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Sem aura de heroína, Suu Kyi encara o 'velho normal' com golpe em Mianmar

Após encobrir massacre de minoria, a Prêmio Nobel perdeu o apoio que tinha no Ocidente

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São Paulo

Durante os 15 anos em que ficou presa pelos militares de seu país, a mianmarense Aung San Suu Kyi tornou-se um ícone para a "intelligentsia" e para os heróis do politicamente correto no Ocidente.

Ganhou o Prêmio Nobel da Paz, virou até música edulcorada da banda U2. A transição relativamente tranquila para fora de uma ditadura militar dos anos 2010, liderada por ela, parecia provar a emergência de um Nelson Mandela do Sudeste Asiático.

Bloqueio militar em avenida que leva ao Congresso de Mianmar, em Naypyitaw - Reuters

Apenas parecia. Para acomodar os fardados, uma grande tutela foi dada a eles sobre o Estado. Mianmar é um caso único no mundo, onde ministérios e assentos no Parlamento são reservados para militares.

Isso gerou uma tensão disfuncional basal, que torna o país quase automaticamente suscetível a golpes como o que ora se desenrola.

Para piorar, Suu Kyi mostrou um apetite pelo poder bastante peculiar. Está no sangue: ela é filha do general Aung San, o fundador do moderno Estado mianmarense, que arquitetou a independência do país do Reino Unido em 1948 —sendo morto em um golpe interno pouco antes de ver o feito consumado.

Em 2015, driblou a Constituição, que não permitia a ela ser presidente porque seu já falecido marido e dois filhos são cidadãos ingleses, e assumiu o cargo de Conselheira do Estado —exercendo autoridade de fato no país.

As Forças Armadas não gostaram nem um pouco, dando início ao processo de atrito que desembocou no golpe atual.

A heroína dos bem-intencionados do Ocidente mostrou facetas terríveis quando, em 2017, defendeu abertamente seu país da acusação de genocídio e limpeza étnica contra a minoria muçulmana rohingya. Até seu apologista Bono, o líder do U2, pediu a ela que renunciasse.

Além de negar o que era óbvio a observadores internacionais, Suu Kyi manteve as políticas discriminatórias, vetando a participação de pessoas da etnia na vida pública. Jornalistas que investigaram os massacres amargaram cadeia.

Com a nova prisão, Suu Kyi poderá ironicamente ganhar algum apoio externo que perdeu ao longo dos últimos anos. Ela segue sendo a figura política mais popular em seu país, mas a dinâmica do poder segue sendo ditada pelos militares.

É assim há décadas, com a presença militar central até o experimento democrático ora suspenso. O “velho normal” prevalece em Mianmar.

Há pouco que o Ocidente possa fazer. Os EUA já mantêm sanções sobre vários oficiais importantes, e isso não os demoveu de agir. A China, com quem Mianmar tem uma parceria bastante complicada, já indicou que vai deixar o barco correr, fiel à sua política de não intervenção.

Afinal de contas, Pequim já tem de lidar com acusações de genocídio contra outra minoria muçulmana, a dos uigures. Por fim, os vizinhos regionais, que volta e meia têm seus próprios golpes para lidar, por ora se mantiveram silentes.

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