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Descrição de chapéu Coronavírus

Boris se prepara para reabertura de pubs com testes grátis e previsão de imunidade de rebanho

Inglaterra entra na 2ª fase do desconfinamento no dia 12, quando pode chegar a 73% de pessoas imunes

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Bruxelas

— Eu preciso urgentemente cortar o cabelo… Eu realmente preciso de um corte de cabelo…

— Já agendou para o 12 de abril?

— A ida ao pub? Já!

— Não, o corte de cabelo.

— Ah, esse ainda não.

Nesse diálogo registrado no final de março, quem precisa desesperadamente de um corte de cabelo, mas marcou hora mesmo só para tomar uma caneca de cerveja é o premiê do Reino Unido, Boris Johnson.

Como ele, milhões de britânicos confinados desde 5 de janeiro aguardam ansiosos a segunda-feira, 12 de abril, quando a Inglaterra entra numa nova fase.

Cabeleireiros, massagistas e profissões semelhantes que exigem proximidade voltam a trabalhar, mas, principalmente, restaurantes, bares e cafés poderão servir em áreas externas. Nos 97 dias que separam o fechamento total da reabertura parcial, a situação da pandemia de Covid-19 no país se inverteu.

O primeiro-ministro Boris Johnson em fotos tiradas no dia em que começou o confinamento na Inglaterra (no alto, à esq.), um mês depois (no alto, à dir)., no começo de março (em baixo, à esq.) e no começo de abril, quando afirmou em entrevista que precisa urgentemente de um corte de cabelo - Hannah McKay - 5.jan.2021/AFP; Stefan Rousseau - 3.fev.2021/AFP; Geoff Pugh - 7.mar.2021/AFP; Scott Heppell - 1º.abr.2021/AFP

De 58.474 novos casos por dia em 4 de janeiro, o Reino Unido despencou para 2.762 na última quarta (7). As mortes diárias passaram de 714 para 30 (na média de sete dias, para descontar falhas nos registros).

Enquanto as curvas da pandemia desciam, subia a da vacinação. De 4,3% da população injetada com a primeira dose em 10 de janeiro, chegou a 60,4% dos adultos imunizados na quarta; mais de 11% já estão totalmente protegidos.

A situação é ainda melhor porque já foram vacinados mais de 90% dos idosos acima de 80 anos, faixa etária onde é maior o risco de morrer ou desenvolver complicações graves por Covid-19.

São motivos suficientes para que Boris faça um brinde na visita ao pub na segunda, mas pesquisadores da University College London (UCL) resolveram acrescentar mais um. De acordo com cálculos publicados nesta quinta, no dia 12 o país atingiria também a chamada imunidade de rebanho (quando a porcentagem de pessoas imunes na população é alta o suficiente para barrar a transmissão do coronavírus).

Pelo estudo matemático, a parcela de pessoas vacinadas somada à dos que desenvolveram anticorpos porque se curaram de Covid-19 chegaria a 73,4%. Assim, cairia muito a chance de uma pessoa infectada encontrar uma vulnerável, fazendo o contágio recuar.

Cientistas que avaliaram o estudo da UCL, porém, acham que ele pode estar otimista demais. Para Louise Dyson, professora de epidemiologia da Universidade de Warwick, se o confinamento fosse totalmente encerrado e as taxas de contato entre as pessoas voltassem aos níveis pré-pandemia, dificilmente a taxa de contágio deixaria de acelerar.

Segundo Rowland Kao, que ensina ciência de dados na Universidade de Edimburgo, o raciocínio também precisa levar em conta a variação geográfica dos níveis de imunização.

“Se duas áreas diferentes com a mesma população atingiram 80% de proteção, o efeito é um. Mas o quadro muda de figura se 80% for a média entre uma que chegou aos 100% enquanto outra está nos 60%, principalmente porque pessoas de um lugar circulam no outro”, exemplifica.

Kao observa que as pessoas com mais de 65 anos estão relativamente bem cobertas pela vacinação, o que reduz a pressão sobre hospitais, mas os dados mostram uma cobertura muito irregular entre grupos étnicos e faixas de renda (minorias e mais pobres foram vacinados em taxas menores).

“Esses também são grupos em que os indivíduos têm maior probabilidade de serem seriamente afetados pela Covid-19. Portanto, qualquer avaliação sobre imunidade de rebanho que não considere essa heterogeneidade seria excessivamente otimista”, afirma o professor.

Outro argumento que pode jogar água na cerveja do premiê britânico é o do professor de epidemiologia de doenças infecciosas Adam Kucharski, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

“Ainda há muita incerteza sobre a eficácia da vacina na redução da transmissão, a duração da proteção e as características das variantes”, afirma. E todas essas variáveis dificultam prever o grau de proteção de uma população. Segundo ele, não está claro como os cálculos da UCL incorporam essas incertezas.

Kucharski disse também que as estimativas podem estar otimistas demais sobre como a população —e a pandemia— vai se comportar quando as restrições forem sendo retiradas. Boris talvez não tenha muito como controlar a população, mas anunciou algumas medidas para tentar segurar pelo menos a pandemia.

A partir do dia 12, segundo os planos do governo, todas as pessoas poderão fazer dois testes gratuitos por semana —nos países em que os exames são cobrados, eles podem chegar a custar quase R$ 700.

Mas especialistas avisaram que a medida só funciona se as pessoas se isolarem quando o resultado for positivo —o que exige algum esquema para apoiar quem precise parar de trabalhar. Outra ideia em discussão é um certificado de imunidade (para quem foi vacinado, teve um teste negativo ou se recuperou da doença), que daria acesso a arenas esportivas, casas noturnas e outros locais geralmente muito frequentados. A ideia seria testá-lo em uma final da Copa da Inglaterra no estádio de Wembley.

Pelos planos do governo, lojas, restaurantes ou bares também poderiam pedir um certificado —mas não seriam obrigados a isso— quando puderem receber pessoas no espaço interno, algo que não deve acontecer antes de 17 de maio. A Inglaterra também anunciou um "semáforo" de três níveis para viagens internacionais, proibidas pelo menos até 17 de maio. Haverá níveis diferentes de exigências de quarentena para os países designados como vermelhos, amarelos ou verdes, mas as listas de quem está em cada categoria ainda não foram divulgadas.

A passagem para cada nova fase de abertura do confinamento britânico passa por “quatro testes” anunciados por Boris no final de fevereiro: uma queda significativa no número de casos, capacidade de atendimento no Serviço Nacional de Saúde, progresso contínuo na vacinação e ausência de variantes de Covid-19 que mudem a dinâmica da pandemia.

Para evitar as notas vermelhas que levou no começo da pandemia, Boris parece estar tratando o desconfinamento da mesma forma que sonha com a segunda-feira. “Eu poderei ir até o pub e beber uma "pint" [cerca de meio litro] de cerveja —com cautela, mas de forma irreversível”, disse ele, ao anunciar a nova etapa de reabertura.

Boris Johnson deixa a sede do governo britânico, na rua Downing, 10 - Daniel Leal-Olivas - 10.fev.2021/AFP

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