Reino Unido sabia de tortura de suspeitos no Paquistão, diz jornal
O governo britânico e os agentes do serviço de segurança, MI5, sabiam e colaboravam com uma política de interrogatório de suspeitos de terrorismo no Paquistão que levou à tortura de cidadãos e moradores do Reino Unido, informa reportagem publicada pelo jornal britânico "The Guardian".
Segundo o jornal, que cita evidência de um julgamento, diversos britânicos suspeitos de terrorismo que foram presos no Paquistão, sem direito a julgamento, dizem ter sido torturados por agentes paquistaneses antes de serem questionados por agentes do MI5. Em alguns casos, a acusação foi comprovada por evidência médica.
A existência de uma política oficial de colaboração com os interrogatórios no Paquistão surgiu durante o exame dos depoimentos à corte de Londres de um agente de MI5 que interrogou um destes presos --Binyam Mohamed, morador do Reino Unido que está atualmente na prisão militar americana de Guantánamo, em Cuba.
O soldado, identificado apenas como Testemunha B, admitiu saber que Mohamed passou semanas sob custódia do Paquistão, país com registro de violações aos direitos humanos, e mesmo assim não perguntou se ele foi torturado ou mal tratado ou por que ele havia perdido peso.
Mohamed deve voltar ao Reino Unido logo após uma greve de fome desde 5 de janeiro em Guantánamo, onde ele foi alimentado por uma sonda. As autoridades americanas permitiram que diplomatas britânicos visitassem Mohamed, 31.
A decisão segue medida do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, de priorizar uma revisão do caso de Mohamed, e pode preparar o terreno para Mohamed --que disse ser torturado em Guantánamo-- ser levado em breve ao Reino Unido.
Sua advogada afirmou na semana passada que seu cliente está em mau estado de saúde e pode morrer se não for libertado em breve. Mohamed "é pele e osso", já que, desde o último dia 14, é alimentado através de sonda. Os médicos realizaram exames em Mohamed e o liberaram para viajar.
Avaliado em corte no ano passado, a Testemunha B afirmou que Mohamed estava em "uma posição extremamente vulnerável" quando foi questionado por ele em Karachi, em 2002. O oficial admitiu ter dito a ele que "receberia tratamento melhor se cooperasse" e afirmou que ele seria transferido para custódia americana.
Questionado se a transferência de Mohamed o preocupava, o agente disse que agiu neste e em outros casos "sob a forte impressão de que isso era considerado apropriado e dentro da lei". Ele negou ter ameaçado Mohamed e afirmou que ele parecia bem o suficiente para ser questionado.
Mohamed disse aos advogados que, antes de ser interrogado pelo MI5, ele foi pendurado em cordas de couro, batido e ameaçado com uma arma de fogo por agentes paquistaneses.
Depois de se encontrar com oficiais do MI5, ele foi entregue ao Marrocos, onde sofreu 18 meses de tortura, incluindo ter suas genitais cortadas por um bisturi. Segundo o jornal, algumas das questões a que foi submetido no Marrocos foram baseadas em informação passada pelo MI5.
Os advogados de Mohamed foram à corte tentar divulgar estes documentos, mas a corte recusou o processo após alerta do secretário de Relações Exteriores, David Miliband, de que isso poderia prejudicar a segurança nacional e a relação entre os Estados Unidos e Reino Unido.
Jornada
Mohamed, de nacionalidade etíope, foi preso no Paquistão em abril de 2002. Ele disse ter sido levado então ao Marrocos em um avião da CIA onde ficou detido por 18 meses, durante os quais afirma ter sido torturado várias vezes. O Marrocos nega ter mantido Mohamed preso.
Ele foi transferido ao Afeganistão em 2004 e, depois, levado a Guantánamo, segundo autoridades americanas. Washington nega que ele tenha sido torturado.
Seu caso atraiu ampla atenção no Reino Unido pois autoridades legais dos EUA lutaram para evitar a divulgação de evidências que, segundo os advogados do etíope, mostram que ele foi torturado. As evidências estão nos documentos em poder dos advogados britânicos.
A Alta Corte do Reino Unido relutantemente concordou que a evidência não deve ser divulgada pois pode levar a uma menor cooperação de inteligência com os EUA e prejudicar a segurança nacional britânica.
Mohamed chegou ao Reino Unido em 1994 com status de refugiado e trabalhou em Londres até 2001, quando viajou ao Afeganistão e ao Paquistão para, segundo seus advogados, resolver seu vício em drogas.
Com agências internacionais
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