Cozinha Bruta

Comida de verdade, receitas e papo sobre gastronomia com humor (bom e mau)

Em Londres, o almoço sai andando na rua

Londrinos fazem filas nos mercados para comprar sanduíches que irão comer caminhando, enquanto executam outras tarefas

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Londres

Esta cidade, para surpresa de quem se prende a clichês preguiçosos, é um dos melhores destinos gastronômicos do mundo.

Londres detém um conjunto formidável de restaurantes, tanto na qualidade quanto na diversidade.

Comida inglesa raiz, de peixe frito e torta de rim, você até encontra. Ela está lá, meio acanhada, no meio da babel de sotaques e especiarias que se instalou na sede do antigo império.

Sanduíche, água e chocolate no combo de almoço de 5 libras do Sainsbury's, em Londres
Sanduíche, água e chocolate no combo de almoço de 5 libras do Sainsbury's, em Londres: pegue, pague e coma enquanto faz outras coisas - Marcos Nogueira

Vou usar de exemplo o kebab, especialidade de um território que se estende da Grécia até a China.

Em uma semana de Londres, já comi kebab iraquiano, indiano e turco. Pelas ruas e mercados, vi kebab cipriota, afegão, cingalês, libanês, grego, persa, turco-alemão (o döner kebab de Berlim) e até uigur.

Enfim, você pode comer qualquer coisa em Londres. Desde que tenha tempo e dinheiro, conceitos que muitas vezes se mesclam.

Comer em Londres pode ser barato ou muito caro.

É barato comprar comida no supermercado. Os ótimos ingredientes, não raro, custam menos do que seus similares no Brasil.

Restaurantes, por sua vez, sempre doem no bolso. Até para quem recebe salário em libras esterlinas.

O resultado disso é uma multidão almoçando na rua.

Por volta do meio-dia, os restaurantes ficam relativamente vazios. Nas cafeteiras e mercados, formam-se filas para comprar sanduíches frios, salgadinhos, barras de chocolate e bebidas doces.

Um combo de sanduba, bebida e doce sai por cinco libras (R$ 35) no Sainsbury's, uma das redes britânicas de varejo. Nas lanchonetes familiares, um kebab não custa menos do que sete libras (R$ 49), só ele.

Isso, que fique claro, na modalidade takeaway –para viagem.

Restaurantes e lanchonetes, assim como aviões, trens e sociedade, têm classes distintas no Reino Unido.

O salão oferece serviço de mesa e cobra preços mais altos; o takeaway, geralmente uma portinha adjacente à operação principal, voltada para a rua, tem cardápio reduzido e valores mais em conta.

O "para viagem" deve ser tomado ao pé da letra aqui em Londres.

Deve haver quem leve a comida para fazer a refeição em casa, com louça, talheres e uma pia para escovar os dentes. O que se mostra visível, porém, é a massa almoçando enquanto se desloca (longe dos olhos, também estão os almoços no escritório).

As atividades não são interrompidas. Entre uma mordida e um gole, o londrino caminha, fala ao telefone, checa as redes sociais, participa de reuniões remotas, toma chuva, toma vento, passa frio, pedala sua bicicleta impavidamente.

Claro que o fenômeno não pode ser de todo atribuído ao preço dos restaurantes, sequer é exclusivamente inglês –filmes americanos são cheios de cenas de gente comendo na rua ou no trabalho.

É o velho estranhamento que opõe latinos e germânicos, pessoas que trabalham para viver e pessoas que vivem para trabalhar, a refeição como evento social e necessidade fisiológica.

O almoço que sai andando pela rua estarrece. Mas a gente acaba fazendo igual. É o que dá para fazer.

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