Já dizia aquele ditado antigo "casa de ferreiro, espeto de pau". É disso que me lembrei quando lendo uma página desta mesma Folha me deparei com a publicação de um edital da prefeitura de São Paulo (veja abaixo) convocando interessados para uma de licitação que, entre outras coisas, visa obter o auto de vistoria do corpo de bombeiros (AVCB) para o Edifício Sampaio Moreira, patrimônio histórico paulistano.
Incrédulo reli o edital pois achei que fosse engano meu, mas não era. Afinal o prédio foi reinaugurado em meados de 2018 após oito anos fechado e com obras de restauro que custaram aos cofres da prefeitura R$28,9 milhões, de um orçamento inicialmente previsto em cerca de R$15 milhões.
Como se não bastasse ultrapassar em quase 100% a estimativa de custos, o serviço foi incompleto o que gerou até uma movimentação no Ministério Público que passou a investigar a segurança do edifício para seus ocupantes e visitantes, uma vez que o prédio foi reinaugurado sem plena adaptação para os portadores de deficiência e também sem o auto de vistoria.
Passados cinco anos da reinauguração o Edifício Sampaio Moreira segue na mesma situação, ou seja, sem o AVCB. Isso significa na prática que os funcionários da prefeitura que lá trabalham diariamente, bem como os munícipes que frequentam o prédio não estão livres de sofrerem algum tipo de sinistro, uma vez que sem o auto o prédio não está 100% seguro e devidamente vistoriado pelo corpo de bombeiros.
A situação é risível e trágica ao mesmo tempo, uma vez que a mesma prefeitura paulistana que tem o poder de interditar e multar edifícios privados que eventualmente estejam na mesma situação de ausência de ACVB, faz cinco anos de vistas grossas para algo dentro de suas próprias dependências. Quem fiscaliza o fiscalizador? E vou além: Quantos outros prédios ou dependências públicas pertencentes à Prefeitura de São Paulo encontram-se na mesma situação?
Consultada a Secretaria Municipal de Cultura a respeito da ausência do AVCB, me enviou a seguinte resposta:
"A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, informa que o restauro e adequação do edifício Sampaio Moreira aconteceu em diversas etapas, sendo uma segunda etapa realizada no período da pandemia. Os valores e os descritivos estão explicitados abaixo. O prédio atende a muitos requisitos de segurança, entretanto, alguns imprevistos, como a queima da central de alarme, atrasaram a obtenção do AVCB e a finalização das adequações necessárias, que estão sendo providenciadas por SMC. Todos os serviços necessários à adequação às normas e ao protocolo de AVCB foram agora condensados na atual contratação em andamento, com a licitação no Valor Referencial de R$ 747.395,33, de modo que em breve os itens ainda não atendidos serão plenamente resolvidos. Todo o processo passou por aprovação e acompanhamento do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), observando com todo o cuidado necessário o restauro do prédio."
Apesar da explicação, considero que foi gasto muito tempo para resolver um problema tão pequeno como este, um prazo que fosse em um prédio particular seria punido com multas e até eventualmente a interdição do imóvel.
PRÉDIO FOI CONSTRUÍDO EM 1924
Conhecido como "protótipo dos arranha-céus" de São Paulo o Edifício Sampaio Moreira foi projetado pela dupla de arquitetos Samuel das Neves e Cristiano Stockler das Neves, sendo que sua construção se deu entre 1920 e 1924.
Na época de sua inauguração o Sampaio Moreira fez história com seus 12 pavimentos e 50 metros de altura e transformou-se no primeiro arranha-céu da capital paulista, ultrapassando o Edifício Guinle localizado na rua direita e considerado o primeiro prédio vertical de São Paulo e umas das primeiras construções de concreto armado no Brasil.
Com estilo arquitetônico eclético, dispõe de uma decoração típica do estilo Luís XVI, que mescla o rococó com o neoclassicismo. Sua estrutura é rica em detalhes e a fachada vai se modificando nos diferentes andares. Passou por uma grande reforma estrutural em 1990, mas teve diversas características preservadas, como as escadarias de mármore de carrara e as esquadrias das janelas de pinho de riga, além do pergolado de colunas gregas na cobertura.
Seu reinado como prédio mais alto de São Paulo foi muito curto, sendo ultrapassado em 1929 pelo Edifício Martinelli localizado na mesma rua Líbero Badaró, porém com entradas também na avenida São João e rua São Bento.
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