Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
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Alexandre Teixeira Jorge, Carolina Jezler Müller e Giuseppe Pecorari Melotti

Reforma Tributária e seus impactos na importação de bens

Texto traz pontos positivos, mas demanda aprimoramento em relação ao fato gerador de IBS e CBS nas importações

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Alexandre Teixeira Jorge

Sócio do escritório Bichara Advogados, especialista em Direito Tributário, Aduaneiro e Comércio Internacional

Carolina Jezler Müller

Sócia do escritório Bichara Advogados, especialista em Direito Tributário, Aduaneiro e Comércio Internacional

Giuseppe Pecorari Melotti

Sócio do escritório Bichara Advogados, especialista em Direito Tributário, Aduaneiro e Comércio Internacional

A PEC nº 45/2019 pretende inaugurar um novo paradigma na tributação sobre o consumo, através da outorga de uma competência aberta para tributar todo tipo de operações com bens, serviços e direitos, compartilhada entre União, Estados e Municípios. Para a União, caberá instituir a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), em substituição ao IPI, ao PIS e à COFINS; ao passo que para os Estados e os Municípios caberá instituir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em substituição ao ICMS e ao ISS, sendo que essa estrutura dual terá disciplina legal comum, a ser estabelecida em lei complementar.

O papel da lei complementar será extenso e envolve, dentre outros aspectos, a definição do fato gerador e da base de cálculo desses tributos, sempre buscando a simplificação, a transparência, a uniformização da tributação e a redução substancial de incentivos. Não obstante, para as importações de bens, essa uniformização pode ser ainda mais ampla, considerando também a legislação do imposto de importação (II), que, apesar de não estar abrangido pela reforma, também incidirá nas operações – de importação – sujeitas à CBS e ao IBS.

De início, vale destacar que a unificação do tratamento legal do IBS e da CBS, por si só, trará simplificações relevantes para o comércio exterior, se comparado ao cenário atual.

Guindastes de carga no cais do porto de Santos (SP), onde o movimento de cargas é o maior do país - Moacyr Lopes Junior-25.ago.2014/Folhapress

De fato, hoje, os tributos incidentes na importação de bens possuem diferentes fatos geradores: (i) para o PIS/Cofins-Importação, o fato gerador é a entrada de bem estrangeiro em território nacional; (ii) para o IPI, considera-se o desembaraço aduaneiro; e (iii), para o ICMS, o fato gerador é a entrada no território nacional de um bem proveniente do exterior, com a mudança de titularidade (Tema nº 297), mas independentemente se estrangeiro ou nacional.

As bases de cálculo também variam: enquanto o PIS/Cofins-Importação considera apenas o valor aduaneiro (Tema nº 01), a base de cálculo do IPI inclui o imposto de importação, e a do ICMS inclui todos os tributos incidentes na operação (II, IPI, PIS/Cofins-Importação, AFRMM, IOF-câmbio, bem como o próprio ICMS), além de taxas, outras contribuições e despesas aduaneiras.

Há ainda outras pequenas divergências na legislação de cada um desses tributos, como, por exemplo, no tratamento tributário a ser dado em caso de diferenças entre os volumes declarados e verificados na importação de mercadoria a granel.

Conforme a redação proposta do art. 149-B da PEC, haverá a uniformização desses fatos geradores e bases de cálculo, facilitando a identificação da carga tributária de cada operação.

Outra vantagem decorrente da disciplina legal comum entre IBS e CBS é que os regimes aduaneiros especiais – acaso mantida a ressalva em relação às hipóteses de tributação diferenciada e de benefício fiscal neles previstas – produzirão efeitos no âmbito dos Estados, algo que hoje nem sempre acontece. Em alguns casos, os entes estaduais seguem efetuando a cobrança, total ou parcial, do ICMS (exemplos disso são o regime de Drawback, em que a isenção no âmbito estadual se restringe à modalidade "suspensão", e o regime Admissão Temporária para Utilização Econômica, que continua sendo alvo de cobrança de ICMS por alguns entes), gerando complexidade.

Ainda, espera-se uma atenuação nas discussões de classificação fiscal, sobretudo em torno do IPI, ante a redução drástica no número de alíquotas dos novos tributos.

Entretanto, tais medidas não garantem a uniformização com a legislação do imposto de importação (II).

