Todos sabem que o investimento em ações deveria ter horizonte de longo prazo. Entretanto, no curto prazo, o cenário de maior volatilidade das ações e a elevação das taxas de juros, têm afastado os investidores de ações negociadas em bolsa. Enquanto isso, outro tipo de investimento acionário tem ganhado interesse de aplicadores.

O investimento em ações privadas, ou seja, aquelas que não são negociadas em bolsa de valores tem ganhado atenção de investidores por não apresentar a volatilidade inerente do investimento em bolsa.

Esse investimento é mais conhecido por seu nome em inglês, Private Equity (PE).

Além da menor volatilidade, o investimento em PE tem outra vantagem que é o maior potencial de retorno que o investimento em ações em bolsa de valores.

Mas todo bônus tem também um ônus, os investimentos em PE possuem mais risco e menor liquidez. Adicionalmente, este tipo de investimento ainda é limitado a investidores qualificados, ou seja, àqueles que possuem mais de R$ 1 milhão de reais em recursos financeiros.

Por ser um investimento novo à maior parte dos investidores pessoas físicas, ainda há algumas definições a serem esclarecidas. Por exemplo, algumas pessoas confundem o investimento em PE com o investimento em empresas menores ou small caps.

Para explicar tudo isso, entrevistei o sócio da XP Inc, Lucas Brandão, responsável pela distribuição de fundos alternativos na XP. Transcrevo abaixo a entrevista.

Fundos de Private Equity podem ser comparados a fundos de ações small caps?

A diferença entre os dois está no estágio de vida da empresa, ou seja, sua maturidade e, portanto, no potencial de ganhos. Fundos de private equity de maneira geral compram empresas pequenas, médias ou grandes que estão em processo muito rápido de crescimento e de consolidação. São empresas de capital fechado, ou seja, não são listadas na bolsa de valores. O gestor atua junto com a companhia injetando capital, criando valor, ajudando na contratação de executivos, networking, definição de planejamento estratégico e processos. O objetivo disso tudo é preparar a empresa para, no futuro, vendê-la para um investidor estratégico, uma empresa local, multinacional maior, ou fazer o IPO, ou seja, lançar as ações na bolsa de valores. Já os fundos de ações Small Caps compram empresas de capital aberto, ou seja, eles potencialmente são compradores das empresas vendidas pelos fundos de PE. Em relação ao porte das empresas negociadas na bolsa de valores, as empresas alvo dos fundos de small caps podem ser consideradas pequenas (baixa liquidez), mas ainda assim, são empresas já maduras. Cada um dos fundos foca em um estágio do ciclo de vida da empresa diferente. Assim, a maneira de gerar valor é fundamentalmente diferente.

Por que ele poderia ser mais vantajoso?

Principalmente no Brasil, a grande vantagem de se investir em fundo de PE é que o universo de investimento é muito maior e cheio de oportunidades que a bolsa de valores. A figura abaixo, retirada do material publicitário de um fundo de PE retrata isto. Enquanto existem menos de 400 empresas negociadas na B3, existem milhares de empresas no país que podem ser alvo de investimentos. Adicionalmente, existem muito mais gestoras de fundos de ações do que gestoras de fundos de PE. Portanto, além de haver um "aquário" para pescar maior em empresas de PE, há menos gente pescando, o que permite elevar o potencial de retorno. Adicionalmente, você não está tão sujeito a volatilidade do mercado acionário, ao dia a dia da bolsa. Sabemos o quanto a volatilidade diária causa ansiedade aos investidores que acabam por vender suas participações nos piores momentos. O controle sobre a criação de valor está muito mais na mão do gestor do que em um fundo de ações, e aqui estamos falando de investir em empresas médias para fazê-las crescer, os grandes cases de sucesso estão nesse nicho.

Quais os riscos envolvidos no investimento de PE? É mais arriscado que um fundo de ações?

