EUA e Rússia falam alto sobre Venezuela, mas por ora é retórica
Potências têm interesses divergentes na crise, mas risco de conflito é remoto
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Com a perspectiva de um impasse prolongado na Venezuela, as duas potências mundiais mais interessadas no destino da ditadura de Nicolás Maduro elevaram seu nível de agressividade retórica nesta quarta (1º).
Na prática, contudo, é muito difícil para Estados Unidos ou Rússia irem além disso agora.
O assessor de Segurança Nacional americano, John Bolton, lembrou que Moscou fica em outro hemisfério, enquanto o chanceler russo, Serguei Lavrov, alertou seu colega Mike Pompeo sobre “consequências drásticas” pelas ações de Washington.
Como o termo drástico é aplicável à realidade venezuelana há tempos, resta saber o que mais poderia ocorrer.
No fim de março, Moscou enviou dois aviões com pouco menos de cem militares e equipamentos para Caracas, estimulando teorias conspiratórias. Aparentemente, eles de fato faziam parte dos contratos de cooperação em curso.
Mas o recado de apoio ao aliado Maduro foi claro.
Desde 2005, o Kremlin tornou-se o principal fornecedor de armas para o então regime de Hugo Chávez. Entre US$ 11 bilhões e US$ 20 bilhões em equipamentos foram enviados —notadamente sistemas avançados de defesa aérea, os melhores da América Latina.
A Rússia virou um dos principais parceiros, assim como a China, de projetos energéticos na Venezuela.
A petroleira Rosneft tem participação máxima legal (40%) em cinco campos de petróleo, por exemplo. E Moscou emprestou US$ 17 bilhões para Caracas desde 2016, embora aí os chineses sejam os maiores credores: a ditadura de Maduro deve US$ 23 bilhões a Pequim.
Tudo isso colocado, é bastante improvável que Moscou tenha mais do que declarações fortes e gestos simbólicos a oferecer.
Claro, pode haver mercenários russos protegendo Maduro e os principais interesses do Kremlin no país, mas ninguém deve esperar que a Terceira Guerra Mundial comece no Caribe.
Do lado americano, a situação é bastante diversa.
Washington tem todos os recursos para uma ação unilateral contra Maduro, se assim o desejasse. Só que isso não viria sem custo, humano e financeiro, e poderia ser politicamente desastroso.
Além disso, se Donald Trump adora trombetear as virtudes militares de seu país, o fato é que ele está buscando refluir a presença americana no exterior desde que começou seu mandato, em 2017.
Por isso ocorreu a sugestão do americano para que Colômbia e Brasil, agora liderados por governos pró-EUA, executassem o serviço por Washington. Até aqui, especialmente pela parte militar brasileira, a resposta foi não.
Os EUA têm também interesses além da geopolítica.
Além de considerar a região o seu quintal, há fatores econômicos. Em 2018, a Venezuela foi a quinta maior exportadora de petróleo para o país, e possui as maiores reservas estimadas do produto no mundo —a ineficiência estatal da ditadura em extrair o produto afetou sua competitividade no mercado.
Com o fracasso da oposição de rachar a cúpula militar venezuelana na terça (30), Maduro voltou a ganhar tempo. Sua população não tem conseguido nem enterrar os mortos em caixões de madeira —falta de tudo— e essa pressão interna é a melhor aliada das intenções americanas.
Para a Rússia de Vladimir Putin, a resistência de Maduro é útil pois revalida sua argumentação seletiva pelo direito internacional, além de manter protegidos interesses econômicos e estratégicos.
Não convém, contudo, esperar uma intervenção militar ao estilo da Síria, onde Moscou entrou para salvar o ditador aliado em 2015 aproveitando um vácuo americano.
O mais provável é que Putin se apresente como um dos fiadores de uma transição, na hipótese ainda muito incerta de isso ocorrer.
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