O art. 156-A, §1º, inciso II, combinado ao art. 195, V, §15, conforme redação aprovada pela Câmara dos Deputados, dispõem que o IBS e a CBS incidirão sobre a "importação de bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou de serviços realizada por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade".

A redação difere daquela aplicável ao II, cujo fato gerador é a entrada de mercadoria estrangeira no território nacional, se mostrando mais genérica e sinalizando que a mera introdução do bem material em território nacional – independentemente de sua origem – desencadearia a obrigação tributária com relação à IBS e CBS. A questão é relevante, pois o atual sistema permite que se tenha uma importação, para fins de incidência do ICMS, por exemplo, cujas partes da operação sejam pessoas domiciliadas no Brasil, já que basta que o bem tenha procedência estrangeira, e não que a sua origem seja estrangeira.

Vale destacar que, apesar de o Decreto-Lei nº 37/1966 prever que o imposto de importação também incide sobre as mercadorias nacionais ou nacionalizadas que retornem ao país após sua exportação, o STF entendeu que tal dispositivo não foi recepcionado pela Constituição Federal, já que o art. 153, inciso I delimita a instituição de imposto sobre a "importação de produto estrangeiro".

Quando da edição da Lei Complementar, também será importante esclarecer se a "importação" fato gerador do IBS e da CBS será considerada como a data de entrada do bem em território nacional – em linha com o imposto de importação, o que nos parece mais recomendável – ou como a data do desembaraço aduaneiro, que é hoje o fato gerador do IPI.

O Decreto Lei nº 37/1966 traz ainda uma série de hipóteses de não incidência, tais como mercadorias devolvidas ao exterior antes do registro da DI ou após o registro, se comprovado erro de expedição; mercadorias para reposição, mercadorias objeto de perdimento; e mercadorias destruídas sob controle aduaneiro. É fundamental que a Lei Complementar replique tais hipóteses para a CBS e o IBS, no que tange às operações de importações de bens.

Na mesma linha, outro ponto de atenção será a base de cálculo dos novos tributos. Apesar de ser matéria para uma futura lei complementar, seria importante uma unificação da base de cálculo dos tributos incidentes na importação de bens em torno do valor aduaneiro, a ser apurado de acordo com os métodos previstos nos arts. 1 a 7 do Acordo de Valoração Aduaneira (AVA) e os ajustes previstos no seu art. 8.

Por fim, a legislação do imposto de importação também traz algumas hipóteses de isenção, dentre as quais as amostras sem valor comercial; a bagagem de viajantes procedentes do exterior; partes e peças destinados ao reparo, revisão e manutenção de aeronaves e embarcações; dentre outros. Tais isenções são relevantes também para o IBS e a CBS no que tange às importações, porque o fato gerador dessas operações será diferente daquele estabelecido para as operações no mercado interno. Assim, enquanto a incidência nas operações no mercado interno poderá trazer um critério de onerosidade da operação, em regra, as importações serão tributadas independentemente da existência de uma transferência de propriedade ou algum outro encargo, sendo necessário excluir expressamente sua tributação em algumas hipóteses.

Não está claro, no entanto, se tais isenções do II poderão ser estendidas à CBS e ao IBS por meio da exceção concedida aos regimes aduaneiros especiais, conforme redação proposta do § 5º, inciso IX do Art. 156-A, ou se essas seriam julgadas como sendo benefícios fiscais, vedados pela atual proposta do §1º, inciso X do Art. 156-A. Tal discussão emerge, sobretudo, em razão da falta de definição da expressão regimes aduaneiros especiais no texto constitucional.

A PEC nº 45/19 propõe mudanças relevantes na tributação sobre o consumo, com impactos para as operações de importação de bens. O texto atual traz pontos positivos, mas demanda um aprimoramento em relação ao fato gerador do IBS e da CBS na importação de bens, sugerindo-se, nesta oportunidade, uma maior convergência com o fato gerador do Imposto de Importação e a disciplina dos regimes aduaneiros especiais. Seguindo essa lógica de uniformização e consequente simplificação, é recomendável que essa convergência também se estenda em relação à base de cálculo do IBS e da CBS, com a explicitação de que os tributos terão por base o valor aduaneiro. Do contrário, frustra-se a expectativa de simplificação do sistema.

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