Siga a folha

Descrição de chapéu basquete

'Sou negra, careca e gay pedindo por mais respeito', diz ex-pivô Marta

Medalhista olímpica falou sobre ter ganhado salários muito mais baixos que Hortência e Paula

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Santos

Marta Sobral, 58, conta orgulhosa ter construído uma profunda ligação com o basquete.

Pioneira de uma família de sobrenome famoso no esporte –as irmãs Márcia e Leila e o irmão Jeferson Sobral também jogaram profissionalmente–, ela fez parte da melhor geração feminina da modalidade no país.

Ao lado de Hortência, Paula e Janeth, foi medalhista em três Pan-Americanos, o mais relevante deles em Havana-1991, quando recebeu das mãos de Fidel Castro a medalha de ouro.

Nos Jogos Olímpicos ficou com a prata em Atlanta-1996 e o bronze em Sydney-2000. Só acabou ficando fora da maior conquista, a do Mundial de 1994, devido a uma operação emergencial para a retirada de um mioma.

Marta tenta se desvencilhar da marcação em duelo contra Cuba, nas Olimpíadas de Atlanta-1996 - Antonio Scorza - 31.jul.1996/AFP

A ex-pivô, agora, resolveu expor situações que vão bem além das quadras e do esporte que lhe tirou da periferia de São Paulo para transformar a realidade da família.

Em recente entrevista ao canal Clube da Vip, no YouTube, ela revelou que sempre vivenciou claras diferenças com relação ao tratamento dado a ex-companheiras como Paula e Hortência.

"Eu sempre soube que a Paula e a Hortência, e não é desmerecendo porque fizeram o contrato delas, ganhavam muito dinheiro. Eu fazia o meu contrato, achava que aquilo que estava recebendo era suficiente para manter a minha família. Nunca ganhei em dólar, igual elas ganharam algumas vezes", afirmou no último mês.

"O que disse lá [na entrevista] eu repito sem problema algum. Na minha época [como jogadora] ganhava menos porque eu mesma fazia os meus contratos. Não é como hoje, não tinham os agentes", conta Marta à Folha.

"Paula e Hortência foram as melhores do mundo e precisavam ser valorizadas, claro. Elas atraíam patrocinadores para as equipes, também, não podemos esquecer disso. No caso delas, sempre soubemos que ganhavam mais, mas preciso dizer que ainda bem menos do que atletas do masculino. Eu trouxe isso agora, anos depois, porque só me perguntaram agora", acrescenta.

A longa carreira no esporte, onde atuou por mais de 12 equipes, duas delas dos Estados Unidos (na extinta American Basketball League), hoje gera estranheza a ela própria.

Marta conta ter tido auxílio somente na primeira troca de clube, quando deixou o time bancado pela Pirelli, em Santo André, para ir a Sorocaba.

Na ocasião, a técnica Laís Elena (1943-2019) a acompanhou para ajudá-la nas negociações. Ao sair da reunião, aconselhou a pupila a fechar pelo fato de os valores serem consideravelmente melhores.

Fidel Castro, então presidente de Cuba, cumprimenta Hortência após entregá-la a medalha de ouro no Pan de 1991 - Arquivo CBB

"A mulher branca sempre ganha mais. Sofremos duas vezes: por ser negra e por ser mulher. Estou aqui, agora, para lutar por isso. Temos que ganhar igual aos homens, também. Por que vamos receber menos?", questiona.

Mesmo após as declarações, ela conversou com as antigas companheiras recentemente, mas não tocaram no assunto da entrevista. Com Hortência, trocou rápidas mensagens pelo celular. E com Paula falou ao telefone no dia de seu aniversário, em 11 de março.

"Está tudo muito na cara, não é nada com elas ou contra elas. São minhas amigas. Mas por que só agora igualaram premiações no futebol feminino? Sofremos várias vezes por sermos mulher, por sermos negras. E quero falar mais sobre isso, nunca tive a oportunidade de dizer antes", conta.

"Eu falo mais da mulher negra, claro, porque é exatamente o que sou. Aliás, sou negra, careca e gay pedindo por mais respeito", completa.

Ela diz que ainda não havia falado publicamente sobre sua orientação sexual. Jamais escondeu, mas nunca sentiu abertura para se declarar gay publicamente.

"Nunca foi velado, todos sabiam, mas ninguém nunca perguntou para mim. Nesse momento eu falei, acho oportuno. Sou negra mesmo, amo minha cor, e sou gay", explica.

Marta Suplicy, prefeita de São Paulo, em almoço com o então Ministro dos Esportes, Agnelo Queiroz, o ex-jogador de futebol e vereador eleito Ademir da Guia e a jogadora de basquete Marta, em 2004 - Marcelo Ximenez - 18.out.2004/Folha Imagem

As falas ainda inspiraram o lançamento de um pleito coletivo para a candidatura a deputada federal. Ela se filiou recentemente ao Partido dos Trabalhadores (PT) e quer ajudar a romper preconceitos no esporte.

"Eu nunca me liguei em política como atleta, mas sinto que preciso lutar por isso agora. Não é só o racismo, na CBB (Confederação Brasileira de Basketball) recentemente contrataram a Adrianinha para dirigir a seleção sub-18. Tem a Paula na diretoria, também, mas precisamos de bem mais", explica.

Na primeira tentativa no meio político, como vereadora pelo Patriota, nas eleições municipais em Santo André, em 2020, a campanha naufragou com apenas 96 votos. Ela ainda foi secretária de esportes na gestão do ex-prefeito Carlos Grana (PT) entre 2013 e 2016.

Atualmente, Marta tem uma agenda repleta de palestras motivacionais. Ela ainda não sabe se conseguirá o apoio de antigas companheiras para a candidatura, mas sonha com ajuda.

No último ano, a vida e a trajetória esportiva de Hortência e Paula passaram a ser documentadas em um filme que deve ser lançado este ano, dirigido por Georgia Guerra, com investimento de quase R$ 7 milhões.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas