vencer”; Kareem Abdul-Jabbar é interpretado por Solomon Hughes - Warrick Page/HBO

A rivalidade também tinha um componente racial. Bird era um jogador tão transcendente quanto Johnson, mas há quem imagine se ele teria recebido a mesma atenção se fosse negro.

Dennis Rodman, um dos grandes reboteiros da história do basquete, disse em 1987 que Bird tinha conquistado três prêmios consecutivos como melhor jogador da temporada (MVP) "porque ele era branco", acrescentando que ninguém dava crédito a Magic Johnson. Isaiah Thomas, colega de time de Rodman no Detroit Pistons, concordou, acrescentando que, "se Bird fosse negro, ele seria só mais um jogador", o que causou furor.

À medida que a rivalidade entre Lakers e Celtics evoluía, o interesse pela liga crescia e os jogos passaram a ser exibidos ao vivo na televisão. (A ascensão da ESPN, que foi criada em 1979, também ajudou.) O nome de Johnson se tornou famoso em toda parte, especialmente porque o Lakers continuou vencendo.

A celebridade

Antes da década de 1980, a NBA era uma liga com problemas, baixa audiência, e não estava presente no horário nobre das redes de TV. Um jogo das finais de 1977 começou ao meio-dia, no horário da costa do Pacífico. Muitos dos jogos só eram transmitidos em videoteipe, depois de encerrados.

O Lakers ajudou a transformar a NBA de uma liga esportiva menor em um gigante, preparando o terreno para Michael Jordan e mais tarde para Kobe Bryant, que ajudaram a fazer do basquete um fenômeno mundial. Nas palavras de McKay, o Lakers "mudou a música, a moda, a maneira pela qual as pessoas se comportavam, o jeito de falar".

"Foi uma explosão que acontece raramente em qualquer cultura", ele prosseguiu. "Ainda mais no esporte."

Ao lado de Bird, Johnson se tornou um astro maior do que qualquer jogador de basquete do passado. Ele e Bird fizeram comerciais de TV juntos, e os dois assinaram grandes contratos com patrocinadores. Quando Johnson –um atleta heterossexual que tinha média de 12,5 assistências e 19,4 pontos por jogo– anunciou que era portador do HIV, em 1994, e se aposentaria, isso causou choque em todo o mundo.

O espanhol Pau Gasol disse que a entrevista coletiva de Johnson sobre sua aposentadoria, que ele viu como criança, tinha o comovido tanto que ele prometeu que encontraria uma cura para o HIV. Em lugar disso, Gasol se tornou um astro da NBA e ajudou a conduzir o Lakers a múltiplos títulos.

Algumas das figuras chaves da história declararam publicamente que não estão satisfeitas com a série, entre as quais Johnson. (Nenhum dos principais envolvidos nem a organização do Lakers participaram da produção.)

Um porta-voz de Abdul-Jabbar descreveu a série em um email como "um relato fictício extraído de um livro" escrito por "um outsider", acrescentando que Abdul-Jabbar não tinha assistido à série e que "o melhor é que a história seja contada por aqueles que a viveram".

Jeanie Buss, proprietária controladora do Lakers e filha de Jerry Buss, que morreu em 2013, é produtora-executiva de um documentário sobre o time para o serviço de streaming Hulu, que deve estrear neste ano. Johnson está desenvolvendo um documentário sobre sua vida para a Apple. (Porta-vozes de Johnson e do Lakers não quiseram comentar.)

"Se eu fosse Kareem ou Magic ou qualquer daqueles caras e estivesse encarando essa situação do ponto de vista pessoal, vendo alguém contando minha história, provavelmente também acharia estranho", disse Rodney Barnes, produtor-executivo e roteirista da série. Mas a equipe de criação queria contar uma história sobre tudo que o período abarcou –sobre não só o Lakers mas também "os Estados Unidos como um todo".

E a história que eles contam dificilmente será a versão final sobre o Showtime Lakers, reconheceu Barnes.

Tradução de Paulo Migliacci

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