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Com livro póstumo, Hilda Machado tem poesia resgatada

Autora escrevia em segredo e só publicou dois poemas em vida

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São Paulo
Em foto dos anos 1970, a poeta, professora e cineasta Hilda Machado, que tem seu livro ‘Nuvens’ publicado pela 1ª vez - Beatriz Albuquerque/Divulgação

Hilda Machado, morta em 2007, era um desses segredos bem guardados. A cineasta e professora de cinema escrevia poesia e não contava para quase ninguém de seu convívio —não à toa, o lançamento póstumo de “Nuvens”, que chega agora às livrarias, há de surpreender alguns.

A obra é lançada graças aos esforços do poeta brasileiro radicado em Berlim Ricardo Domeneck. Ele não tirou a autora da cabeça desde quando leu os dois únicos poemas que ela publicou em vida, em 2004, na extinta revista Inimigo Rumor, editada por Carlito Azevedo.

Em 2008, após a morte da autora, Domeneck ainda publicou alguns poemas que Azevedo guardada na revista online Modo de Usar.

Um, em especial, ficou na memória dele: “Miscasting”, em que uma atriz renuncia a um papel, dizendo-se enganada. “estou entregando o cargo/ onde é que assino (...)/  adeus ardor/ adeus afrontas/ onde é que assino.”

Desde então, Domeneck transformou Machado em sua Cesárea Tinajero —poeta que os personagens de “Os Detetives Selvagens”, de Roberto Bolaño, buscam em um deserto no México.

Domeneck entrou em contato com Angela, irmã da autora, para perguntar se havia inéditos —recebeu a resposta de que não só havia, mas como estavam protegidos.

“A Hilda deixou outras coisas. Há alguns contos, parece que ainda há um roteiro. Vai ser preciso trabalho. Tenho que ter cuidado para não começar a psicografá-la. Não tenho esse direito”, diz.

O sinal de que a autora planejava publicar “Nuvens” é que o livro havia sido registrado, em 1997, no departamento de direitos autorais da Biblioteca Nacional —quase dez anos, portanto, da publicação na Inimigo Rumor.

Mas há sempre o dilema ético do que fazer com uma obra que um autor não publicou em vida. Como saber qual a vontade do escritor?

“Desenvolvi uma relação quase emocional com a obra dela. Depois de conversar com o Cide [Piquet, editor da 34], estou seguro que foi a decisão mais respeitosa nesse momento, começar com um livro que tinha a chancela dela”, afirma Domeneck.

Uma das características que chamam atenção nos poemas de Hilda é o sarcasmo. 

“A poesia brasileira começa satírica, com Gregório de Matos. Mas, apesar de ser uma tradição fundadora da nossa poesia, ela às vezes é colocada à margem, talvez por questões do cânone e historiográficas”, diz ele.

“Hilda está próxima da ironia um pouco mais sutil. Vejo no trabalho dela algo que não vejo na poesia brasileira, o humor auto-depreciativo. Parece que ela está tirando um sarro do sofrimento, o que torna o sofrimento ainda mais pungente.”

Poetas esquecidos

Hilda Machado nasceu em 1951 e fez toda a sua carreira no mundo do cinema. Nos anos 1970, foi presa pela ditadura militar. Em 1987, venceu o prêmio de melhor direção nos festivais de Gramado, do Rio e de Recife, com o curta “Joilson Marcou”. 

Estuou cinema em Cuba, fez mestrado na USP, deu aulas na Universidade Federal Fluminense e na Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Uma anedota diz que, às vezes, chegava na aula, colocava o DVD de “China Town”, dizia “Isto é para assistir de joelhos” —e ia embora.

“Não quero parecer mais íntimo do que fui. Era uma relação totalmente servil da minha parte. Eu ficava contente de ir à casa dela ajudar a arrumar a estantes”, diz o poeta carioca Ismar Tirelli, que foi aluno dela na Darcy Ribeiro.

Embora Tirelli falasse muito do livro de poesias que estava escrevendo, Hilda nunca revelou que também escrevia. Entre seus gostos literários, diz ele, a autora tinha muitos poetas sempre no limiar do esquecimento —daqueles que somem e reaparecem.

“Fico nervoso que ela se torne um desses autores que são esquecidos e redescobertos de dez em dez anos.”

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