Ciclocosmo

Um blog para quem ama bicicletas

Ciclocosmo - Caio Guatelli
Caio Guatelli
Descrição de chapéu mudança climática

Bicicletários, essenciais ao equilíbrio climático, refletem prioridades na governança

Locais seguros para estacionar bicicletas ainda não são fáceis de encontrar no Brasil

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São Paulo

No trânsito de Paris, a bicicleta tem prioridade. A capital francesa reconheceu que o ciclista é peça chave na emergência climática e criou condições para a bicicleta ser mais usada do que o carro. Atualmente, 11,2% dos parisienses utilizam bicicleta para deslocamentos na cidade, frente a só 4,3% que fazem uso de carro.

Para que isso fosse possível, 61 mil vagas para bicicletas foram construídas entre 2004 e 2021 ao longo dos 1.100 km de malha cicloviária. Combinada à ampliação da frota de ônibus elétricos, a transformação provocou uma queda de 60% na emissões de gases de efeito no transporte urbano de Paris.

O bicicletário da estação Gare du Nord, em Paris, pouco antes de ser inaugurado. O local oferece 1.200 vagas com segurança e estação de carregamento para bicicletas elétricas - Stein van Oosteren/Divulgação

Até o fim de 2026, data que a prefeitura parisiense promete uma cidade 100% ciclável, serão entregues mais 50 mil novas vagas seguras, além de outras 50 mil a serem construídas pelo setor privado com subsídio do Estado. O objetivo é chegar a zero emissões de gases do efeito estufa nos deslocamentos urbanos.

Enquanto isso, no Brasil, o trânsito de automóveis aumenta a cada ano e faz subir junto o nível de emissões de gases do efeito estufa. Segundo o 19° Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Município de São Paulo, o setor de transporte é responsável por cerca de 60% das emissões na capital paulista.

Para os brasileiros, a cultura dos estacionamentos de bicicletas ainda é capenga. Na cidade de São Paulo, não fosse o aumento da violência contra ciclistas e a dificuldade de encontrar bons bicicletários, os 743 km de ciclovias poderiam ser mais aproveitados.

O fotógrafo Emiliano Capozoli Biancarelli, morador do bairro Consolação, conhece bem esse problema. Portador de uma doença cardíaca crônica, Emiliano passou recentemente por uma cirurgia no InCor (Instituto do Coração, ligado ao Hospital das Clínicas da USP). Durante sua recuperação, uma das orientações dadas pelo seu cardiologista foi: "para o bem de seu coração, pedale!".

Empolgado, o paciente decidiu percorrer de bicicleta o trajeto de 2 km entre sua casa e o hospital. O caminho todo é sinalizado com ciclofaixas, mas, para sua surpresa, o mesmo hospital que o aconselhou a pedalar não tem vagas para bicicletas de pacientes.

"No começo eu dava um jeito, e arranjava um espacinho no bicicletário dos funcionários, que tinha só 10 vagas. Mas agora, nem isso tem. Desativaram a estrutura e ninguém mais pode guardar bicicleta no InCor, nem os funcionários", reclama. "Sou obrigado a amarrar a bicicleta no poste da calçada".

O fotógrafo Emiliano Capozoli Biancarelli reclama da falta de bicicletário no hospital InCor - CAIO GUATELLI

Por nota, o InCor diz que o bicicletário está passando por uma reforma e que "avaliará a possibilidade de ampliação das vagas", mas não deu alternativas aos ciclistas enquanto a estrutura não fica pronta. Para quem vai de carro, o InCor oferece serviço de manobristas. "Aproximadamente 145 carros são manobrados diariamente, proporcionando maior agilidade e conveniência", diz a nota.

A cicloentregadora Aline Os, moradora do centro de São Paulo, tem uma lista de experiências ruins tentando estacionar sua bicicleta. Já sofreu para estacionar em shoppings, edifícios empresariais e até no prédio onde mora.

Mas Aline tem também experiências boas, e fala com alegria do dia que ela e outros ciclistas conseguiram convencer o Sesc 24 de Maio, no centro de São Paulo, a montar um bicicletário com 32 vagas.

"Quando [o Sesc 24 de Maio] foi inaugurado, não tinha bicicletário. Haviam apenas alguns paraciclos, sem segurança, e tinha muito roubo. Depois de nosso pedido, eles criaram o bicicletário na parte interna, com cadastro e segurança. Isso incentiva o público a ir de bike."

Aline Os no Bicicletário do Sesc 24 de Maio, em São Paulo, que funciona com segurança presencial - CAIO GUATELLI

Nas estações de trem e metrô, e nos terminais de ônibus da cidade de São Paulo, a situação varia. O Metrô, operado pelo governo paulista, desativou seus bicicletários nas estações Sé, Guilhermina Esperança, Carrão e Itaquera e os transformou em paraciclos (sem vigilância). Nas concessionárias ViaQuatro e ViaMobilidade, são ofertadas 1.100 vagas através do sistema guarda de bicicletas em 13 das 28 estações. Nesse sistema, o usuário precisa realizar um cadastro e usar um aplicativo de celular para abrir uma garagem vigiada por câmeras. Quem não tem celular precisa chamar atendimento através de um interfone.

Paulo Alves, cicloativista e fundador do coletivo Bike Zona Sul, reclama da dificuldade de usar o sistema. "Na Linha 5 Lilás, apenas as estações mais próximas ao centro expandido possuem estrutura de bicicletário, que não funcionam no mesmo horário de operação. Mas a situação mais dramática é pra quem usa as estações Capão Redondo, Campo Limpo, Vila das Belezas e Santo Amaro. Essas não possuem nenhuma estrutura segura para deixar as bicicletas."

Por nota, a Prefeitura de São Paulo informou que os terminais municipais e as estações do Expresso Tiradentes oferecem, juntos, 2.554 vagas de estacionamento para bicicletas, e que a cidade de São Paulo conta com 7.411 vagas em 72 bicicletários e 1.221 vagas de paraciclos em 51 locais.

No Edifício Matarazzo, sede da Prefeitura, há um bicicletário destinado ao uso de servidores. Segundo a nota, "todos os funcionários que manifestam interesse em usá-lo têm vaga garantida. Há um projeto em andamento para a ampliação desse espaço."

Procurado, o Metrô não se manifestou.

Um mapa de vagas com descrição e comentários sobre as vagas para bicicletas na capital paulista pode ser encontrado no blog do coletivo Bike Zona Sul.

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