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Mauricio Fiore

Consensos mínimos para avanços factíveis em política de drogas

É preciso abdicar do falso dilema entre abstinência e redução de danos

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Mauricio Fiore

Antropólogo e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

Há muita expectativa no campo da política de drogas com o futuro governo federal. Devemos reconhecer, no entanto, que o quadro legislativo não é favorável para reformas e que não é comum, no Brasil, o primeiro escalão despender capital político com o tema.

Houve evolução recente, mas o debate sobre drogas ainda é desqualificado, e a aversão da maioria da população é manipulada em pelo menos duas frentes: a falsa rotulação dos divergentes como "a favor" e "contra" as drogas e a moralização da política pública, confundindo os papéis do Estado e da sociedade.

Exemplos de distorções: a rejeição pessoal ao uso de drogas implicaria oposição à garantia dos direitos dos usuários. Essa, por sua vez, só seria defendida por quem ignora os danos associados às drogas.

Operação da Polícia Civil na cracolândia da rua Helvétia, esquina com a avenida São João, na região central de São Paulo - Danilo Verpa - 1.set.22/Folhapress

Buscar consensos mínimos é o caminho mais factível para avanço nesse campo. Apresento quatro pontos, entre outros possíveis, propícios a esse processo:

1- Há razoável consenso acadêmico de que nossa política para bebidas alcoólicas é débil. Entre inúmeras omissões, não há controle de pontos e de formatos de venda, de preços e de publicidade. Incluir no debate o álcool e outras substâncias psicoativas lícitas, como a nicotina e as drogas farmacêuticas, propiciaria novos engajamentos —inclusive do campo evangélico— a uma perspectiva abrangente de promoção de saúde pública;

2 - Quanto mais pobre é a pessoa que faz uso problemático de drogas, maior a chance de sofrer com a insuficiência da rede pública. Há uma sensação popular de desamparo. Temos, além de evidente carência orçamentária, ausência de avaliação rigorosa sobre a efetividade dos equipamentos disponíveis. Nesse contexto, ignorar a forte demanda social pelo trabalho das comunidades terapêuticas é tão equivocado como normalizar o investimento público que recebem, sem controle e transparência. Um pressuposto para chegar a consensos sobre a rede de atenção ao usuário de drogas é abdicar do falso dilema entre abstinência e redução de danos;

3 - É imprescindível debater as experiências internacionais de descriminalização e de regulamentação. Entretanto, diante de um Legislativo conservador, Executivo e Judiciário podem alcançar impactos a curto prazo por meio de iniciativas infralegais para redução das prisões de varejistas do tráfico, que respondem a quase um terço do encarceramento —em sua maioria, pessoas pobres e negras. Aos legítimos receios de que isso levaria à facilitação do acesso às drogas pode ser contraposto o manancial de evidências de que oferta e demanda seguem praticamente intocadas, mesmo após décadas de investimentos colossais nessa política;

4 - Os espaços de participação em política de drogas, eliminados pelo atual governo, devem ser reconstruídos. Os conselhos podem ser espaços democráticos, qualificados e efetivos de controle social —desde que tenham condições concretas para atuar.

Não é fácil buscar consensos mínimos, mas o jogo democrático exige pragmatismo. Sem ele, diminuem as chances de avanços concretos em políticas de drogas nos próximos quatro anos.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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