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Alex Canuto

Meritocracia versus velha política

Infelizmente, esta última vem ganhando terreno

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Alex Canuto

As recentes ingerências políticas em órgãos públicos de excelência, com nomeações para cargos de comando ou mordaças, como Policia Federal, Receita Federal, Cade e Coaf; a aprovação da lei de abuso de autoridade; a ampliação do uso do fundo partidário; e a obstrução da CPI da Lava Toga não são fatos isolados. São “fronts” de uma mesma guerra, muito mais ampla, que vem sendo travada dentro do Estado entre a meritocracia pública e a velha política. E, infelizmente, esta última vem ganhando terreno.

A velha política é composta por detentores de mandato eletivo e seus indicados a cargos públicos de comando. Boa parte deles ainda é eleita com base no velho voto de cabresto clientelista (e, portanto, depende de dinheiro para manutenção desses currais eleitorais), pois políticos eleitos pelo “voto de opinião” ainda são minoria.

O presidente da Anesp (Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental), Alex Canuto - Divulgação

Por fim, o instituto do foro privilegiado completa a fórmula que garante à velha política o controle da máquina pública, uma vez que seus apaniguados colocados em cargos-chave no Judiciário e no Executivo tendem a blindar seus padrinhos.

Essas disfunções foram geradas ou ampliadas pela República de 1988, e desde então o único movimento significativo que ameaçou esse status quo partiu justamente de membros de instituições independentes e meritocráticas de Estado (policiais, auditores, gestores públicos, procuradores etc.), investidos em cargos por concurso público, baseado no mérito individual e acessível a qualquer cidadão.

Como chegaram a seus postos sem depender de conchavos políticos, possuem qualificação técnica e, principalmente, independência funcional necessária para gerar iniciativas de sucesso no combate à corrupção, à sonegação, aos cartéis e a ações de desburocratização da máquina pública, que reduzem custos para o cidadão e para o Estado, entre outras.

Charge publicada na página A2 da Folha em 11 de julho de 2019 satiriza a nova e a velha política - Benett/Folhapress

Foram membros da meritocracia pública, concursados e blindados pela estabilidade, que produziram uma fissura no mecanismo de perpetuação da velha política no poder, desmontando seus esquemas de caixa dois nas campanhas.

Por isso o “sistema” está reagindo, seja ampliando o fundo eleitoral para substituir esse velho esquema recém-desmontado, seja obstruindo CPIs contra seus apaniguados, seja ameaçando com punição e mordaça o pessoal concursado de órgãos de controle e de gestão —além de ampliar as indicações políticas para cargos de comando em instituições onde a meritocracia ainda era referência de ascensão profissional.

Se o Judiciário se omitir diante das inconstitucionalidades da lei de abuso de autoridade e se nada for feito contra a captura das ilhas de excelência do Estado pela velha política, teremos inúmeros apagões de gestão pública pelo país. Não custa lembrar que a causa do apagão aéreo de 2007 foi justamente o aparelhamento da Anac, com pessoas alheias à meritocracia pública no comando da agência, ineptas para os cargos, e cujo único atributo era a ligação política com quem os indicou.

Será que agora teremos que conviver também com corruptos sendo soltos, sonegadores impunes, cartéis lesando o consumidor e todos lavando livremente o fruto de seus ilícitos? Quando reclamávamos somente de filas nos aeroportos éramos felizes e não sabíamos?

O país vive um momento de mudança, de esgotamento do modelo envelhecido de política, e o atual governo foi eleito representando esse sentimento, propondo gestão pública com meritocracia e combate ao aparelhamento político.

Até agora, vemos isso acontecendo apenas na gestão das Forças Armadas, enquanto as instituições de excelência do serviço público civil correm o risco de continuidade de tudo aquilo que criticávamos nos governos anteriores. Certamente não era esse o desejo da sociedade que foi às ruas clamar por mudanças.

Alex Canuto

Presidente da Anesp (Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental)

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