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Do crack ao álcool

Preocupa a revelação de que o governo bloqueia divulgação de levantamento

Aglomeração de pessoas na região conhecida como cracolândia, no centro paulistano - Eduardo Anizelli - 27.set.18/Folhapress

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Políticas públicas acerca da dependência química constituem um campo minado por convicções arraigadas, muitas ancoradas em concepções ideológicas diametralmente opostas. Por isso mesmo há que fundamentá-las em dados objetivos, como os obtidos em pesquisas sobre padrões de consumo.

Preocupa, assim, a revelação de que o governo bloqueia há mais de um ano a divulgação do 3º Levantamento Nacional Domiciliar sobre o Uso de Drogas, completado em 2016 pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) —uma entidade da estrutura federal.

A Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, encomendou o estudo por R$ 7 milhões, mas depois considerou que não haviam sido cumpridos termos do edital e, por isso, estaria comprometida a comparação com resultados anteriores. O conflito é intermediado pela Advocacia-Geral da União.

Uma equipe de 400 técnicos entrevistou mais de 16 mil pessoas em 351 cidades. A Fiocruz defende que empregou a metodologia recomendada e seguiu os parâmetros da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE. A pendenga passou a ser investigada pelo Ministério Público Federal.

A opacidade despertou inevitáveis desconfianças na comunidade de estudiosos da dependência, em particular entre os que defendem ações de redução de danos e não a abstinência incondicional.

Alimentou-se a suspeita de que os resultados das entrevistas conflitam com a política favorecida por setores conservadores desde o governo Michel Temer (MDB). Entidades ligadas à saúde pública e aos direitos humanos pediram a divulgação integral dos dados.

A polêmica ganhou fôlego com reportagem publicada pelo site The Intercept, segundo a qual os números contradizem a hipótese de que haja no país uma epidemia de consumo de drogas, tendo o crack como seu carro-chefe.

Apenas 0,1% da população brasileira teria fumado a pedra derivada da cocaína nos 30 dias anteriores à entrevista —enquanto 30% haviam consumido álcool no período.

Tais cifras em nada diminuem o drama das cracolândias que brotaram em algumas grandes cidades, a mais famigerada na capital paulista. Em contrapartida, tampouco justificam o alarme que leva a um endurecimento contraproducente da repressão policial.

Políticas malsucedidas devem ser reformuladas ou abandonadas à luz da melhor informação. O governo faria melhor em trazer a pesquisa ao debate público, mesmo sob eventuais ressalvas técnicas.

editoriais@grupofolha.com.br

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