--Sistema fascista, nossa hora tá chegando!
Na tela do cinema, grita um homem. A edição é intencional, sempre é. Gritante como o berro do homem em praça pública, rodeado de rostos multitudinários.
De sua camiseta negra, aflora a estampa de punho em riste, necessária, referência ao dia da luta da população em situação de rua.
Ele, como os circunstantes, é morador de rua. Nesse filme, são todos protagonistas.
O documentário/vídeo instalação "Olho da Rua", do artista plástico alagoano Jonathas de Andrade, com trilha sonora de Homero Basílio, aterrissa em Madri depois de passar pela Bienal de Veneza em um momento lunaticamente necessário. É preciso falar do Brazel neste véio continente europeu-mundano, é preciso ampliar o Brazel.
O filme de 25 minutos é parte ilustre do Festival Internacional de Artes Cênicas (ÍDEM, da sigla em castelhano). Estará em cartaz na Casa Encendida, centro cultural nos mesmos arredores chiquês dos Museus Reina Sofia e Prado, até 30 de outubro.
Vejam, vejam. Augusto Boal e seu Teatro do Oprimido respiram fundo na obra, que derruba muros entre encenação e vida.
Neste caso, a vida nas ruas de Recife, meu amado y combalido Recife, onde nasci e pouco cresci.
Filmado em dois dias na Praça do Hipódromo, o elenco é formado por uma centena de pessoas em situação de rua reunidas a partir de contato de Andrade com albergues públicos e ONGs de apoio à população em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
Socioeconômico: eufemismo pra pobreza, exclusão, fudido, no-olho-da-rua. E não, nada disso.
Andrade é representante do Brasil na Bienal de Veneza deste ano e homenageado da Pinacoteca em São Paulo com uma retrospectiva de sua obra (em cartaz até 28/02/2023).
Em entrevista, declarou ao jornal espanhol El Confidencial:
"O governo Bolsonaro é inimigo dos direitos humanos, e suas políticas se traduzem em um grande número de pessoas em situação de rua, sem acesso à saúde, pessoas que não foram amparadas durante a pandemia porque o governo não trabalhou para lhes trazer vacinas ou lhes dar apoio".
"Queria fazer um filme com eles, com essas pessoas que vivem numa situação de invisibilidade gigante na lógica da cidade, pensada para quem tem casa, trabalho, acesso à educação ou saúde", disse.
"E a ideia do filme era pensar em uma câmera que estivesse bem próxima deles e fazer com que a invisibilidade se transmutasse em brilho e possibilidade".
"Olho da Rua" está dividido em oito atos. Em cada um, exercícios do olhar, de interpretação e liberação: encarar diretamente a câmera, admirar-se no espelho, falar o que tem que falar, o que quer, o que sai. A rua como palco, a rua como casa, individual e coletiva.
"Pensei que a fome seria o fio condutor de tudo, mas quando comecei a conversar com eles e abordei os assistentes sociais, percebi que a fome não era o eixo, e sim a ruptura de um pacto social que é relacionado a um Brasil colonial, um país que não conseguiu criar políticas de reparação e integração dentro da dinâmica capitalista e que permite ao Estado proteger apenas as elites dominantes", completa.
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Se o Neymar pode pedir a seus seguidores que votem no Bolsillonaro, eu, que não sou ninguém mas eu sou eu merrma, posso dizer: não. Não pode mais meu coração / Viver assim, dilacerado --
Este domingo, aqui em Barcelona, vou votar. Votem, não deixem. No que seja. Vamo botar pra dançar o compasso dessa modinha demodê horrorizê desigualitê. Tiau, adeu siau.
"Olho da Rua", de Jonathas de Andrade
Exibição diária
La Casa Encendida - Torreón 2
10h - 21h30
Grátis
Até 30 de outubro de 2022
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