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Café na Prensa - David Lucena
David Lucena

Marca leva carga de café da Colômbia aos EUA em barco a vela para cortar emissões; veja vídeo

Empresa gastou dez vezes mais, mas fará tentativa com carga maior; grupo ainda inaugurou torrador industrial 100% elétrico

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Barco a vela navega no mar azul sob céu ensolarado

Veleiro transporta carga de café da Colômbia até a América do Norte Basalte and Volcano Médias/Divulgação

São Paulo

Com o objetivo de reduzir as emissões de gases estufa decorrentes do frete marítimo, a Café William, torrefação baseada em Sherbrooke, na província de Quebec, no Canadá, transportou uma carga de café da Colômbia até a América do Norte em um barco a vela.

A empreitada foi feita em modo de teste, com o equivalente a apenas cinco contêineres de café. Agora, a empresa se prepara para uma carga de 50 contêineres, em jornada que está planejada para acontecer em outubro deste ano.

A iniciativa se insere em um conjunto de iniciativas que a companhia possui com o fim de usar somente energia de fontes renováveis e zerar as emissões de gases causadores do efeito estufa. A empresa investiu US$ 19 milhões (cerca de R$ 94 milhões) em tecnologias de eficiência energética e inaugurou o que diz ser o primeiro torrador em escala industrial 100% elétrico do mundo.

Veja na galeria de imagens abaixo como será a travessia de barco a vela da Colômbia ao Canadá:

A travessia a vela a ser realizada em outubro será em um barco maior do que o que foi utilizado no primeiro teste. A embarcação está em fase final de construção e é fabricada pela empresa francesa TOWT, especializada em transporte a vela transoceânico.

Ela carregará os cafés no porto de Santa Marta, na Colômbia, e seguirá rumo a Quebec. Na jornada de teste, o barco menor saiu de Santa Marta no dia 18 de dezembro de 2023 e navegou por 20 dias até chegar ao porto de Nova Jersey, nos Estados Unidos –no inverno, o barco não consegue atracar no Canadá devido ao excesso de gelo.

"Eu sei que parece loucura, mas na verdade é mais rápido do que embarcar em um navio de contêineres", diz Serge Picard, sócio da Café William, ao Café na Prensa. Ele explica:

"Depende do vento. Pode até ir mais rápido [do que navio], mas geralmente vai mais devagar. Porém não precisamos esperar uma semana no porto para carregar e outra semana para descarregar, especialmente com os mega navios. Nós apenas chegamos ao porto, descarregamos e no mesmo dia recebemos o café".

Eu sei que parece loucura, mas na verdade é mais rápido do que embarcar em um navio de contêineres

Serge Picard

sobre transportar café da Colômbia à América do Norte em barco a vela

Apesar de a companhia apostar no novo modelo, a viagem inaugural não foi considerada um sucesso, diz Picard. Primeiro porque a empresa precisou aprender a realizar operações que normalmente não fazia.

"Quando compramos café do Brasil ou da Colômbia, lidamos com cooperativas de exportação. E um exportador ou um agente terceirizado vai pegar e entregar na nossa fábrica. Nós, como torrefadores de café, não estamos envolvidos na logística no porto de carregamento ou descarregamento", diz.

Além disso, como a carga era muito pequena, o custo ficou muito alto. O transporte acabou custando dez vezes o valor do frete por navio. Picard diz que, em vez de 7 a 10 centavos de dólar por libra-peso de café, gastou 1 dólar. Agora, com a nova empreitada com 50 contêineres, a expectativa é que esse valor fique entre 20 e 25 centavos. Ou seja, pelo menos o dobro do que custa o transporte comum.

Picard diz crer que, no futuro, o valor pode se tornar mais atrativo. "Acreditamos que esse novo modo de transporte limpo começará a substituir em grande escala –não em todos os produtos, mas em muitos– a forma poluente como está sendo feita atualmente", diz.

A partir da viagem que deve se realizar neste ano, a intenção da empresa, que comercializa 6 mil toneladas de café torrado por ano, é ter uma rota permanente entre a Colômbia –"e possivelmente o Brasil"– e a América do Norte.

"O café é a bebida mais consumida na América do Norte, mas também é a bebida que tem a maior pegada energética e ambiental, mais do que até mesmo bebidas alcoólicas. Um grande contribuinte para isso é que mais de 85% do café cultivado é exportado para ser industrializado e consumido na Europa e América do Norte", diz.

Questionado se consegue se manter competitivo mesmo com custos de transporte mais altos do que os dos concorrentes, Picard diz que sim. Primeiro, afirma, com uma diferença de 10 para 20 ou 25 centavos por libra, há volume para absorver parte disso. Ademais, afirma que os consumidores, sobretudo na América do Norte e na Europa, estão dispostos a pagar por essa sustentabilidade.

Além do transporte a vela, a Café William apostou em um torrador elétrico. Fabricado sob encomenda pela empresa alemã Neuhaus Neotec, o equipamento, diz a Café William, é o primeiro torrador em escala industrial a operar 100% a partir de energia elétrica renovável, sem uso de qualquer combustível fóssil. A aquisição foi parte dos US$ 47 milhões (cerca de R$ 235 milhões) investidos na nova fábrica.

Em geral, o café comercial é torrado usando propano ou gás natural. Ao começar a usar o novo torrador elétrico, a empresa teve dificuldade para reproduzir a "receita" da torra que usava anteriormente, uma vez que os equipamentos têm mecanismos de aquecimento e resfriamento muito diferentes.

"O motivo pelo qual 100% dos torradores de café comerciais usam combustíveis fósseis é que eles são moduláveis. Então, você pode aumentá-los e diminuí-los muito rapidamente", diz. Após muitos testes e adaptações, Picard afirma que, agora, já conseguem replicar o perfil e as curvas de torra.

E, no fim, ainda teve uma surpresa agradável. Eles esperavam gastar o mesmo valor por quilo de café. Em Quebec, Picard explica, o custo com uso de energia elétrica está em paridade com o gás natural. Por isso, esperavam uma despesa igual. Ocorre que, quando usa-se o equipamento a gás, é preciso ventilar o local para evitar o risco de explosão. E o que perceberam foi que essa ventilação gerava uma perda de calor. Agora que não precisam mais ventilar, a torra fica otimizada. Com isso, o processo deve custar cerca de 15% a menos.

Para alcançar seu objetivo de fazer "o café mais sustentável possível", o próximo passo é realizar o transporte terrestre por caminhões elétricos. A empresa diz que os veículos já foram comprados, e a entrega deve ocorrer em breve.

"O plano já está em movimento, mas a Tesla começou a entregar os primeiros no ano passado, aqui na América do Norte, para a Pepsi. Então estamos ansiosos pela nossa entrega, esperançosamente este ano", diz Picard.

CAFÉ WILLIAM - RAIO-X

  • Sede: Sherbrooke, Quebec (Canadá)
  • Capacidade de produção: 7.000 toneladas de café / ano
  • Principais concorrentes: Kicking Horse, Mother Parker, Club Coffe

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