Podemos enumerar três principais riscos de se investir em PE. O principal risco é o de não achar a tese de investimento certa, de comprar empresas por preços elevados, não conseguir gerar valor e não conseguir fazer o desinvestimento e venda num prazo e preço atrativos. O segundo risco seria o fato de se estar lidando com empresas ainda não maduras. Estas, naturalmente têm mais desafios do que empresas maduras que estão em bolsa de valores. Logo, são mais arriscadas do que investir, por exemplo, em uma ação de uma empresa de capital aberto em bolsa. Finalmente, um risco relevante que tem que ser considerado é o risco de liquidez. Investindo em ações, você tem a opção de apertar um botão e vender toda sua posição, e em dois dias úteis o dinheiro está na sua conta. Investir em empresas de capital fechado, sem dúvida nenhuma, não funciona assim. Você não consegue um comprador da noite para o dia. Os processos de negociação de compra e vendas são mais longos. Ao investir em fundos de PE, você deve entender que está num investimento de longo prazo e com baixa liquidez. No caso do horizonte de investimento, qualquer investimento em ação, seja em bolsa ou privado, deveria ter horizonte de longo prazo.

Como se dá a rentabilidade?

O retorno ocorre com eficiência do gestor em fazer três atividades: comprar bem, ou seja, com um valuation atrativo, gerar valor ao ativo, seja pelo crescimento orgânico dessa companhia, seja pelo crescimento inorgânico (aquisições) e, por fim, vender bem.

Poderia se dizer que não difere muito de qualquer investimento em ações. A diferença é que no caso do investimento de PE, o gestor colabora no crescimento da empresa e geração de valor, de forma a fazer a empresa alcançar um melhor preço para as ações.

O investidor vai obtendo seu capital de volta à medida que as empresas vão sendo vendidas. Então esse processo de comprar, gerar valor e vender é o que traz o retorno para o investidor.

É esperado que um fundo de PE renda mais que um fundo de ações? Por quê? Quais exemplos?

Historicamente a indústria de fundos de PE, especialmente a americana, onde se tem maior histórico para avaliação, tem apresentado um desempenho de 5% a 10% ao ano superior ao mercado acionário. No Brasil, temos menos dados disponíveis, mas os estudos das principais entidades do segmento mostram que aqui também a indústria foi mais rentável do que a bolsa e do que a renda fixa brasileira. A empresa XP é um exemplo brasileiro de sucesso de investimento de PE. O primeiro fundo de PE injetou R$100 milhões na empresa em 2010, comprando uma participação importante, nove anos depois a empresa fez IPO nos EUA com uma avaliação de US$ 15,9 bilhões. Portanto, uma multiplicação de capital que não se vê em investimentos tradicionais.

Tenho liquidez para sair a qualquer momento?

Investir em fundos alternativos é por natureza investimento de longo prazo. Quando você coloca o seu capital nesse tipo de produto você tem que ter horizonte de investimento de até 10 anos, pois este é o prazo da maioria dos fundos. Muitas vezes o fundo começa a devolver o capital muito antes disso, à medida que vai vendendo as companhias do portfólio, mas ainda assim, você tem que investir pensando em 10 anos. A única maneira de sair antes do prazo de desinvestimento do fundo é por meio do processo de cessão de cotas no mercado secundário que ainda é muito embrionário no Brasil. Algumas instituições, como a XP, estão trabalhando em equacionar de uma melhor maneira a questão da iliquidez, mas ainda são cenas para os próximos capítulos. Portanto, em fundos alternativos você abre mão de liquidez em busca de objetivos de retornos superiores.

Todos podem investir? Para que tipo de investidor essa classe de investimento seria adequada?

Infelizmente, o investimento em fundos de PE ainda não está disponível para o investidor geral. Mas, já existem alternativas para atender parte dos investidores. Até não muito tempo atrás esse era investimento destinado somente aos multimilionários e investidores institucionais. Em 2020, a XP iniciou o processo de democratização desta classe, trazendo o primeiro fundo destinado a investidores qualificados do mercado (investidores com pelo menos R$ 1 milhão em recursos financeiros). Hoje já temos uma base bastante ampla e vários produtos cujo tíquete de entrada começa na faixa de R$ 25.000, o que permite que mais brasileiros possam acessar essa opção de investimento. Contudo, a legislação ainda não permite oferecer para o público em geral, mas ao longo do tempo, não temos dúvida que a legislação vai evoluir. Importante lembrar que como qualquer investimento de risco, não deveria ser objetivo para aqueles investidores mais conservadores.

Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor

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