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Eleição antecipada em Madri vira embate nacional entre esquerda e direita

Isabel Ayuso disputará com Pablo Iglesias e diz que povo deve decidir entre 'comunismo e liberdade'

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São Paulo

Na Espanha, uma eleição local fora de época servirá como embate entre direita e esquerda, mas também entre modos opostos de lidar com a pandemia. No começo de março, a governadora de Madri, Isabel Ayuso, renunciou e abriu caminho para uma votação antecipada, que será realizada em 4 de maio.

Em seguida, Pablo Iglesias, vice-premiê da Espanha, também renunciou, para disputar o governo de Madri, dando peso nacional à votação. A entrada de Iglesias na disputa foi bem recebida pela direita espanhola, por facilitar a narrativa de que se trata de um embate de conservadores contra radicais.

"Minha preocupação é impedir o comunismo de entrar em Madri. É comunismo ou liberdade. Madri não pode virar Caracas", afirmou Ayuso.

Isabel Ayuso, que renunciou ao governo de Madri e disputa eleição para retomar o cargo com mais força - Governo de Madri - 11.abr.20/AFP

Iglesias também subiu o tom. "Temos de evitar que estes criminosos, que defendem a ditadura, tenham todo o poder em Madri", disse, referindo-se a casos de corrupção que envolveram o PP e levaram à queda do premiê Mariano Rajoy em 2018, e ao Vox, de ultradireita, que exalta a memória do ditador Francisco Franco (1892-1975).

Ao levar a disputa para o campo ideológico, os dois lados tentam desviar da questão de que tanto Ayuso quanto Iglesias assumiram cargos públicos recentemente e têm poucos resultados a apresentar. Ayuso, 42, é do PP (Partido Popular), de direita. Como governadora desde 2019, ela se destacou na pandemia por confrontar o governo nacional, tocado por PSOE (Partido Socialista) e Podemos, ambos de esquerda.

A Espanha foi um dos países mais atingidos pelo coronavírus no começo da crise, há um ano. Nos primeiros meses, houve acordo, e políticos rivais agiram juntos para responder à emergência, com medidas como lockdown. O discurso inicial foi o de primeiro resolver o problema e depois buscar culpados. A trégua durou pouco. Em setembro de 2020, o governo do premiê Pedro Sánchez (PSOE) determinou novas restrições para conter o avanço da doença. Madri, com Ayuso à frente, disse não.

Pablo Iglesias, então vice-primeiro-ministro, durante sessão do Parlamento espanhol - Andres Ballesteros - 15.abr.20/AFP

O enfrentamento entre os dois níveis ocorreu em público. A governadora se colocou ao lado dos comércios e do setor de lazer, importantes em uma cidade turística como Madri.

Após os embates, chegou-se a um meio-termo: a região da capital adotou fechamentos localizados, por bairros e cidades vizinhas, em vez de um bloqueio completo. Na campanha, Ayuso se coloca como guardiã dos bares e do estilo boêmio de Madri. Em um vídeo promocional, defende que a cidade tem orgulho de ser um lugar para tomar cerveja e se divertir. A oposição considera esse discurso irresponsável, pois ainda há determinações para evitar aglomerações em razão da pandemia.

A Espanha começou março com média de mortes em torno de 350 por dia. A cifra vem caindo e está atualmente na faixa de 100 óbitos diários. Mesmo assim, o governo nacional segue pedindo cautela e ampliou as exigências do uso de máscaras.

O governo espanhol teve também rusgas internas entre seus integrantes, o PSOE, de esquerda tradicional, e o Podemos, que tem posição mais radical. É uma união recente: a coalizão assumiu em janeiro de 2020, pouco antes de estourar a crise sanitária. O Podemos seguirá no governo, mesmo com a saída do vice-premiê. Iglesias foi um dos criadores do partido, em 2014, com o objetivo de combater as políticas de austeridade adotadas pela Espanha após a crise econômica da década passada.

No governo central, o Podemos segue defendendo mais gastos públicos, enquanto o PSOE tem postura mais contida, para cumprir as metas fiscais da União Europeia. O governo regional de Madri, que inclui a capital e algumas cidades vizinhas, é chefiado pelo PP desde 1995, e uma vitória para a esquerda ali teria forte simbolismo. Atualmente, o PP também comanda a prefeitura madrilenha, que até 2019 esteve sob controle do Más Madrid, de esquerda.

As pesquisas indicam favoritismo de Ayuso. Levantamento divulgado no dia 17 pelo instituto GAD3 aponta que o PP deve conseguir entre 60 e 62 cadeiras na Assembleia de Madri, o dobro do que conquistou nas eleições de 2019. Já o Vox levaria entre 10 e 12 assentos. Juntos, os dois partidos superariam o mínimo de 69 eleitos, o que permite a formação de governo.

A mesma pesquisa apontou que o Podemos, de Iglesias, chegaria a 14-15 cadeiras, e o Más Madrid, a 13-14. Assim, mesmo junto ao PSOE, o bloco de esquerda não alcançaria a maioria.

Na Espanha, o parlamentarismo também vale em nível local: é preciso obter maioria entre os legisladores eleitos para formar um governo. Se as coalizões racham, governos caem e eleições são antecipadas.

Assim, a renúncia de Ayuso, que tinha mais dois anos de mandato, foi uma tentativa de seguir no cargo com mais força. Em um cenário ideal, ela conseguiria governar sem depender de outros partidos.

Especialista em comunicação política, Ayuso decidiu renunciar após romper com o Cidadãos, outro partido surgido sob a aura de indignação popular, em 2006, mas que anda em má fase: foi o quinto mais votado nas eleições nacionais de 2019. Com isso, vai perdendo a posição de segundo maior partido de direita para o Vox.

Segundo a pesquisa do GAD3, o Cidadãos pode não conseguir eleger nenhum parlamentar nesta eleição, por não superar uma cláusula de barreira: cada partido precisa ter ao menos 5% dos votos para obter um assento no Parlamento.

Como PP e Cidadãos são parceiros em vários outros governos locais da Espanha, o rompimento na capital pode levar a mais mudanças na política nacional —e ter como consequência um avanço da ultradireita.

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