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Vanderlei França, Ricardo Liguori e Victor Ramos

Garçom, pode emprestar o isqueiro?

Lei Antifumo, 15, deu início à extinção dos cigarros em ambientes fechados

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Vanderlei França, Ricardo Liguori e Victor Ramos ​

Jornalistas, são executivos de comunicação corporativa

A pergunta no título deste artigo, que já foi prévia de baforadas no rosto de trabalhadores e clientes em ambientes fechados, como bares e restaurantes, é hoje tão rara de se ouvir quanto o som de telefones fixos.

É quase impossível aprovar uma lei no Brasil sem que venha a pergunta se ela vai "pegar" ou não.

Com a Lei Antifumo paulista não foi diferente. Passados 15 anos desde que o estado de São Paulo deu um exemplo ao país, a resposta à pergunta é "sim"! A lei pegou! Mais do que isso, salvou e ainda salva a vida de milhares de trabalhadores que eram fumantes passivos crônicos.

Homem fuma do lado de fora de bar na rua Augusta, em São Paulo, no começo da vigência da Lei Antifumo - Danilo Verpa - 28.nov.10/Folhapress - Danilo Verpa/Folhapress

Dados da Vigilância Sanitária apontam que a lei é hoje respeitada em 98% dos estabelecimentos.

Como efeito colateral dessa e de outras restrições, o total de fumantes caiu 35% em nível nacional desde 2010. São milhões de pessoas que se livraram, além do cigarro, de doenças como o câncer, por exemplo.
Para quem não se lembra (e isso é um orgulho para todos nós), um hábito frequente entre parte da população até o final dos anos 2000 era ir a restaurantes e, após uma bela refeição, acender um cigarro à mesa. Muitos desses locais tinham alas para fumantes, a maioria com barreiras "invisíveis" que de nada adiantavam para proteger os não fumantes.

Felizmente, fumar no interior de bares, restaurantes e baladas não encontra mais respaldo no senso comum. Causa até estranheza, indignação e é punido com multa.

Para chegar até aqui, um projeto do governo de São Paulo, que virou lei sancionada em 7 de maio de 2009, proibiu o consumo de cigarros e derivados de tabaco em ambientes fechados de uso coletivo. A Lei Antifumo deu o que falar: causou polêmica e muita discussão.

A proposta, idealizada pelo sanitarista Luiz Roberto Barradas (1953-2010), então secretário da Saúde do estado, foi combater o fumo passivo, considerado à época terceira causa de morte evitável pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Mas no começo quase todo mundo duvidou da efetividade que a aplicação da Lei Antifumo teria. Donos de bares e restaurantes fizeram forte movimento contra a lei, sem sucesso.

Entre a divulgação da nova legislação e sua entrada em vigor se passou um ano. Na condição de comunicadores da saúde estadual, abraçamos o desafio de ajudar a convencer a população de que a lei era para valer.

Vivíamos a "pré-história" das redes sociais, e vencer o ceticismo inicial da imprensa com a lei —afinal, outras tinham dado errado— era imprescindível para garantir a adesão dos paulistas. Também era necessário manter o assunto em evidência nos veículos de comunicação com a finalidade de esclarecer os reais intuitos da lei, prestar serviço e educar os proprietários de estabelecimentos, consumidores e o público geral.

Gerar notícia ajudaria nessa missão. A obrigatoriedade de afixação de placas sobre a lei nos estabelecimentos, as campanhas realizadas pela Vigilância Sanitária e Procon-SP no comércio, a entrega de certificados de treinamento dos agentes fiscalizadores, as blitze de caráter educativo (sem multa). Tudo foi planejado e exaustivamente divulgado.

Estudos também foram usados para esclarecer sobre os malefícios do fumo passivo. Ações com médicos avaliando os índices de monóxido de carbono mostravam que um garçom não fumante, após uma noite de trabalho em um bar, alcançava índices comparáveis a de fumantes pesados, mesmo sem ter posto um cigarro na boca.

Pouco a pouco, criou-se a percepção de que a coisa era séria e de que os benefícios à saúde gerados pela nova legislação compensariam o sacrifício que ela iria gerar, especialmente no que se referia a uma profunda mudança de hábitos.

Quando a fiscalização começou, a Vigilância Sanitária foi às ruas fazer a restrição ser cumprida. Mas São Paulo já havia aderido em peso à legislação.

Com perseverança e comunicação assertiva, a causa contrária ao uso de cigarros em ambientes fechados foi abraçada pela sociedade, e a cultura do tabagismo sofreu baque quase irreversível em sua falsa imagem de luxo, virilidade e estilo.

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