Siga a folha

Mentalidade de startup pode salvar pequenas empresas?

Donos de pequenas empresas estão tendo de aprender abordagens como "falha rápida", correção de rumo e tornar-se virtual --e algumas estão tendo sucesso

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

The New York Times

No início de fevereiro, as coisas pareciam boas para a Practice San Francisco, um centro que oferece psicoterapia individual e aulas para aumentar o bem-estar físico e mental de crianças e adultos. Os negócios iam tão bem que a psicóloga Nina Kaiser tinha acabado de reformar e se mudar para um espaço maior, com o objetivo de duplicar sua receita.

Então veio a pandemia de coronavírus. No início de março, Kaiser passou todas as suas aulas e serviços de aconselhamento para a internet. Muito rapidamente, porém, surgiu a fadiga do vídeo. "Após algumas semanas, vimos uma grande queda na frequência em todos os nossos programas, até psicoterapia", disse ela. Então começou um período "interminável de identificação de problemas e mudanças".

Como muitas outras pequenas empresas, a Practice San Francisco, que existe há três anos, basicamente se tornou uma startup de novo, empregando uma estratégia semelhante à abordagem de "falha rápida" bem conhecida na cultura startup: uma modificação é feita em algum aspecto da empresa e se funcionar ela fica, mas se der errado os dados são aproveitados e tenta-se alguma outra coisa.

"Houve muita tentativa sem experiência", disse Kaiser. "Vimos o que não funciona, onde encontramos problemas e corrigimos o rumo. É um processo constante, cumulativo."

Esse processo é crucial hoje para as pequenas empresas, cujo número diminuiu 22% --3,3 milhões-- entre fevereiro e abril, segundo o Departamento Nacional de Estatísticas Econômicas.

Com as aulas da Practice San Francisco sendo dadas remotamente, Kaiser se associou a um estúdio de ioga local para oferecer programas conjuntos, aumentando a visibilidade e a receita das duas empresas. Isso deu certo durante alguns meses e então se tornou problemático. "Acabou sendo mais difícil do que eu previa combinar duas comunidades com expectativas diferentes", disse ela. Entra em cena a abordagem de falha rápida: a colaboração foi pausada e está sendo reconfigurada.

Depois disso, Kaiser decidiu mudar seu modelo de aula de individuais para baseadas em séries, mantendo um grupo de estudantes juntos por uma série inteira. "Isso constrói relacionamentos na classe", disse ela. "Agora estamos intencionalmente enfocados em construir uma comunidade."

A frequência passou de uma ou duas pessoas por aula para entre oito e 15. E quando ficou claro que a pandemia não seria curta a demanda por psicoterapia à distância começou a aumentar. Apesar dos desafios reais relacionados à pandemia, Kaiser prevê que a receita de 2020 será 50% maior.

The Greater Knead, uma empresa de pães bagels sem glúten e alergênicos de Bensalem, na Pensilvânia, também previa um bom ano em 2020. A companhia de oito anos, cujos pães são vendidos em padarias e supermercados, tinha finalmente dado lucro, com pouco menos de US$ 1 milhão em receitas. Em fevereiro, as vendas subiram 20% e a empresa estava a caminho de ter seu melhor ano, segundo a proprietária, Michelle Carfagno.

Mas no início de março as vendas caíram acentuadamente, quando as lojas fecharam e os clientes ficaram em casa. Os supermercados começaram a ficar sem os pães The Greater Knead e não renovaram os pedidos, concentrando-se em estocar coisas como papel higiênico e artigos de limpeza. Em maio, a receita caiu 60%.

Um pequeno ponto positivo, porém, foram as vendas online, que aumentavam lentamente. Carfagno decidiu capitalizar nisso e investiu em anúncios nas redes sociais, algo que ainda não tinha feito, para atrair tráfego para seu site. Agora que as pessoas ficavam em casa, procuravam os bagels na internet, e ela quis garantir que os encontrassem.

"Antes da pandemia as pessoas souberam de nós por boca a boca, placas e degustação nas lojas", disse ela. "Tudo isso desapareceu."

Pouco depois, Carfagno decidiu trabalhar com um centro de abastecimento na costa oeste dos EUA, permitindo que ela fizesse remessas para todo o país, algo que não tinha pensado antes por causa do alto custo de enviar pães congelados. Afinal foi uma medida inteligente: em setembro, as vendas na web tinham aumentado 250%. "Agora vemos isso como uma oportunidade de ter um relacionamento direto com os clientes", disse Carfagno.

