Dupla proteção
Relaxamento no uso de máscaras exige definição de critérios sólidos e respeito a governos locais
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O Ministério da Saúde ultima um estudo que estabelecerá parâmetros para que os municípios relaxem a obrigatoriedade do uso de máscaras contra o coronavírus. Se documentos desse tipo em geral adotam critérios técnicos, imunes a interferências políticas, há motivos para preocupação desta vez.
Jair Bolsonaro sempre se opôs às máscaras e tentou sabotar seu uso em diversas ocasiões. Em junho, o mandatário pediu ao ministro Marcelo Queiroga um parecer que desobrigasse vacinados e recuperados de portar o apetrecho. O titular da Saúde não o atendeu na hora, mas encomendou o estudo —que, assim, já surgiu sob suspeitas.
Quando o médico assumiu o cargo, os mais otimistas acreditaram que ele tentaria imprimir o máximo possível de racionalidade às ações da pasta, ainda que contemporizando para não bater de frente com as convicções presidenciais.
Mas o ministro não demorou a trocar o estetoscópio de médico pela ferradura de bolsonarista exaltado. Foi particularmente chocante a cena em que fez um gesto obsceno para pessoas que se manifestavam contra o presidente em Nova York.
Queiroga, que iniciara a gestão falando em "pátria de máscaras", converteu-se rapidamente num paladino das liberdades individuais, opondo-se a todas as obrigatoriedades, defendendo até a morte o direito das gentes de andar nas ruas sem proteção e infectar o próximo.
Não dá, portanto, para confiar que o médico tenha assegurado aos técnicos do ministério a independência necessária para fazer um estudo que respeite evidências e não um que chegue às conclusões pretendidas, ignorando a ciência.
A boa notícia é que, com o avanço da vacinação contra a Covid-19, óbitos, internações e infecções estão diminuindo significativamente. Já é possível planejar a volta à normalidade, o que inclui o relaxamento do uso de máscaras.
É preciso proceder com método e cautela, porém, levando em conta as condições de cada município. Países que se precipitaram, como Estados Unidos e Irael, se viram obrigados a voltar atrás.
O ideal seria que o ministério exercesse seu papel de coordenação e liderança, estabelecendo critérios nacionais como recomendações para os gestores locais.
É possível que a versão final do estudo traga parâmetros sólidos. A tragédia brasileira é que a cada dia fica mais difícil acreditar no que sai do governo com as digitais do presidente e de seus assessores.
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