Ela abandonou um plano de se mudar neste outono para uma instalação maior e decidiu modificar a disposição física de seu espaço de fabricação para aumentar a eficiência. Ela também investiu em automação, adquirindo uma máquina de pães de última geração e outra de embalagem a vácuo, eliminando a necessidade de congelar o produto para remessa. Carfagno projeta receitas para 2020 cerca de 5% maiores que no ano passado. Não são os 20 ou 30% que ela esperava, mas as mudanças que adotou --e continuará adotando-- a ajudaram de maneiras inesperadas.

"Estamos muito mais eficientes agora", disse. "E como os consumidores compram diretamente de nós é muito mais barato lançar um novo produto. Estamos examinando outras coisas que poderíamos vender, talvez uma linha inteira de produtos de panefação sem glúten."


Anthony Casalena, fundador e executivo-chefe da Squarespace, empresa de criação e manutenção de sites com mais de 2,5 milhões de clientes, a maioria dos quais são pequenas empresas, vê uma tendência cada vez maior dessas empresas a experimentar novas estratégias, incluindo promover um relacionamento mais direto com os clientes. "As empresas que criam sites em nossa plataforma, e campanhas de marketing por email, estão em um pico máximo", disse ele. "As vendas de comércio eletrônico em nossa plataforma duplicaram."

Antes da pandemia, o Snapbar, sediado em Seattle, que criava estações de selfie customizadas e cabines de fotos para eventos, era o tipo de empresa que fazia negócios por telefone e em pessoa. Seus funcionários em cinco cidades montavam "cabines de fotos de luxo" em eventos como casamentos e bailes beneficentes. A Snapbar também enviava "estandes de selfie" --cabines fáceis de instalar que usam luzes LED e um iPad-- para uso em eventos esportivos e empresariais. No início de 2020, a companhia de oito anos estava prestes a mais que duplicar sua receita de 2019, que foi de US$ 3,2 milhões.

Mas em meados de março a Snapbar tinha perdido todos os seus negócios, e operar remotamente não era uma opção. Durante uma noite de insônia e pânico, Sam Eitzen, seu cofundador e executivo-chefe, teve 50 ideias para "mudanças, giros, adaptações e reinvenções". Afinal, ele e seu irmão e cofundador, Joe Eitzen, se decidiram pelo Keep Your City Smiling [Mantenha sua cidade sorrindo], um site direto ao consumidor que venderia caixas de presente cheias de artigos de pequenas empresas de cada cidade. "Nós não mudamos de marca ou fechamos a Snapbar, apenas construímos algo novo", disse Sam Eitzen.

Nos primeiros três meses, o produto teve vendas de US$ 500 mil, com 50 a 60% indo para as pequenas empresas cujos produtos recheavam cada caixa. Mas conforme a pandemia se estendeu os pedidos despencaram e Eitzen mudou de foco novamente, desta vez para presentes corporativos. Isso permitiu que a Keep Your City Smiling se mantivesse à tona, mas não gerou receita suficiente para sustentar a Snapbar.

Durante esse período, porém, o diretor de engenharia da Snapbar trabalhou intensamente no desenvolvimento de um produto que ele acreditava que poderia salvar a empresa: uma cabine fotográfica virtual. "A maioria dos eventos virtuais corporativos parecem palestras ou webinars", disse Sam Eitzen.

"Criamos uma cabine de fotos customizada e de marca que fica em um link no site do evento. Assim, o participante continua consumindo informações, mas pode se envolver de outra forma, tirando uma selfie no evento e postando no Instagram."

Esse giro transformou a Snapbar em uma empresa de tecnologia. A cabine fotográfica virtual é agora o produto de crescimento mais rápido que já teve. E a receita --depois que a empresa quase faliu-- está projetada em US$ 2 milhões para este ano.

"Meu irmão e eu realmente lutamos com essa grande questão", disse Sam Eitzen. "Depois de oito anos de trabalho tão duro, é melhor colocarmos todas as nossas economias em risco novamente? Ou cortamos nossas perdas e dispensamos a equipe? Mas realmente amamos as pessoas com quem trabalhamos. E foi por isso que ficamos."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas